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Suspensão só adia decisão: governo vai reformar o irreformável?
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Se confirmada, a suspensão da implantação do Novo Ensino Médio (NEM) por 90 dias vai estancar o avanço do modelo em estados em que a reforma pouco avançou - vamos lembrar que essa etapa de ensino é responsabilidade majoritária dos estados. Mas o "fica como está" também tem um lado perverso nos locais em que as coisas já mudaram bastante. É o caso de São Paulo, onde a carga diversificada de disciplinas como "projeto de vida", "comunicação e marketing" e "empreendedorismo" tomou o lugar das disciplinas tradicionais, aligeirando a formação e, no fim das contas, prejudicando os estudantes. Porque, ao menos em 2024, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) vai continuar cobrando o de sempre.
Como demonstram os estudos da Rede Escola Pública e Universidade (Repu), a experiência paulista também reúne outras mazelas da reforma: a atribuição de disciplinas a professores sem a formação adequada, a expansão das aulas online, e a ausência de opções de itinerários em cidades com redes pequenas. Nenhum desses problemas têm solução rápida. Para ficar em uma das dificuldades, quem é o docente adequado para lecionar "projeto de vida"? Quem vai formá-lo, com qual metodologia e qual objetivo?
O resultado mais evidente é o aumento da desigualdade. Os problemas atingem sobretudo as escolas públicas mais vulneráveis. A rede particular, por outro lado, segue com a formação para o vestibular adicionando as novas disciplinas. Se há relatos de sucesso que superem o exemplo anedótico, os defensores do NEM têm falhado em mostrá-los. Por outro lado, se multiplicam as experiências de alunos sem aula ou desmotivados, de escolas desorganizadas e de professores desorientados, de gente dizendo que pouco conseguiu aprender ou ensinar.
É pouco provável, ainda, que uma consulta popular açodada dê conta de ouvir - e, principalmente, gerar mudanças - baseada nas aspirações de alunos e professores. Ainda mais porque os setores à esquerda veem o processo como armadilha. Por mais que se questione a disposição de tais grupos ao diálogo, é preciso reconhecer que os antecedentes de consulta pública, mesmo sob governos do PT, ouvem muito e fazem pouco.
Quem acompanhou o processo de construção da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) há de se lembrar do "escutacionismo" em auditórios repletos de gente e das centenas de milhares de alterações propostas pela internet cujo destino se desconhece. Prevaleceu a ausência de transparência sobre o que e como seria de fato alterado com base na consulta.
Gestado em gabinete fechado no interregno golpista de Temer, o NEM já nascia morto: como fazer valer uma proposta sem construí-la junto com seus maiores interessados (alunos e professores)? Até aqui, a gestão Camilo Santana tem tentado conciliar caminhar na linha tênue entre o gerencialismo - representado por institutos e fundações empresariais, o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e a experiência "resultadista" da cidade de Sobral e do Ceará, assentada no coração do MEC com o próprio Santana e a secretária-executiva Izolda Cela - e a perspectiva da educação como direito - predominante em sindicatos e universidades públicas.
Em um campo tão conflagrado como o da educação, é pouco provável que consiga ter sucesso nessa postura dúbia.
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