Felipe Neto investe em saúde mental e educação midiática em escolas
Criador de um dos maiores canais do YouTube brasileiro, o empresário e influenciador Felipe Neto é a prova viva do poder das telas. Com cerca de 80 milhões de seguidores entre Instagram, YouTube e TikTok, Felipe já chegou a ser uma das pessoas mais assistidas no mundo. Ele sabe muito bem que a internet é capaz de construir - ou destruir - impérios como o seu em questão de minutos. "É a maior arma da humanidade. O problema é que ela não veio com manual de instrução e as pessoas não sabem o básico".
Felipe entende que a educação é o único jeito de mudar este cenário para as próximas gerações. Assim, decidiu expandir seus negócios: fundou no mês passado o Instituto Felipe Neto, que pretende promover uma educação midiática crítica e consciente nas escolas, além de oferecer suporte para estudantes que apresentam questões de saúde mental.
Com educadores, psicólogos e um time de especialistas, o instituto por enquanto atua em uma escola da rede pública na zona sul do Rio de Janeiro, mas pretende expandir em breve. Felipe se inspirou em sua própria experiência escolar - ele teve um diagnóstico tardio de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade) - além de ter se sensibilizado pelas inúmeras mensagens que vem recebendo de jovens seguidores nos últimos anos pedindo ajuda por ansiedade, depressão e ideação suicida.
Na escola carioca, que hoje atende cerca de 700 alunos, o instituto oferece um ambiente multidisciplinar de acolhimento chamado Espaço Vida, e um aplicativo batizado de HUG, em que os estudantes podem acessar e contar o que estão sentindo ou sofrendo. No pilar educacional, a equipe vai ensinar o beabá para o combate à desinformação, aos crimes cibernéticos e ao discurso de ódio.
"O aluno vai aprender, desde muito cedo, a diferenciar a desinformação da informação, o que significa opinião, o que é anúncio, o que ele deve separar dentro da chuva de informações que recebe. Não é partidário, não tem viés ideológico, nada disso. O objetivo é ter uma internet em que as pessoas sejam menos desinformadas e convivam de maneira mais harmônica", diz Felipe.
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Ecoa: Boa parte do seu público é formada por jovens estudantes. Você acha que eles estão precisando de ajuda?
Felipe Neto: Sim. A saúde mental nesta idade é algo muito sério. Eu tive um diagnóstico de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade) tardio e tive que conviver com isso durante todo meu período escolar. Foi um verdadeiro martírio para mim. Eu tinha muita dificuldade de aprendizado e isso era atribuído à vagabundagem, preguiça. Ninguém via essas questões de saúde mental naquela época. Fui descobrir meu quadro mais tarde quando soube que eu também convivia com a depressão. Assim como eu, milhões de jovens pelo mundo inteiro sofrem do mesmo problema, muitas vezes sem diagnóstico e sem serem amparados. Passei a pensar de que forma poderia usar minha influência para evitar que estes jovens não tenham que passar pelo que eu passei. E aí veio a ideia do instituto voltado a amparar crianças e adolescentes que sofrem de transtornos mentais de qualquer ordem, principalmente depressão e TDAH.
Ecoa: A educação midiática também faz parte do escopo do instituto?
Felipe Neto: Sim, incorporamos ao Instituto Felipe Neto um outro trabalho que já fazíamos sobre educação midiática de jovens e combate à desinformação. A nossa ideia é fazer com que dentro do ambiente escolar o assunto internet seja tratado de forma atual, que seja viva e interessante para os alunos. Ensinar desde muito cedo a diferenciar a desinformação da informação, opiniões, como trafegar na internet, anúncios e como separar as informações. Não tem viés ideológico. Vamos levar para as aulas a questão do ódio digital e por que tanta gente tem vontade de xingar na internet e acaba cometendo crimes.
Ecoa: No mundo dos negócios, a forma como as empresas lidam com a sociedade, em geral, é tratado pelo S do ESG. Dentro da sua área de atuação, como é o impacto social gerado pela internet e como ele deve ser cuidado?
Felipe Neto: A gente está vendo uma epidemia de crimes digitais sendo cometidos por pessoas que não sabem que estão cometendo crimes. Ameaças, injúrias, difamações, calúnias. Então educar os jovens a como agir em relação a isso é fundamental. Eles precisam saber como lidar com a internet. Porque a internet é a maior arma da humanidade. Ninguém recebeu um manual de instruções. Nossa ideia é tentar, de alguma forma, começar a criar este manual para as pessoas saberem como não cair nas armadilhas digitais.
Ecoa: Essa geração que já nasceu com a internet, inclusive assistindo aos seus vídeos, não tem mais conhecimento dessas armadilhas?
Felipe Neto: Isso é uma ilusão. A gente tende a olhar para as novas gerações e pensar que elas sabem tudo porque já nascem com o celular na mão. Isso não significa nada. O fato deles conhecerem a fundo a tecnologia só os torna ainda mais influenciáveis. A gente precisa prepará-los melhor para isso. Se a gente não levar o básico do básico para a escola, vamos continuar formando pessoas sem discernimento. Então é falar: "Olha, o que você recebe no WhatsApp não é oficial. Como saber diferenciar? Como saber pesquisar uma notícia, uma informação que você acabou de receber? Você viu uma imagem no Facebook, como checar se essa imagem é verdadeira? Você utilizou o chatGPT para fazer uma pergunta, será que deve confiar nisso? Como saber se a resposta está certa? Essa educação básica é o que estamos construindo. Queremos que as crianças entrem no ensino médio com esta formação.
Ecoa: Esta geração terá que lidar com diversas questões que devem alterar o rumo do planeta, como as mudanças climáticas. E isso passa pela comunicação na internet.
Felipe Neto: Como eu disse, acho que a comunicação é a maior arma da história da humanidade. Ela pode ser utilizada de maneira destrutiva, como foi nos anos 20, 30, 40, ou de maneira muito construtiva. De que forma a gente pode direcionar essas pautas ambientais, por exemplo? É um desafio. A internet é extremamente pulverizada: começa em nichos e, dentro deles, você se torna cada vez mais dependente dos micro e médio influenciadores. Por isso, o trabalho que deve ser feito não é só de macro comunicação. Não é só ficar repetindo o tempo inteiro sobre aquecimento global na televisão e nos grandes portais de notícia. É preciso se infiltrar dentro dessas camadas mais distantes e que causam mais influência nas pessoas. O debate deve ser levado para dentro dos fóruns online, do WhatsApp, para dentro das comunicações mais rápidas. Só assim a pauta entrará no dia a dia das pessoas e também das gerações mais jovens, nas escolas.
Ecoa: Esta comunicação utiliza telas dentro do ambiente escolar. O que você acha da proibição dos celulares dentro dos colégios?
Felipe Neto: Eu acredito que foi uma medida drástica para tentar estancar um sangramento. A gente está falando de uma altíssima evasão escolar, de uma dificuldade de concentração cada vez maior, a vida do professor se tornando insuportável. Então eu sou a favor, acho que a experiência é válida. Só acho que não é suficiente. Isso é tratar o sintoma, não a doença. Duvido que o vício em telas seja resolvido com a proibição do celular nas escolas. Mas vamos esperar para ver os resultados. Eu espero que sejam positivos.
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