Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Desmatamento na Mata Atlântica cresce e alerta para escassez hídrica
Segura que essa coluna vai esbanjar números. E preocupações com a Mata Atlântica.
Nascer na Mata Atlântica me fez perceber algo muito importante desde a infância, como se viver sem isso tudo aqui, dá para respirar? E a água. Sim, eram essas as perguntas que eu fazia quando era criança em casa. Passar os finais de semana nas cachoeiras, que eram meu quintal de casa, na APA Capivari Monos, extremo sul da cidade de São Paulo.
Hoje a Mata Atlântica, onde vivem 70% dos brasileiros, está cada vez mais distante de sua configuração original. Segundo os novos dados do MapBiomas, a área definida na lei de 2006, que estende os limites desse bioma para 17 estados, apenas 24,3% desse território ainda resiste como formação florestal. Esse tipo de cobertura, que ocupava 27,1% em 1985, já havia baixado para 25,8% em 2020 e caiu para 24,3% em 2021.
A gente acompanha o desmatamento da Mata Atlântica como se olhasse algo se acabando e não pudesse fazer absolutamente nada.
Os estados com menor cobertura nativa em 2021 são Alagoas (17,7%), Goiás (19,5%), Pernambuco (23,4%), Sergipe (25,5%), São Paulo (28,4%) e Espírito Santo (29,3%). Mais da metade (57%) dos municípios possuem menos de 30% da vegetação nativa. Já os estados com maior cobertura nativa de Mata Atlântica no ano passado são Piauí (89,9%), Ceará (76,9%), Bahia (49,7%) e Santa Catarina (48,1%).
Além da redução em área, existe um processo de redução da qualidade dessa cobertura vegetal: entre 1985 e 2021 houve uma perda de 23% de floresta madura, com alta biodiversidade e grandes árvores. Em 37 anos, 9,8 milhões de hectares de vegetação primária foram suprimidos, enquanto 8,8 milhões de hectares regeneraram-se em vegetação secundária. Elas respondem por 26% de toda a cobertura florestal da Mata Atlântica e já são prevalentes em determinadas regiões do bioma.
Enquanto a cobertura florestal recua, cresce a área destinada à agricultura: esse foi o tipo de uso do solo que mais cresceu na Mata Atlântica nos últimos 37 anos. Essa atividade avançou 10,9 milhões de hectares. Se em 1985 ela ocupava 9,2% do bioma, em 2021 esse percentual alcançou 17,6%. Nesse período, a silvicultura ganhou 3,7 milhões de hectares, passando de 0,7% (1985) para 3,5% do bioma. Juntos, agricultura e silvicultura já ocupam um quinto da Mata Atlântica.
O bioma também passou por um forte processo de urbanização nos últimos 37 anos. As áreas urbanizadas passaram de 674 mil hectares em 1985 para 2,03 milhões de hectares em 2021 - um aumento de 1,4 milhão de hectares. Embora 87,5% da expansão tenha se dado sobre áreas já alteradas, em 1985, 12,7% cresceu sobre ainda eram áreas que eram naturais.
Os efeitos da degradação da Mata Atlântica já podem ser percebidos. Um dos serviços ambientais prestados pelas florestas é a produção e proteção do fornecimento de água potável.
"Depois de sucessivas crises hídricas afetando dezenas de cidades ao longo da Mata Atlântica, é preocupante ver a capacidade de fornecimento de serviços ambientais deste bioma ser continuamente fragilizada", adverte Luís Fernando Guedes Pinto, Diretor Executivo da SOS Mata Atlântica. "A preservação do que restou de Mata Atlântica e a restauração em grande escala são é essenciais para preservarmos alguma resiliência dessa região à dupla ameaça da crise climática e da crescente irregularidade do regime de chuvas, decorrente do desmatamento da Amazônia", ressalta, recordando que estamos da Década da Restauração de Ecossistemas da ONU.
O levantamento do MapBiomas a partir do mapeamento de imagens respeitou os contornos definidas pela lei, também conhecida como Lei da Mata Atlântica. Com isso, foram analisados todos os remanescentes florestais do bioma, incluindo Piauí, Ceará e interior da Bahia. Os 465.711 km² remanescentes da Mata Atlântica são encontrados em 17 estados (a área contínua estende-se por apenas 15 estados).
A Mata Atlântica corre o risco de perder algumas de suas camadas de proteção legal com o avanço de projetos de lei no Congresso Nacional que flexibilizam as restrições para exploração da floresta. E um deles está na pauta da Comissão do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados em Brasília. O texto propõe a flexibilização da exploração de áreas estratégicas para a sobrevivência do bioma, além anistiar mais de uma década de desmate ilegal.
Frear a degradação das áreas da Mata Atlântica é fundamental e urgente para novas situações graves de crise hídrica nas cidades. A falta de água nas regiões urbanas foi sentida nos últimos anos, e é a população pobre das áreas periféricas das cidades que são diretamente afetadas pela falta de água. Todas as situações graves da falta de água não mobilizaram a importância para a conservação ambiental, que protege a Mata Atlântica e as pessoas. Afinal, falar sobre conservação é falar sobre direitos humanos também.
Estar atentos aos dados e as causas dessa degradação é fundamental também para observarmos o avanço da desigualdade social nas cidades. Existe um modelo de desenvolvimento que prioriza a concentração de poder, em especial de terras. É preciso entender a conservação e preservação com a relação floresta e as comunidades locais, essa conexão é importante e nos provoca a pensar os biomas com mais qualidade.
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