Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Na vida e na carreira, você só conecta pontos olhando o que já viveu
"É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a sua prática", disse uma vez Paulo Freire, filósofo educador pernambucano e uma inspiração para mim. Me peguei pensando se eu realmente tenho algo a dizer. E se tenho, será que alguém me escuta. Inspirada na fala de Freire, aqui é uma tentativa de falar sobre a minha prática.
Em 2008, eu tinha 19 anos e tive a oportunidade de fazer faculdade. Um momento conturbado, mas muito especial na vida de uma estudante. Medicina, engenharia, administração, psicologia, pedagogia. Essas eram algumas das opções de carreira na lista de cursos. E nada, nada fazia sentido para mim. Até que cheguei no curso de comunicação social integrada, uma mistura de relações públicas, publicidade e jornalismo. Por eliminação, era esse. Afinal de contas, saber me comunicar melhor não iria fazer mal a ninguém e poderia ser útil para qualquer carreira.
Naquele momento, não tão consciente do contexto de privilégio que me deixava navegar naquele pensamento, eu segui sonhando. E sigo até hoje. Mas com um pouco mais de consciência de classe, gênero, sexualidade, política e autoconhecimento para chegar até aqui. Aos 19 anos de idade, acreditei que até o final da faculdade daria tempo de decidir o que eu queria da vida, assim pensei. Há!
Foi ali, na PUC Minas São Gabriel, no caminho para o aeroporto de Confins, ao lado da estação de trem de mesmo nome, que eu me formei em 2012. Enfim, com o diploma em mãos, eu tive certeza de que ainda não tinha ideia de para onde levar minha carreira. E agora? Pensei que talvez o problema não foi que não consegui escolher bem entre as opções que me foram dadas naquela lista, a questão é que o que eu queria nunca esteve lá.
De comunicóloga e escritora de livro para escolas na Amazônia a empreendedora social
Entre a minha formação acadêmica em Belo Horizonte e as aventuras e projetos pelo mundo, gostaria de ressaltar principalmente três marcos importantes. Um deles foi o Projeto Bases do Aprendizado para o Desenvolvimento Sustentável em parceria com a Fundação Amazonas Sustentável (FAS), um profundo projeto de educação na Amazônia que resultou no lançamento de um livro que coescrevi com minha parceira de projeto, Bianca Monti.
Outro momento estruturante na minha jornada foi a decisão de percorrer os países vizinhos ao Brasil e mergulhar nas raízes latinoamericanas, pois, por algum motivo estranho, pareciam tão distantes. Foram nove meses de mochila nas costas. Foi quando tive a certeza da minha conexão com esse continente e suas histórias, mesmo que muito marcado por invasões e lutas. A vida e as cores eram, e seguem sendo, sempre predominantes enquanto viajava entre países como Peru, Equador, Argentina, Bolívia, Guatemala, Nicarágua, Costa Rica, México, Belize, Colômbia e Chile.
E por último, mas não menos importante, morei seis anos na capital paulista. Entre desafios tão grandes quanto a cidade, saí de lá certa de que existe sim amor em SP, foi lá que me tornei empreendedora social. Isso sim foi a minha principal escola e continuo aprendendo, agora de volta fazendo morada em Minas Gerais (por enquanto), mas sempre em movimento.
A história é longa, mas principalmente nos últimos dez anos muita coisa aconteceu - você também sente isso? Eu não sou conhecedora de astrologia, mas essa tal transição da era de peixes para a de aquário certamente vem trazendo revoluções, rebeldia e consciência. Com a pandemia, enfraquecimento de políticas públicas socioambientais, constantes invasões de territórios indígenas, violência, fome e guerra, é difícil se manter confiante e seguir adiante, mas me agarro ao estranho equilíbrio de esperança e indignação.
De 2000 para cá, eu não sei exatamente o que aconteceu com os astros, mas muitas organizações com propósito social nasceram no mundo e no Brasil. Nesse boom de natalidade de boas ideias gerando bons negócios, encontrei na internet o recém-nascido Amani Institute (2012), que naquele momento apenas operava no Quênia, no continente Africano. E, como eu recém terminava minha transformadora e provocante jornada em mais de 10 países na América Latina, me pareceu quase que um natural próximo passo ir ao Quênia e finalmente pisar no continente africano. Além do meu espírito viajante, eu finalmente encontrei uma organização que, pelo que eu via no site, tinha total sentido pra mim e o que eu andava buscando como caminho e carreira.
O Amani Institute se propõe a envolver pessoas e suas carreiras, organizações e suas operações em prol do desenvolvimento socioambiental e criação de impacto positivo através de treinamentos e programas educacionais. Mesmo sem vagas abertas, me ofereci para trabalhar - eu estava disposta a fazer qualquer coisa. Foi no início de 2015, junto com a cofundadora e então diretora executiva, minha amiga e parceira Ilaina Rabbat, que cofundamos o Amani Institute no Brasil. Em 2022 completa 10 anos no Quênia, sete anos no Brasil e cinco anos na Índia.
Ao longo da minha jornada de buscar a sinergia entre minha fala e minha prática, como já pontuou Paulo Freire no início deste artigo, entendi que o pulo do gato está, na verdade, na escuta. Tanto a escuta atenta ao nosso entorno, quanto a escuta verdadeira de si. No fim das contas, é ironicamente uma questão de comunicação. No processo de escuta se cria espaço, entrelaços e diálogos que quebram fronteiras.
São quase 15 anos que eu trabalho com educação. Você sabia que a sabedoria disponível no mundo atual e o conhecimento humano duplicam a cada 12 horas? Para fins de comparação, para duplicar o conhecimento humano em 1945 era preciso um intervalo de 25 anos. Ou seja, saber a gente já sabe o suficiente, agora, mais do que nunca, é preciso realizar. "A educação não muda o mundo. A educação muda as pessoas que mudam o mundo", afirmou Paulo Freire.
Se você me ouviu e leu este artigo até aqui, tanto eu quanto você certamente temos algo a dizer. A escuta e a fala são uma ponte para a prática e realização, e esse artigo é um convite ao diálogo. Quando dialogamos verdadeiramente com nós mesmos, com o outro e com o mundo, iniciamos as possibilidades de comunhão, de respeito ao diferente e crescimento como sociedade, e, assim podemos partilhar ideias, soluções, desejos e encontrar aliades.
Para finalizar, só tenho um convite: na próxima vez que estiver conversando com alguém, pratique estar intencionalmente presente, sem pensar o que vai dizer em seguida e sem se julgar quando for a sua hora de falar. Agradeço a sua leitura e escuta até aqui.
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