Opinião

O que é racismo ambiental e por que você deveria saber que ele existe

Quase cair em valões em dias de enchentes, ter ratos com frequência entrando em casa, sofrer periodicamente com falta de água, ter problemas respiratórios por conta da poluição gerada por indústrias e automóveis que passam por vias expressas do entorno. Esses são só alguns exemplos do que jovens e famílias moradoras de favelas passam em todo o Brasil, assim como Inahra Cabral, uma das autoras deste texto, criada em uma das favelas que compõem o Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.

Vivemos uma crise, que precede um colapso, e o racismo ambiental, conceito que se refere a ações que geram impacto ambiental negativo em locais de moradia da população negra e comunidades tradicionais, alerta para o fato de que quem mais sofre com esse agravamento das condições climáticas é quem menos contribui para ela - favelas, periferias, comunidades tradicionais e rurais.

Desde que a Maré se consolidou como lugar de moradia, a comunidade clama por saneamento básico. Uma das primeiras lutas que mobilizou o povo mareense foi pelo acesso à água potável canalizada em suas residências. Sem água encanada em casa, os primeiros moradores construíram "rola-rolas", tecnologia que facilitou o transporte da água das torneiras públicas (chamadas popularmente de bicões) até os barracos e palafitas. A partir da pressão da Chapa Rosa, primeira chapa eleita para a Associação de Moradores do território que pautou os problemas de saneamento, as primeiras medidas públicas foram tomadas.

A luta por saneamento na Maré é histórica, e também muito atual. Com o recente processo de privatização no município novas promessas apareceram mas os velhos problemas persistem. Moradores de favelas e periferias cariocas relatam que têm sido cobrado o valor total de R$45,30, pela concessionária Águas do Rio, referente a tarifa social. Essa cobrança muitas vezes é realizada virtualmente, e muitos moradores/as nem sabem que estão devendo. Importante mencionar que metade do valor mensal é relativo à coleta e tratamento de esgoto.

Porém, apesar da Estação de Tratamento de Esgoto Alegria, uma das maiores do Brasil, estar localizada no Caju, bairro vizinho da Maré, não há conexão entre ela e as redes coletoras das comunidades. Ou seja, além do tratamento de esgoto estar sendo negado, os mareenses estão tendo que pagar por um serviço inexistente enquanto 13,9 milhões de litros de esgoto produzidos diariamente na Maré correm a céu aberto por suas ruas e canais.

Saneamento é direito humano e pela lei tem que ser feito pela prefeitura ou pelas concessionárias a quem o serviço foi concedido, mas o Complexo da Maré é um belo caso em que a sociedade civil organizada faz muito mais do que os responsáveis.

E o que você tem a ver com tudo isso? Se você é uma pessoa que pode resumir a crise climática a um calor mais desagradável ou a um inverno mais rigoroso e esse é o máximo que ela vai afetar a sua vida, use seus privilégios para apoiar e fortalecer as organizações e coletivos que estão atuando para amenizar os impactos na vida da população mais afetada.

E se você faz parte de alguma das organizações responsáveis para que o saneamento da Maré melhore, leia as Cartas de Saneamento, instrumento construído coletivamente pelos moradores, ativistas ambientais de e especialistas em Fóruns de Saneamento, faça estas cartas chegarem aos tomadores de decisão e ajude a garantir que quem vive os problemas seja protagonista das soluções.

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Inahra Cabral é arquiteta e urbanista pela UFRJ, cria do Complexo da Maré e de Ramos. É sócia da Germinal ATE, ONG que atua nos campos tecnologia social educação e trabalho e coordena o projeto Lutas Urbanas Tecnologia e Saneamento (LUTeS) que atua na Nova Holanda e instalou o 1° biodigestor do Complexo da Maré de forma participativa. É ativista contra o Racismo Ambiental e atua em extensões universitárias junto a grupos e territórios populares trabalhando com questões de saneamento ecológico, moradia, autogestão e tecnologias sociais.

Leonardo Adler é engenheiro ambiental, mestre em tecnologia social e tem 14 anos de dedicação ao saneamento, sendo 10 deles com foco em levar os projetos para as comunidades que mais precisam do acesso a este serviço. É sócio fundador da Taboa Engenharia, empresa vencedora do 2º Prêmio ECOA na categoria Negócios que Impactam, e hoje se dedica de corpo e alma à melhoria do saneamento na Terra Indígena Yanomami, como Engenheiro Ambiental do DSEI Yanomami/SESA.

Tito Cals é engenheiro ambiental, sanitarista e civil. Atua com meio ambiente desde 2008 e com saneamento desde 2014. É sócio fundador da Taboa Engenharia e engenheiro do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS/Fiocruz).

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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