Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Alimentar o povo, combater a pandemia do vírus e a violência da fome
O Brasil voltou para o Mapa da Fome e essa é a realidade vivenciada por 19,1 milhões de pessoas, segundo o estudo da Rede Penssan - Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar. São trabalhadoras e trabalhadores que perderam suas fontes de renda durante a pandemia, não possuem renda estável, vivem de bicos ou não conseguem acessar programas governamentais que garantam o acesso à comida. O estudo revela ainda que 116,8 milhões de brasileiros vivem em situação de insegurança alimentar, sem acesso pleno e permanente a alimentos.
A situação é grave, mas não é possível falar em fome sem relacionar o tema com a mercantilização dos alimentos, a concentração fundiária e a pressão que os conglomerados alimentares exercem sobre a agricultura camponesa. No Brasil, 1% dos proprietários detém 45% das terras agricultáveis e apesar dos agricultores e agricultoras camponesas produzirem a maior parte dos alimentos consumidos no Brasil, são os conglomerados alimentares e suas grandes empresas que dominam o processamento, a agroindústria, a armazenagem e a distribuição.
Se numa ponta a pandemia colocou mais da metade da população brasileira em insegurança alimentar, na outra temos o agronegócio comemorando supersafras e aumento na exportação de commodities, favorecidos pela retomada da demanda externa e pela desvalorização cambial, ou seja, eles se apropriam de um alimento que não produzem, controlam a cadeia de logística e distribuição e escolhem exportar, recebendo em dólar, em detrimento das necessidades da população brasileira que é obrigada a enfrentar preços elevados nos supermercados.
Assim, a desigualdade social expõe privilégios: em um ano, o número de bilionários no país subiu de 45 para 65 e enquanto a fome integra o cotidiano de 9% da população brasileira, somente este grupo de 65 bilionários, goza de uma fortuna estimada em 1,6 trilhão de Reais.
Com a alta nos preços do feijão, arroz, carnes, leite e óleo de soja, itens básicos da alimentação do povo, as pessoas tiveram que reduzir o consumo de alimentos o que pode agravar os riscos de saúde com a diminuição da imunidade, ainda mais necessária em tempos de pandemia. A pesquisa "Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil", realizada pelo Grupo de Pesquisa Alimento para Justiça da Universidade Livre de Berlim, na Alemanha, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e com a Universidade de Brasília (UnB), mostra que 44% das pessoas estão sem comer carne, 41% não comem frutas e 37% deixaram de comer hortaliças e legumes na pandemia.
Nesse contexto, é fundamental retomar políticas de Estado que garantam a segurança alimentar e nutricional, programas emergenciais para acesso à alimentação, auxílio emergencial integral para pessoas em vulnerabilidade nas cidades mas também no campo, bem como medidas estruturais de distribuição de terras, reforma agrária e soberania dos povos do campos, das águas e das florestas sobre seus territórios.
Mas o povo organizado não está assistindo ao desmonte das políticas públicas sem resposta. Diante do agravamento da crise, a solidariedade ativa passou a ser parte das ações que movimentos sociais realizam para salvar vidas e ajudar o povo a enfrentar o vírus e a fome.
A Campanha Periferia Viva - iniciativa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Pequenos Agricultores (MA), Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), Levante Popular da Juventude, Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD) e Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM) - tem mobilizado coletivos culturais, associações de bairros, movimentos populares, torcidas antifascistas de futebol, artistas, grupos de amigos entre outros para arrecadar e distribuir comida, produtos de higiene e livros nas periferias de 24 estados.
Já foram distribuídas 4 mil toneladas de alimentos oriundos de assentamentos e acampamentos da Reforma Agrária. São hortaliças, verduras, frutas e legumes que foram distribuídos nas cestas e em refeições prontas, entregues em ações como as marmitas solidárias. A diversidade e a qualidade dos alimentos, produzidos sem veneno e por famílias agricultoras, são fundamentais para a segurança alimentar e nutricional do povo. O acesso à comida e aos alimentos saudáveis é condição essencial no enfrentamento da pandemia de covid-19 no país.
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