Mariana Sgarioni

Mariana Sgarioni

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Reportagem

Estudo inédito aponta desafios do afroempreendedorismo na América Latina

O CAF (Banco de Desenvolvimento da América Latina e do Caribe), o Instituto Feira Preta e o Plano CDE uniram forças e lançaram, na semana passada, durante o G20, um estudo inédito: pela primeira vez na história foi mapeado o perfil detalhado e os desafios de três mil afroempreendedores na Argentina, Brasil, Colômbia, Peru e Panamá.

As mulheres seguem liderando os negócios: elas representam 80% dos entrevistados, sendo que 48% delas têm renda de até um salário mínimo. Muitos desses negócios desempenham um papel crucial no sustento econômico das famílias: 59% dos empreendimentos geram a única ou principal fonte de renda do lar. Segundo análise de Adriana Barbosa, diretora executiva do Instituto Feira Preta, apesar da dificuldade de renda, as mulheres apresentam uma boa escolaridade e são mais bem preparadas. Portanto, as propostas que forem pensadas a partir desses dados devem ter um forte enfoque ou intencionalidade de gênero.

"A pesquisa aponta três perfis de afroempreendedores na América Latina: o primeiro, dominado pelas mulheres, que empreende por necessidade, ou seja, vende algo hoje para comer amanhã. O segundo é o empreendimento por vocação: jovens criativos que não se enquadram em empregos tradicionais e escolhem abrir seu próprio negócio. E o terceiro
vem por engajamento racial: pessoas que enxergam o potencial da cultura negra no mercado e pensam em negócios para atender a esta demanda. Este modelo é o que mais gera recursos e pode escalar", diz Adriana.

No entanto, as barreiras seguem sendo financeiras. Segundo o estudo, 44% dos afroempreendedores no Brasil tiveram seus pedidos de crédito negados. A maioria acaba recorrendo a fontes informais de crédito, como amigos, familiares ou microcréditos produtivos. Porém, estes recursos são limitados.

"O grande desafio no Brasil é olhar o desenvolvimento destes negócios a longo prazo. Os recursos precisam ser em escala e não apenas micro e nano créditos. O empreendedorismo negro quer subir. Ele não está só no campo da necessidade. Está também associado ao consumo, que demanda investimentos mais altos", observa Adriana.

Vilma Queiroz, idealizadora do Pretinhas na Moda, evento cultural na zona norte paulistana que traz oficinas para incentivar e orientar mulheres negras no mundo da moda, concorda com a dificuldade de acesso a recursos mais robustos. Segundo ela, para bancar a produção cultural dos eventos de grande porte, é preciso entrar com pedidos em editais, que demoram meses para serem liberados. "O empreendedorismo negro é forte e tem mercado".

Vilma começou a trabalhar aos 14 anos, em uma creche, e graças aos seus estudos, tornou-se professora. Depois de se aposentar, decidiu dedicar-se aos eventos voltados ao empoderamento de mulheres negras sensibilizada por uma visita a um quilombo em Alagoas.

"Fizemos um desfile de modas no quilombo e muitas mulheres, que antes nem levantavam o rosto para conversar, passaram a sorrir. Assim nasceu o Pretinhas na Moda, que tornou-se muito mais do que uma grande feira que abre portas para empreendedoras negras que atuam no mercado de moda. Aqui todas também podem - e devem - subir na passarela".

[Esta reportagem faz parte da newsletter "Negócios Sustentáveis". Inscreva-se para receber gratuitamente no seu email toda segunda-feira]

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.