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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Nossa luta como PcD é por uma sociedade que reconheça nossa humanidade

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Jamerson Mancio Francisco

20/03/2022 06h00

Era 7 de setembro de 2017. Eu estava a caminho de Conceição do Ibitipoca, a 98 quilômetros de Juiz de Fora, Minas Gerais. Já havíamos percorrido alguns quilômetros da rodovia MG 353, beirando o charmoso Rio do Peixe, quando senti uma súbita sensação de que o tempo havia parado. Me perguntando o que acontecia, me dei conta de que havíamos sido atingidos na traseira de minha motocicleta. Mariana, que estava comigo, sofreu escoriações e luxações. Em mim, a queda causou uma fratura exposta no tornozelo e não expostas na fíbula e tíbia da perna esquerda. A exposição do ferimento com o ambiente gerou uma osteomielite. Ou seja, uma infecção óssea. Até 2019 foram 11 cirurgias e 9 internações.

Durante um bom tempo pensei que não faria mais um monte de coisas de antes do acidente: viajar sozinho, jogar capoeira, andar de bicicleta, fazer trilhas pelas montanhas de Ibitipoca e correr da chuva. O que eu não havia me dado conta naquela época é que eu havia me tornado uma Pessoa com Deficiência (PcD). Tem sido muito importante e fundamental me reconhecer parte desta comunidade e de sua pluralidade.

Este acontecimento trouxe muitos outros acontecimentos dentro dele. Me transforma de maneira contínua, me leva a acolher como e quem eu sou. É essa combinação que me auxilia em meus processos de tomada de decisão hoje.

Em 2020 retomei minhas atividades físicas e o medo da infecção voltar foi se diluindo em meio à minha evolução diária. A retomada da rotina e os avanços na recuperação estão conectados diretamente com meu autoconhecimento: estou cuidando com mais generosidade dos meus sentimentos e minhas necessidades.

Ter uma rede de apoio é outra camada essencial que complementa uma caminhada de muitas conquistas e superações. A compreensão por parte de minha família, amigos e amigas forma uma base de confiança e uma rede de segurança que traz a certeza de que não estou sozinho.

O que estou querendo dizer é que essa experiência me expandiu, trouxe mais qualidade para eu observar como as relações humanas se dão. Sim, é tudo muito novo para mim, sigo me informando, estudando, em busca de mais entendimento para apoiar nessa luta contra a exclusão social.

Muita coisa se transformou depois daquele feriado de 7 de setembro. Uma das maiores mudanças aconteceu no convívio social. Em minha nova condição, passei a encarar e conviver com uma estrutura de sociedade pautada na exclusão, o que dificulta, e muita das vezes impossibilita, maiores evoluções em minha jornada. E na jornada de quem passou por situações parecidas com a minha. Pessoas com deficiência são seres humanos, assim como você que está acompanhando esse raciocínio.

Venho aprendendo, por exemplo, que um dos caminhos são as políticas públicas de inclusão, ofertando acesso a bens, serviços e atuando na garantia de direitos sociais básicos. E não falo somente daquelas voltadas para as pessoas com deficiência, mas também para a população negra, as mulheres, os territórios e populações em situações de vulnerabilidade social e a comunidade LGBTQIAP+, em caráter de reparação, já que ao longo da história esses grupos foram e são sistematicamente deixados de lado, oprimidos e até exterminados.

Para mudanças estruturais e institucionais, essas pautas precisam ser debatidas e avaliadas num âmbito maior, com a participação popular e o envolvimento e validação de órgãos e agentes públicos que representam os interesses desses grupos excluídos.

Sensibilizar as pessoas diante de causas tão urgentes é outra possibilidade. Nesse sentido, se me permite trazer algum direcionamento, que tal procurar se informar sobre as pautas que estão sendo debatidas na sociedade? Procure saber quais os motivos que levam determinados grupos a se manifestarem em prol de sua existência e sobrevivência, exercite sua empatia. Não ignore ou normalize notícias de barbáries que acontecem diariamente e estão estampadas nas vitrines das mídias.

Sensibilização, alinhada a um conjunto de ações, pode gerar a construção de alianças genuínas entre pessoas que se importam umas com as outras. Será diante desse cenário de cooperação que iremos construir uma sociedade mais igualitária. Conforme crio pertencimento nas pautas que envolvem as pessoas com deficiência, percebo que a luta da comunidade PcD é por uma sociedade que reconheça nossa humanidade.