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OPINIÃO

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Ibama tem razão: exploração de petróleo no Amazonas pode gerar Brumadinho 2

Ibama reavaliará pedido da Petrobras para exploração na foz do Amazonas - Reprodução | Flickr Ibamagov
Ibama reavaliará pedido da Petrobras para exploração na foz do Amazonas Imagem: Reprodução | Flickr Ibamagov

Lucas Ferrante*

Colaboração para Ecoa, em Manaus (AM)

14/06/2023 04h00Atualizada em 15/06/2023 11h59

A quem interessa desqualificar o Ibama? Esta é uma das primeiras perguntas que temos que nos fazer. Mas antes, precisamos entender por que o Ibama está sendo tão atacado nas últimas semanas, principalmente por políticos da bancada ruralista, que representam os interesses de grandes proprietários de terras.

Em 2019, eu e o pesquisador Philip Martin Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), publicamos um artigo no periódico Environmental Conservation, que é editado pela Universidade de Cambridge, denunciando uma agenda da bancada ruralista que tinha como objetivo fragilizar a legislação ambiental do Brasil e sucatear órgãos de fiscalização, como o Ibama. Esta agenda foi comprovada por várias outras publicações, incluindo a prestigiada revista Science, um dos maiores periódicos científicos do mundo.

A questão é que a retomada das políticas ambientais pelo presidente Lula (PT) e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (REDE), incluindo o fortalecimento do Ibama que retomou as fiscalizações do desmatamento na Amazônia, gerou insatisfação de criminosos e de empresas do agro, também criminosas, que têm se beneficiado do desmatamento.

São justamente estas empresas que fomentam as campanhas de vários políticos que têm defendido um novo desmonte ambiental. Estes políticos, denominados como bancada ruralista ou bancada do boi, têm formado um conluio com outras duas bancadas. A bancada da bala, que é constituída por parlamentares que defendem o "armamento da população" e a quem se atribui o aumento de licenças para caçadores, atiradores e colecionadores de armas (os CACs), que tem alimentado o arsenal de grupos criminosos ligados a grilagem de terras na Amazônia; e a bancada da bíblia, que tem incentivado a evangelização de indígenas, o que reprime a cultura indígena e coloca em risco os territórios que estão sendo constantemente invadidos.

A união destas três bancadas tem tentado promover uma votação massiva de leis que visam, pura e simplesmente, sucatear a legislação ambiental e enfraquecer os órgãos de fiscalização. Esta é uma espécie de "paredão" promovido pelo BBB, bancadas do boi, da bala e da Bíblia, para fragilizar novamente o Ministério do Meio Ambiente.

A tentativa de ruralistas e alguns políticos em desmoralizar o Ibama já vem ocorrendo há semanas, e já foi abordada aqui em Ecoa, como o caso da capivara Filó, onde ruralistas tentaram transformar o Ibama em bode expiatório. Os ataques ao Ibama e a ministra Marina Silva prosseguiram com a decisão do Ibama em não conceder a licença de exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas, localizada na costa do Brasil e da Guiana Francesa.

De fato, o Ibama agiu corretamente, pois de acordo com os próprios estudos produzidos pela Petrobras, em caso de um vazamento, a contenção demoraria mais de 48 horas, o que causaria um desastre tanto ambiental como social em toda a costa brasileira, o que também é justificado pela falta de estudos de modelagem de dispersão de óleo em caso de vazamento.

Em caso de acidente, não teríamos apenas a vida marinha afetada drasticamente, mas também comunidades pesqueiras ao longo da costa sul-americana, o que inclui não apenas o Brasil, mas países como a Guiana, Guiana Francesa e Suriname. Neste tipo de empreendimento, temos que entender que os danos podem ser ambientais, sociais e econômicos, tal como ocorreu em Brumadinho e Mariana com o rompimento das barragens de rejeitos.

De fato, o Ibama é um órgão técnico e tem agido como tal, considerando em suas decisões aspectos técnicos dos impactos que estes grandes empreendimentos podem gerar, não apenas na região amazônica, mas para todo o Brasil. É crucial que entendamos que as decisões do Ibama têm sido respaldadas por pesquisadores e o órgão tem vital papel para, além de evitar impactos ambientais, evitar impactos socioeconômicos e sobre a saúde pública.

*Lucas Ferrante é biólogo, formado pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal), mestre e doutor em biologia (ecologia) pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Dentre suas diferentes áreas de pesquisa, tem pesquisado o impacto de grandes empreendimentos na Amazônia, zoonoses e a conservação da biodiversidade.