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Com números 'sujos', Ideb esconde que pandemia não acabou para a educação
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Quem acompanha a pauta de educação estava prevenido, de antemão, que os números recém-divulgados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) viriam "sujos". O principal termômetro da qualidade do ensino brasileiro é composto por uma combinação de indicadores de rendimento (reprovação, evasão, abandono) e desempenho (a nota de uma prova).
A pandemia causou problemas às duas frentes: de um lado, a política de aprovação automática adotada por parte da rede em virtude da crise sanitária jogou o índice artificialmente para cima. De outro, as dificuldades na aplicação do exame, que em 2021 testou bem menos gente que de costume, minam a confiança de que ele represente um retrato acurado do que crianças e jovens efetivamente aprenderam no biênio 2020-2021.
Em linhas gerais, houve estagnação nos anos iniciais do ensino fundamental ante a edição anterior (da nota 5,9 em 2019 para 5,8 em 2021). Os anos finais registraram discreta melhora (4,9 para 5,1), enquanto o Ensino Médio ficou na mesma (nota 4,2, um ponto abaixo da meta projetada).
Taxas de aprovação em alta (95,2% no fundamental, ante 88,6%) mascaram as perdas no aprendizado. Mais do que nunca, comparações com outros anos e entre municípios e estados devem ser feitas de maneira cautelosa - o melhor mesmo é não comparar. O mais prudente é considerar o Ideb como um dos "sinais clínicos" do atual estado da educação brasileira. E o diagnóstico não é bom.
Segundo dados do Unicef e do Cenpec, 3,7 milhões de estudantes matriculados (8% do total) não tiveram aula por falta de conectividade em 2020. Outro 1,8 milhão desistiu das aulas. Mesmo entre quem ficou, não é possível garantir que houve acesso à educação.
Em São Paulo, estado mais rico da federação, um relatório do TCE revelou que 81% dos estudantes da rede estadual (2,62 milhões de alunos) se conectaram por no máximo duas horas na plataforma de ensino remoto em 2020. 53% não chegou nem a se registrar no sistema. Em dezembro, último mês de aula, menos de 3% estavam participando.
É virtualmente impossível que esse estado de coisas não tenha impactado negativamente a aprendizagem, como sugerem diversos relatos em escolas. Os problemas se multiplicam: estudo do Conselho Nacional da Juventude (Conjuve) apontou ansiedade e abuso de redes sociais em 60% dos estudantes entre 15 e 29 anos.
Nas redes municipais, a ferramenta mais usada durante o ensino remoto emergencial foi o WhatsApp (93%), inadequado para aulas online. Avaliações estaduais como as da rede paulista apontam uma queda muito mais acentuada no desempenho. O retrocesso é evidente.
Há gente graúda tratando esse enorme contingente de estudantes que tiveram negado seu direito à educação como "geração perdida". A visão catastrofista e irresponsável desvia o foco da necessidade de se agir concretamente e em larga escala para trazer de volta à escola quem desistiu e para recompor as aprendizagens. As iniciativas até agora foram tímidas e pontuais.
O Ministério da Educação (MEC), que deveria coordenar as políticas de recuperação, tem se omitido vergonhosamente, deixando redes estaduais e municipais sem orientação mínima. Milhões de estudantes em situação de defasagem precisam e merecem um esforço conjunto para aprender o que foi tirado durante a pandemia. A falsa estabilidade do Ideb não pode mascarar essa urgência.
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