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Mara Gama

REPORTAGEM

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Tratado do plástico é promessa da reunião da ONU Meio Ambiente

Getty Images
Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

23/02/2022 13h21

A criação de um tratado internacional para conter a poluição dos plásticos e reduzir o uso do material é a principal promessa da Unea 5.2, a segunda parte da 5ª edição da Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente. A reunião começa na segunda, 28, e vai até dia 2 de março em Nairobi, Quênia.

Os dados da poluição pelos plásticos são alarmantes e a necessidade de um documento internacional para frear esse importante fator do aquecimento global e da perda de biodiversidade é consenso já há alguns anos.

Atualmente, são despejados no mar 11 milhões de toneladas de plástico por ano e o volume deve dobrar até 2030 e quase triplicar até 2040. Somente em 2018, os impactos no turismo, na pesca e na aquicultura foram estimados em aproximadamente US$ 6 a 19 bilhões em todo o mundo, segundo dados da ONU.

Existem esforços importantes para monitorar e rastrear a poluição plástica e o lixo marinho — iniciativas de cidades, empresas e organizações —, mas o movimento não tem sido suficiente para conter a avalanche, e os números da produção mundial de plásticos avançam.

A urgência de diretrizes e padronização vem sendo discutida por empresas, representantes da sociedade civil e governos. Mais de 2 milhões de pessoas assinaram uma petição da WWF e mais de 75% dos Estados membros da ONU também apoiaram os pedidos por um tratado internacional. A expectativa é que na reunião da Unea na próxima semana seja formado um comitê internacional para colocar no papel um tratado que seja:

1) legalmente vinculante, isto é, não seja voluntário como vêm sendo os acordos entre empresas e algumas associações;
2) que não tenha como objeto apenas o descarte e o gerenciamento de resíduos plásticos, que são a parte mais visível do problema, e sim analise e regule todo o ciclo de vida dos produtos, desde a extração de matérias-primas, produção, transporte e uso até descarte, reúso, reciclagem e disposição final.

Organizações como Gaia (Aliança Global contra a incineração), Break Free From Plastic (BFFP ) e Aliança Resíduo Zero Brasil, entre outras, estão com campanha online desde o dia 18 no Brasil para obter mais assinaturas de apoio ao tratado.

"O Brasil é um dos maiores produtores de plástico no mundo, com uma das menores taxas de reciclagem. Por isso, exigimos que o Brasil apoie o Tratado proposto pelos governos de Ruanda e Peru, devido à clareza, força e inclusão do elemento saúde humana e ambiental, bem como a sua abordagem do ciclo de vida do plástico", diz o texto do abaixo-assinado.

A proposta Ruanda-Peru, citada na moção, é apoiada por cerca de 50 países, incluindo Noruega, Chile, Costa Rica, Equador, Colômbia e União Europeia e propõe abordar da produção à gestão de resíduos e tratar da poluição de plástico em todos os ambientes e não apenas no oceano.

Rafael Eudes, estudante de engenharia química na UFRJ e embaixador jovem da BFFP, diz que o objetivo da campanha é pressionar o Ministério do Meio Ambiente a se alinhar ao movimento. Eudes participa da Rede de Universidades Sem Descartáveis (reUNI), e está fazendo a divulgação das petições.

A mobilização a favor do tratado internacional é transversal. Em janeiro, mais de 70 empresas e instituições financeiras de atuação internacional lançaram um manifesto pedindo que o tratado "estabeleça uma direção clara para alinhar governos, empresas e sociedade civil" em um entendimento comum das causas da poluição plástica e uma forma compartilhada para abordá-las. Entre os signatários estão Coca-Cola, Nestlé, BNP Paribás e L'Oréal.

O documento pede também que sejam incluídas políticas para manter os plásticos na economia, reduzir a produção e o uso de plástico virgem e dissociar a produção de plástico do consumo de recursos fósseis. O tratado deveria fornecer uma estrutura de governança para "facilitar investimentos em inovações e infraestruturas nos países e indústrias que mais precisam de apoio internacional".

Em artigo publicado em 9 de fevereiro no "The Times", a diretora executiva do Pnuma (Programa para o Meio Ambiente da ONU), Inger Andersen, afirma que é vital reduzir o uso de plástico, e que é preciso "eliminar produtos desnecessários, evitáveis ou problemáticos", projetando produtos para reutilização e reciclagem, e removendo aditivos perigosos.

"Ao fazer isso, poderíamos reduzir o volume de plásticos que entram em nossos oceanos em mais de 80% até 2040 e reduzir a produção de plástico virgem em 55%. Poderíamos reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 25% e criar 700.000 empregos adicionais, principalmente no sul global", escreve.

Para Thais Vojvodic, da Fundação Ellen MacArthur, o ideal é que o tratado avance para o design e a produção: "hoje existem regulações focadas apenas no gerenciamento de resíduos e voltadas à logística reversa, ao plástico que já é um lixo, que já saiu da economia. Como o tratado vai direcionar regulações mundo afora, ele deve ir à raiz do problema, orientando regulações da produção, do desenho dos plásticos, reutilização e toda a economia circular", diz.

Ela cita normas nacionais que podem servir de exemplo para metas mundiais, como a obrigação de uso de no mínimo 30% de embalagem reciclada na composição de plásticos na Inglaterra, com previsão de multa.

"É um momento crucial para avançar. Existe apoio de todos os lados. Nos últimos anos, novos estudos têm mostrado que, apesar de iniciativas voluntárias e algumas regulações importantes, isso não é suficiente. As empresas multinacionais que apoiam o tratado consideram muito importante uma regulação global para poder acelerar na direção de uma economia circular", diz.