Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
A grande tecnologia do século XXI é o Amor
Eu sei que você clicou nesse texto para ler sobre o amor, mas antes de falar sobre ele, eu preciso falar sobre bananas.
Sim, pode parecer que uma coisa não conecta com a outra, mas as bananas como as conhecemos estão à beira da extinção. Não sei se você sabe, mas praticamente todas as bananas que são comercializadas no mundo são de uma única espécie chamada Cavendish. Ela não apenas é de uma única espécie, mas como a Cavendish é um tipo de banana que não produz sementes, todas as bananas são na verdade clones umas das outras.
Mas assim como nós humanos, as bananas Cavendish estão enfrentando uma pandemia. Ao invés do covid-19, elas estão lutando contra o Mal-do-Panamá — ou Tropical Race 4 (TR4), como também é conhecida — uma doença causada por um fungo que anda destruindo fazendas inteiras há mais de 30 anos.
Mas o que isso tem a ver com o amor, você deve estar se perguntando.
O problema da TR4 é que ela praticamente só afeta as bananas Cavendish, as mais vendidas, bonitas e docinhas bananas que gostamos de comer. Como no mundo existe mais de mil tipos de banana, o Mal-do-Panamá é um problema que poderia até ser fácil de resolver caso a gente começasse a consumir as lindinhas bananas rosas e azuis que existem por aí e não só as amarelinhas que estamos acostumados.
Ao transformar um único tipo de banana, entre milhares que existem, no único tipo que consumimos a gente acabou criando um grande problema para nós mesmos e agora temos de resolvê-lo talvez através de uma palavra que está na moda ultimamente: diversidade.
Tudo isso que acontece com a banana, eu sinto que também acontece com o Amor.
Não o amor com a minúsculo que faz a gente se declarar para parceiros românticos, mas o Amor com a bem maiúsculo. Aquele sentimento que talvez seja a cola de todo o universo.
A ideia de amor nos últimos séculos foi sendo diluída e desgastada que hoje ao falarmos de amor, só imaginamos um tipo, o amor romântico.
Alguns milhares de anos atrás, os gregos nomeavam pelo menos sete diferentes tipos de amor:
Eros - o amor romântico, quase como a gente define amor hoje;
Philia - o amor da amizade autêntica que nada tem a ver com uma atração carnal;
Ludus - o amor "divertido", ou o do flerte;
Storge - o amor com membros da sua família, principalmente entre pais e filhos;
Philautia - a compaixão do amor próprio (e ouso dizer talvez o mais difícil de todos dessa lista);
Pragma - o amor pragmático, não necessariamente carnal, mas com um objetivo em comum;
Ágape - o amor universal e incondicional para todos os seres da criação, ou o como alguns falam, o amor Divino, ou o Amor.
Então assim como a gente focou em só um tipo de banana e transformou-a no perfeito ideal do que é uma banana. Eu sinto que fizemos a mesma coisa com o amor, pois hoje quando falamos de amor, parece que falamos apenas de um tipo, o amor romântico.
Mas com tanto amor para escolher, por que a gente faz isso?
Eu não coloquei a palavra tecnologia no começo desse texto atoa. Pois o amor, assim como o equipamento eletrônico que você está lendo esse texto, é uma tecnologia humana.
Nós esquecemos que antes de computadores, celulares e foguetes que vão para Marte, as grandes tecnologias que nós criamos foram a linguagem, a ideia de sociedade e agricultura.
Quando a gente deu nome para coisas, a gente conseguiu sonhar os mesmos sonhos e contar as mesmas histórias e ao sonharmos os mesmos sonhos e contarmos as mesmas histórias começamos a nos identificar com o outro em lugares que a maioria dos outros animais não conseguem e assim conseguimos "controlá-los" ao nosso bel prazer. Como por exemplo, clonar uma banana trilhões de vezes por ano.
Então assim como um processador é uma tecnologia que faz nossos computadores e celulares funcionarem, a ideia do amor é o processador que nos faz irmos para frente e acreditar no que acreditamos. Seja o amor à pátria, o amor a alguma ideia de deus, o amor ao dinheiro e até às vezes o amor ao outro. Sem o amor, ou a ideia dele, eu ouso dizer que não existe sociedade.
E é por isso que temos de tomar essa tecnologia de volta para nós.
Assim como a comida processada, os filmes de super herói, o day trade, a meritocracia ou qualquer outra ideia recente de facilidades que na verdade estão nos destruindo, pensar que o amor é só romântico é igual viver comendo fast food. Tu mata a fome, mas morre obeso e desnutrido.
Hoje muita gente acha que amar é se matar de trabalhar para dar posse para sua família ou alimentar seu ego de chegar no topo de uma estrutura capitalista, outras acham que amar é matar em nome da pátria ou do capital. Muitos outros acham que amar é dar flores e postar foto fofa nas redes sociais. Muita gente fica esperando receber o amor de deus quando não dá um tiquinho de amor para quem tá do seu lado.
O simples ato de pronunciar "eu te amo" foi cooptado por camadas e camadas de histórias literárias, teatrais e cinematográficas e traz um peso contigo que essas três simples palavras carregam mais fissão e gera mais medo e sofrimento que uma bomba nuclear.
Então do mesmo jeito que trocamos de celular todo o ano, compramos roupas fast fashion, pedimos comidas diferentes no delivery, testar outros tipos de amor é nossa maior prioridade, que como diz bell hooks, "amar é um ato, amar é uma ação."
Nos tempos que estamos vivendo, pode parecer impossível a ideia de Amor. Mas é por isso que ela é tão evolucionária. Por que quando você consegue ser e agir o amor nesses momentos de ódio, dor e destruição, é aí que o Ágape acontece e todo o resto entra no lugar.
O Amor é a maior coisa que temos.
Quando reaprendemos a amar nossos amigos, nossas famílias, a nós mesmos para assim conseguirmos amar toda a criação, é aí que alcançaremos nosso real potencial, pois não precisaremos buscar muito as realizações do lado de fora, pois já as teremos do lado de dentro.
Faz algumas décadas que estamos fomentando a versão mais rala e pobre do amor. Estamos buscando isso fora com granas, prêmios, cargos, posses. Mas sinto que isso não é suficiente mais e assim como os celulares mudam de chip todo o ano, temos de mudar esse nosso chip do modelo com "a minúsculo" para o modelo com "A Maiúsculo", que talvez só assim poderemos dar uma chance pro planeta, pro clima, pra gente e pra toda a criação.
Por mais empreendedores, investidores e tecnólogos dessas tecnologias como o Amor, a linguagem e a sociedade. Só investindo nelas é que o futuro vai vir mesmo. Seja aqui ou seja em Marte.
Posso ser louco de estar escrevendo isso em tempos de guerras, pragas e assassinatos, mas é como diria o filósofo Belchior, " Eu não estou interessado em nenhuma teoria / Nem nessas coisas do oriente, romances astrais/ A minha alucinação é suportar o dia a dia / E meu delírio é a experiência com coisas reais / amar e mudar as coisas, me interessa mais."
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