Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Reportagem

Pescadores criam aplicativo para denunciar crimes ambientais na Guanabara

- Por meio do aplicativo De Olho na Guanabara, pescadores artesanais do Rio de Janeiro podem reportar derramamentos de óleo e gás em uma das baías mais poluídas do Brasil.

- Com a ferramenta, os pescadores esperam acelerar o processo de denúncia contra esses crimes, cuja resposta do poder público tende a sofrer com grande burocracia e lentidão.

Frequentemente, pescadores e pescadoras são os primeiros a testemunhar e sentir as consequências de distúrbios ambientais no mar. No entanto, não é raro que eles enfrentem inúmeras dificuldades no registro de denúncias, devido à burocracia do procedimento e a dificuldade em indicar o local exato da ocorrência.

No fim de julho, reuniram-se na Ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro, lideranças da pesca artesanal, ambientalistas e representantes de órgãos ambientais federais e da Marinha do Brasil para o lançamento de um aplicativo criado por pescadores artesanais, em parceria com a ONG 350.org Brasil, que visa facilitar denúncias de irregularidades ambientais provocadas pelo setor de petróleo e gás na Baía de Guanabara.

O aplicativo De Olho na Guanabara permite ao usuário realizar denúncias georreferenciadas, acompanhadas de foto ou vídeo, de maneira rápida, simples e anônima. Após registradas, as denúncias serão apuradas por moderadores e, caso validadas, encaminhadas às autoridades competentes (Ibama, ICMBio e Marinha do Brasil). As denúncias validadas são expostas em um mapa público que pode ser acessado através do site do aplicativo.

No momento, o acesso ao aplicativo está restrito apenas aos pescadores com cadastro aprovado pela Associação dos Homens e Mulheres do Mar da Baía da Guanabara (Ahomar).

Alexandre Anderson, pescador, diretor da Ahomar e um dos idealizadores do aplicativo, conta à Mongabay que a iniciativa surgiu do desejo de "não depender somente do poder público, que muitas vezes não tem a mesma velocidade que uma mancha de óleo".

Em 2013, os pescadores começaram a realizar o monitoramento da baía de forma independente, compartilhando informações em um grupo do WhatsApp. "A gente usava o nosso barquinho, ia no local, fotografava a mancha de óleo, um descarte irregular ou um grande vazamento, marcava o ponto com as coordenadas e usava o próprio WhatsApp para fazer a denúncia", relembra Alexandre.

Após firmar parceria com a 350.org, ONG internacional que luta pela transição energética justa, Alexandre explica que a proposta foi criar uma tecnologia que fosse "acessível para todos pescadores, pescadoras, jovens, idosos e pessoas da comunidade que têm esse viés de proteger seu ecossistema, seu meio ambiente".

Continua após a publicidade

Alexandre espera que o aplicativo tenha um efeito preventivo: "Quando tiver pescadores, barcos e embarcações próximas, as pessoas vão achar que eles estão com o aplicativo, então vão voltar atrás da sua ação criminosa de poluir".

Refinaria da Petrobras na Baía de Guanabara
Refinaria da Petrobras na Baía de Guanabara Imagem: Lucas Landau/350.org

Aline Luz, pescadora da Ilha de Itaoca e membro da Associação de Pescadores e Escarnadeiras de Siri da Praia da Luz compartilha com a Mongabay sua relação com o maretório (junção de maré com território) da baía fluminense: "Sou a oitava geração da minha família na pesca, e como pescadora, a gente tenta proteger o lado que a gente trabalha. Sem a Baía de Guanabara, a gente não vive, e eu sou muito grata a ela por esses anos todos de trabalho".

Apesar disso, Aline relata que para fazer uma denúncia "é uma burocracia tão grande que no final você acaba desistindo". Aline acredita que o aplicativo irá facilitar esse processo: "Eu acho que vai melhorar muito. Isso pra gente é uma ferramenta, uma arma de luta contra essa poluição que tá na Baía de Guanabara inteira".

Após conhecer o aplicativo, Alessandra Baptista, pescadora e diretora social da Associação de Pescadores e Pescadoras da Vila Pinheiro e Maré (Apemar), disse que "ele é de fácil acesso, ele é simples, ele é humano".

Para ela, essa iniciativa simboliza um passo importante em direção a uma Baía de Guanabara descontaminada: "É isso que a gente quer: um pescado de qualidade, qualidade na nossa água, qualidade de vida. A gente vai dar dor de cabeça às empresas que estão infelizmente prejudicando nosso meio ambiente".

Continua após a publicidade

Por Vitor Prado dos Anjos

* Notícias da Floresta é uma coluna que traz reportagens sobre sustentabilidade e meio ambiente produzidas pela agência de notícias Mongabay, publicadas semanalmente em Ecoa. Esta reportagem foi originalmente publicada no site da Mongabay Brasil

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.