Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Carta aberta à Djamila Ribeiro, de uma pessoa que menstrua
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Olá, Djamila. Espero sinceramente que você esteja bem. Você não me conhece. Talvez se pergunte por qual motivo este reles mortal esteja preocupado com você.
Então, eu gostaria de, educadamente, me apresentar. Mas meu nome pouco importa. Minha idade, onde moro, as coisas que gosto e o que me faz feliz tampouco. Importa que você conheça um "eu" que representa muito daquilo que você diz acreditar conhecer.
E eu lamento muito o desconforto que você possa vir a sentir com a primeira coisa que eu tenho para te dizer, mas, lamento ainda mais o fato de ter que precisar dizer: sobre mim, você se enganou.
Entenda que enquanto me coloco aqui sem me nomear, não faço isso para me anonimizar, pois não tenho nem medo, nem vergonha, nem qualquer outro sentimento negativo sobre mim. Não me nomeio pois eu não sou um só.
Apesar do seu nome se repetir muitas vezes nos livros de minha estante, hoje te vejo de uma forma completamente diferente daquela que via quando li em voz alta as suas linhas para as minhas filhas pequenas.
É uma pena que você tenha usado o nome de tantas outras - que também dividem a mesma estante contigo aqui em casa - para embasar o delírio completamente distorcido que você criou sobre mim e tantas outras pessoas, sem entender o lugar de fala delas. Fragmentos fora de contexto são muito perigosos, e eu acreditava que você sabia disso.
Esta carta é para te dizer que, logo você, que ainda citou seu lugar de fala, escolheu silenciar o dos outros.
Felizmente, somos inteligentes demais para cair em suas palavras, que tentam disfarçar um desconforto que é seu, mascarando-o de "senso comum".
Mas eu estou aqui. Ainda que você não goste. Essa carta é também para te dizer que eu não preciso que você goste de mim. Eu não preciso que você destile aquilo que você vai chamar de "lugar de fala", quando te acusarem de propagar um discurso de ódio.
Agora desejo apenas que você encontre felicidade em algo. Talvez assim consiga preencher esse vazio em você, que te faz ter tempo de sobra para se incomodar com a vida dos outros.Pouco adianta tanto estudo se você segue sendo tão ignorante.
Enfim, deixa eu finalmente me apresentar: Eu sou aquele que, assim como você, menstrua. Assim como você, já esteve gestante. Assim como você, tem mamas.
Sou uma dessas pessoas que te incomodam. Sou uma dessas pessoas que também precisam lutar todo dia para serem vistas e respeitadas como "sujeitos de direitos''.
Sou um homem trans que gesta e menstrua. E que também precisa de políticas públicas para poder gestar em segurança e sair da pobreza menstrual.
Mas mais que isso, sou eu que digo quem sou. Jamais você ou qualquer outra pessoa.
Você não pode decidir apagar a vida de pessoas trans - no país que mais assassina pessoas trans no mundo, onde a expectativa de vida é de 77 anos, mas cai para 35 se você for uma pessoa trans.
Quem pode dizer o que me inclui enquanto homem trans, sou eu.
E, sim, eu sou uma pessoa que menstrua. E isso não tem relação alguma com você e o fato de você ser mulher.
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