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Rodrigo Ratier

WhatsApp bolsonarista vai do pânico ao êxtase com vídeo de reunião

22/05/2020 20h49

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"Independentemente do teor do vídeo, atitude de tornar público é criminosa. É afronta total!", dizia a postagem no horário do almoço. "Obrigado Moro, Obrigado Celso de Mello", "Este vídeo acabou de reeleger Bolsonaro", dizia outra, às 18h46. Às 19h29, um tuíte falso, atribuído ao próprio presidente, afirma: "Hoje foi o único dia que o STF trabalhou bem. Brasil, família, armas e p. no c. do Doria". Foi assim, do inferno ao céu, a reação dos grupos de WhatsApp bolsonaristas ao vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, liberado hoje (22) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello.

Grupos bolsonaristas do WhatsApp reúnem os apoiadores "raiz" do presidente, os militantes mais inflexíveis. Monitoro 29 dessas comunidades desde 2018. É no Zap que circulam as peças mais agressivas contra adversários. Aproveitando a criptografia que protege as mensagens no aplicativo, cards e memes reproduzem, em tom pesado, narrativas básicas dos influencers bolsonaristas — ministros, deputados da base, youtubers alinhados. Opiniões divergentes são raras — em caso de recorrência, os "infiltrados", no linguajar dos militantes, são excluídos pelos administradores.

Mensagem enviada em grupo de WhatsApp bolsonarista após divulgação de vídeo da reunião de 22 de abril - Reprodução - Reprodução
Mensagem enviada em grupo de WhatsApp bolsonarista após divulgação de vídeo da reunião de 22 de abril
Imagem: Reprodução

Até a liberação do vídeo, o Supremo Tribunal Federal era o alvo do dia. "General Heleno enquadra STF", diz o título de um vídeo, em alusão à carta do general Heleno ameaçando "consequências imprevisíveis" caso o celular do presidente fosse apreendido. "Tem de fechar essa pocilga em nome da lei e da ordem", diz postagem de 15h53. Entram em cena estratégias clássicas da comunicação bolsonarista, como a inversão de acusação ("O celular de Adélio é protegido ao extremo. Mas o do presidente tem de ser entregue para a perícia") e o chamado à ação ("vamos subir a hashtag #HelenoJaTaNaHora", suposta alusão à intervenção militar no Tribunal).

Outro padrão discursivo, a oposição amigo-inimigo, defende o golpismo violento: "quero ver blindados cercando os bandidos de Toga", diz uma postagem. Resposta: "Eu também. E tem que pendurar em praça pública para servir de exemplo nas próximas gerações".

Com a divulgação do vídeo, começa uma leitura seletiva da reunião. Pontos polêmicos ou negativos não aparecem. Não há menção à defesa do fim do isolamento social; não se comenta Ricardo Salles sugerindo aproveitar a pandemia de Covid-19 para passar reformas infralegais de desregulamentação no meio ambiente. Nenhuma palavra sobre Paulo Guedes dizendo "tem que vender essa porra [o Banco do Brasil]". Silêncio, também, quanto à ausência de medidas de enfrentamento às mortes por coronavírus, a Bolsonaro sinalizando a existência de um sistema "particular" de informações ou exigindo a troca da segurança "lá na ponta" — para Sergio Moro, uma alusão à chefia da Polícia Federal do Rio de Janeiro.

Tuíte falso compartilhado em grupos bolsonaristas no WhatsApp - Reprodução - Reprodução
Tuíte falso compartilhado em grupos bolsonaristas no WhatsApp
Imagem: Reprodução

Palavrões são comemorados. Sinais de "um presidente pistola, autêntico e falando o que tem de falar, sem filtro", segundo um integrante. "Apenas o sentimento e intenções cívicas e patrióticas", opina outro. "Amei! Mais feliz ainda com o meu voto!", diz postagem compartilhada em pelo menos cinco grupos.

Poucos minutos após a exibição das imagens pelas TVs, já circulavam pelo aplicativo trechos editados da reunião. Vídeos entre 1 e 5 minutos, ligados a perfis alinhados no Youtube ou adaptados para o próprio WhatsApp, destacavam pontos-chave para a militância. Campeão de compartilhamento: a intenção de Bolsonaro de por uma arma na mão de cada brasileiro. Rapidamente, "Povo armado jamais será escravizado" vira palavra de ordem em cards de apoio. "Discurso épico defendendo a liberdade do povo", diz o título da postagem. "Foi a melhor parte", concorda um militante. "Ele está defendendo nossas liberdades contra os comunistas", emociona-se uma militante, encerrando o post com emoji de palminhas.

Conforme avança a noite, a comemoração continua, mas já divide espaço com outro recurso usual: a mobilização da tropa frente uma ameaça iminente. Os inimigos, agora, são os telejornais noturnos. "Fiquem atentos, a imprensa novamente vai querer chorar como recém-nascido. O [apresentador José Luiz] Datena já está fazendo o mimimi dele na Band. Tudo jogo combinado!". Um apoiador concorda, e acrescenta: "Não liguem a Globo hoje! Deixem o Bonner falando sozinho!".