Xô santinho: Alimenta SP testa campanha lixo zero nas eleições

A distribuição de propaganda eleitoral impressa é permitida a partir da próxima terça-feira, 16 de agosto, até 1° de outubro de 2022, em todo o país. Apesar do avanço da propaganda virtual, vêm aí os santinhos de candidatos em papel, plástico e adesivos que valem por pouquíssimo tempo e emporcalham as ruas, deixando um rastro de poluição, com entupimento de bueiros e contaminação dos rios.

"No dia 3 de outubro, teremos produzido uma montanha de material feito para virar lixo. É chocante a realidade do resíduo político", diz a ambientalista e permacultora Claudia Visoni, codeputada estadual de São Paulo. "Se um candidato quer imprimir 200 milhões de santinhos e acarpetar o mundo com seus santinhos, o Tribunal Superior Eleitoral não vai falar nada, porque não há restrição quanto a isso", afirma.

De fato, a Resolução 23.610, de 2019, que regula a propaganda eleitoral, não menciona limites desse tipo, segundo informa o TSE. Em março de 2022, foi somada a ela a Resolução 23.688, que diz que "as corregedorias regionais, sob a supervisão da Corregedoria-Geral Eleitoral, deverão desenvolver ações e programas direcionados a mitigar os efeitos da poluição ambiental, sob todas as suas formas, decorrentes do exercício da propaganda eleitoral".

"Para os candidatos, funciona a lógica da competição. Se um candidato vai imprimir um milhão, eu quero imprimir 2 milhões", comenta Claudia, que é pré-candidata a deputada estadual pelo coletivo Alimenta SP, pelo Partido Verde.

Para ser parte da mudança que espera ver no mundo, o coletivo testa um novo formato para divulgar seu nome e número, seus slogans e endereços dos perfis virtuais que detalham sua plataforma política.

Em vez de mandar fazer em gráficas os tradicionais e coloridos santinhos, santões, cartazes, praguinhas, pragões - esses dois últimos são os apelidos dos adesivos em forma de círculo -, o material de campanha do Alimenta SP será confeccionado usando carimbos, papel compostável, tinta guache solúvel em água, sem metais pesados e sem fixador. A tiragem será de acordo com cada evento público, pois o processo é manual.

"Já ouvi no meio político que para receber 50 mil votos para deputado estadual os candidatos imprimem 5 milhões de santinhos. É um exagero. Queremos ganhar a eleição, mas queremos também baixar essa bola de neve de resíduo", diz. "O detalhe é que grande parte desse dinheiro é público. Então, num país onde há gente passando fome, bilhões de reais de impostos serão usados para imprimir uma coisa cujo destino é ser lixo".

O preço dos tais 5 milhões de santinhos variou de R$ 199 mil até R$ 712 mil numa pesquisa on-line. Tomando como exemplo a eleição de 2018, quando houve mais de 2 mil candidatos registrados para deputado estadual em São Paulo, e usando o menor valor encontrado, de R$ 199 mil, o gasto com santinhos para todos os candidatos chegaria a R$ 398 milhões no Estado. Praguinhas e pragões são muito mais caros. A impressão de 100 mil unidades de adesivo de 8cm x 8cm pode custar R$ 14 mil, segundo anúncio pesquisado nesta terça (9).

Mas a relação direta entre quantidade de material de propaganda e eficácia da campanha está furada, na opinião do especialista em marketing político Marcelo Vitorino. "Imprimir material não é garantia de voto. É como fazer uma relação entre número de likes e voto. Não é assim". Vitorino considera que existem três tipos de campanhas: temáticas, regionais e ideológicas. E que, nas ideológicas, o gasto com propaganda tende a ser menor.

Neste ano, o especialista aponta para a possibilidade de diminuição de santinhos impressos, por causa da mudança das regras de coligações. Agora, um partido não pode pagar pelo material de campanha do outro partido, mesmo que estejam coligados.

Nos próximos anos, a poluição pode diminuir. Está em tramitação no Senado o projeto de lei 2.276 (de 2019), que determina que os santinhos e demais impressos de campanha sejam feitos em material biodegradável.

Combate à fome

"Somos lixo zero na campanha porque somos lixo zero por convicção. O coletivo é realmente comprometido com os objetivos da permacultura. A gente vem do ativismo mão na massa: comida no prato e floresta em pé ", diz a pré-candidata Claudia Visoni. "Nossa campanha será também praticamente dinheiro zero. Estamos com uma vaquinha que tem pouco mais de R$ 10 mil", brinca.

Além de Claudia, fazem parte do coletivo Alimenta SP Marina Pascon, Leila D´Barsoles, Raquel Almeida, Alê Monteiro, Lucas Ciola e Caio Rennó. Entre as propostas que serão defendidas na campanha estão o incentivo à criação de hortas e agricultura urbana, restaurantes populares, cozinhas comunitárias e mercados de alimentos saudáveis, melhorar a alimentação escolar da rede estadual priorizando os orgânicos, trabalhar para que o Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica (Pleapo) e a Política Estadual de Redução de Agrotóxicos (Pera) sejam aprovados e implementados.

"A prioridade máxima é o combate à fome por meio da agroecologia", afirma. "Temos uma atitude propositiva e não seremos inimigos de outras candidaturas que atuem nessa área, como os representantes do agronegócio. A gente sonha com um futuro sem veneno, mas sabemos que é necessária uma transição", observa Claudia.

"O buraco no Brasil nesse momento é a gente precisa ampliar a área de plantio de comida. Mesmo se for da forma convencional. A área de plantio de feijão, arroz, mandioca tem encolhido muito e a área de plantio de commodities tem aumentado. Mas o produtor rural não acordou de manhã e se apaixonou pela soja. Existe toda uma estrutura de políticas públicas voltadas à produção para a exportação de commodities e aí é que a gente precisa entrar, para rever essas políticas", finaliza.