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OPINIÃO

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Como nova lei sobre injúria racial pode ajudar no combate ao antissemitismo

Na posse da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, o presidente Lula (PT) sancionou lei que equipara o crime de injúria racial ao de racismo. - Divulgação
Na posse da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, o presidente Lula (PT) sancionou lei que equipara o crime de injúria racial ao de racismo. Imagem: Divulgação

João Torquato*

27/01/2023 06h00

No último dia 13 de janeiro, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), sancionou uma lei que equipara o crime de injúria racial ao de racismo. Agora, o crime de injúria racial também se torna inafiançável e imprescritível. A nova lei endurece as penas para atos de injúria racial e abrange os crimes raciais cometidos na internet. Se tratando do país que mata um jovem negro a cada 23 minutos, essa lei é um avanço nas políticas públicas de reparações que o Brasil ainda tem muito o que mudar.

Um dos maiores desafios do povo negro no Brasil era a punição de atos racistas cometidos em espaços públicos, esportivos e religiosos. Na maioria dos casos, os atos criminosos eram enquadrados como injúria racial - quando o crime praticado é direcionado a uma única pessoa por conta da sua raça, religião, etnia, cor ou origem, enquanto o de racismo é quando o crime é direcionado a um coletivo e fere toda uma comunidade.

Antes da nova lei, o crime de injúria tinha uma pena mais branda e havia a possibilidade de quem cometeu pagar fiança e responder em liberdade. Agora, além da equiparação entre os dois crimes, a pena também aumenta de 2 a 5 anos.

Não foram poucas a cenas de racismo que passaram a ser filmadas e expostas nos últimos anos. O Brasil, último país a abolir a escravidão, o país onde o povo negro continua sendo a maior vítima de violência policial, também é o país onde 84% dos casos de crimes raciais cometidos, foram registrados como injúria racial e 75% dos réus eram absolvidos de acordo com uma pesquisa da FGV. O país que mais mata é também o país que menos pune.

Ou seja, sabe aquela pessoa que chamou uma pessoa preta de macaco? Na maioria das vezes essa pessoa respondia por injúria racial, pagava fiança e respondia em liberdade e não era condenado.

A nova lei também é uma ferramenta no combate ao antissemitismo no Brasil, que cresce a cada dia e na maioria das vezes em que é exposto ou denunciado, acaba sofrendo um processo de apagamento. Ainda é comum que a própria narrativa antissemita seja utilizada para relativizar o tema do preconceito contra judeus, trazendo antigos estereótipos, em que os judeus controlam o capital internacional, conspiram contra o seu país de origem ou quando alguém fala em um programa no YouTube que o nome de um judeu é impronunciável.

Apesar das diferenças estruturais e históricas, não é à toa que os dois crimes cresçam em paralelo. Segundo dados do Observatório Judaico dos Direitos Humanos, os crimes de ódio contra judeus aumentaram ano a ano entre 2019 e 2022.

Em 2019, o vereador Daniel Annenberg foi chamado de "judeu filho da p" pelo colega de Câmara Adilson Amadeu. Três anos depois, o político foi condenado por injúria racial, mas, pela pena baixa, de 1 ano e 4 meses de prisão, ele pôde revertê-la em prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período e recorre em liberdade.

Tanto o racismo quanto o antissemitismo partem de um imaginário de um inimigo para sociedade, ou por ser considerado um ser inferior ou por ser acusado de conspirar contra o seu próprio país a troco de interesses de seu povo ou sua religião.

Mesmo com o avanço na legislação, só a mudança no âmbito legislativo não basta, é necessário que haja um movimento por parte dos poderes públicos para lidar com o racismo em outras esferas, como no âmbito educacional e estrutura da sociedade.

É importante que as forças de segurança tenham um preparo para lidar com os casos de crimes raciais e não coloque quem denuncia em uma situação de constrangimento ou de desvalidação do fato.

A equiparação entre os dois crimes é uma importante vitória na luta contra o racismo no Brasil, sendo mais uma ferramenta de punição de qualquer ato racista cometido, independentemente de ser direcionado a um grupo ou a uma pessoa, mostrando que lugar de racista é na cadeia.

Que essa lei seja o começo de uma mudança histórica no nosso país para varrer o racismo, o antissemitismo e todas as formas de preconceito.

*João Torquato é músico, ativista do movimento negro, judeu, apresentador do podcast "E eu com isso?" e assistente de Programas e Projetos do Instituto Brasil-Israel

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL