Mariana Sgarioni

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Malwee aposta em fios de PET e de roupas que iriam parar no lixo

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Tecnologia, inovação e um toque de criatividade formam um combo difícil de dar errado quando o assunto é investimento em sustentabilidade. Depois de lançar uma premiada coleção de jeans usando apenas um copo de água, o Grupo Malwee decidiu apostar mais alto: uma coleção de moletom inteira produzida a partir de uma mistura de fios feitos de garrafas PET e da reciclagem de roupas que iriam parar no lixo.

O movimento DES.A.FIO, lançado em 2022, acaba de ser ampliado com quase o dobro de malha produzida com o fio reciclado, que leva 85% de fibras de roupas usadas, e 15% de poliéster de PET. Para esta recém-lançada coleção foram utilizadas cerca de 4,5 toneladas de peças pós consumo, sem condições de uso, arrecadadas com a Cruz Vermelha, que se transformaram em 2,6 toneladas de malha.

O laboratório da empresa que permite produzir peças jeans com apenas um copo de água teve o investimento de R$6 milhões e conta com tecnologia de laser para aplicações de efeitos de tingimento, além de uma máquina de ozônio para clarear e tirar a goma do tecido. Nos modelos tradicionais, cada peça usaria mais de 100 litros de água para ser desenvolvida.

"O impacto ambiental da indústria da moda é grave, nós sabemos disso, e investimos pesado em sustentabilidade. Mas existe também um viés social importante, como o trabalho muitas vezes não digno, e o excesso de consumo, incentivado pelo fast fashion. Temos diversas frentes para olhar", diz Gabriela Rizzo, CEO do Grupo Malwee. Gabriela assumiu há menos de um ano e é a primeira mulher no cargo desde o início da empresa, em 1968, assim como a primeira CEO que não faz parte da família Weege, a fundadora.

Na entrevista a seguir, a executiva fala sobre os desafios de assumir a gestão de uma indústria que conta com uma agenda ESG tão avançada, a potência de uma liderança feminina e o que significa a construção de uma jornada sustentável dentro de um dos setores mais poluentes do planeta: a moda.

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Ecoa: A indústria da moda é a segunda mais poluidora do mundo. A decomposição de roupas pode levar até centenas de anos e os componentes químicos da sua produção podem contaminar o solo e a água. Como o Grupo Malwee vem trabalhando nestas frentes?
Gabriela Rizzo:
A moda tem várias questões e eu venho me dedicando a estes estudos há alguns anos. Além de vender roupas, o Grupo Malwee é também uma indústria, que produz suas peças desde sua fundação. Portanto, a preocupação ambiental já existe na essência. Acredito que seja a única empresa da América Latina que produza com o mínimo de água e energia, por exemplo. O tingimento é natural, com corantes orgânicos, e sem o uso de químicos nocivos. Em todo o processo industrial, houve a substituição da energia convencional pela renovável, a estamparia foi digitalizada, a destinação dos resíduos têxteis foi remodelada. Um fio deve entrar na nossa malharia de um jeito e sair dali mais sustentável.

Ecoa: Como é o "fio do futuro"?
Gabriela Rizzo:
É um fio que foi fabricado com 85% de roupas usadas e 15% de fibra de garrafas PET. Ele é todo desfibrado e forma a base para roupas de moletom. A coleção traz ainda o que chamamos de "cápsula fio do futuro", que são peças com processo de tingimento que usa 68% de água de reuso. Esta malha contou também com um amaciante de silicone feito com capinhas de celulares descartadas.

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Ecoa: Estima-se que os consumidores usem uma mesma peça de roupa no máximo 7 vezes por ano. O que significa que o descarte é alto, assim como o incentivo ao excesso de consumo.
Gabriela Rizzo
: Sem dúvida. Isso é a base do fast fashion, que só gera mais consumo e mais resíduo. Desde o início, o projeto do "fio do futuro" já arrecadou 7,4 toneladas de roupas usadas, sem condições de uso, e que iriam parar no lixo. O projeto também conta com parcerias para incentivo de venda de peças de segunda mão, aluguel de roupas e iniciativas que incentivam uma nova forma de vestir e consumir moda.

Ecoa: Você é a primeira mulher a assumir o cargo de CEO em uma empresa familiar. Como tem sido esta experiência?
Gabriela Rizzo:
Eu já fazia parte do conselho da empresa e tinha responsabilidade pelo comitê de marca e produto. Então, já temos um relacionamento construído. De toda forma, entregar a gestão para alguém fora da família foi não apenas um ato de coragem, mas também de consolidação de um plano consistente de sucessão. Existe ainda uma política de estruturação de lideranças femininas na companhia: hoje 56% de mulheres ocupam algum cargo de liderança no Grupo Malwee e vejo cada vez mais a importância desta representatividade.

Ecoa: Como é o olhar de uma mulher na gestão de uma empresa de moda?
Gabriela Rizzo:
Não sei dizer quais foram os critérios de escolha do meu nome para o cargo e se pesou o fato de ser mulher. Mas posso dizer que sou uma líder humanizada, dou muita importância ao mercado e ao cliente. E que vou muito além do hard skill. Minha liderança feminina tem tempero: conta com dedicação, relacionamentos, construção, olhar. Estas são características que vão além da capacidade técnica. Sou muito mais do que uma executiva: sou também mãe, mulher e cuidadora.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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