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Segurança nas escolas: 10 soluções que funcionam e 4 que não resolvem
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Depois do choque, a ação. Os dois recentes atentados contra escolas, em São Paulo (SP) e Blumenau (SC), provocaram um ambiente de inquietude e desorientação entre alunos, pais e professores.
A confusão é justificável: não havia protocolos claros para lidar com esse tipo de ameaça, uma realidade nova e pouco disseminada no país. Com o problema sob os holofotes da opinião pública, a situação se inverteu. Nos poderes legislativo e executivo, multiplicam-se as iniciativas de projetos de lei e políticas de proteção do ambiente escolar.
Como nem todas apontam na mesma direção - algumas são diametralmente opostas -, o clima agora é de barata-voa.
Levar policiais armados para as escolas? Massificar as câmeras e detectores de metais? Contratar psicólogos em caráter emergencial? Evitar falar sobre o assunto ou expô-lo até as entranhas?
As dúvidas são diversas e o acordo num campo polarizado como a educação é difícil. Em busca de respostas sobre o que funciona, o que não resolve e o que pode até piorar o problema, a coluna ouviu quatro especialistas em tópicos específicos relacionados com o assunto: educação moral, militarização das escolas, gestão escolar e direito da criança e do adolescente.
Além das credenciais acadêmicas, as fontes consultadas possuem familiaridade com o chamado "chão da escola". O que vem a seguir, portanto, é uma visão da educação sobre um tema que a afeta diretamente.
Consensos:
Não se opõe curto e longo prazo. A solução para o problema passa pela prevenção. Mas, neste momento, é preciso transmitir às famílias uma percepção de segurança."Com cuidado para que as ações de resposta rápida não se tornem permanentes", afirma Telma Vinha, professora da Faculdade de Educação da Unicamp e pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral (Gepem).
Medidas puramente de segurança só combatem as consequências. "O ataque às escolas é consequência do extremismo, da violência e do ódio que estão espalhados na sociedade", diz Catarina Almeida Santos, professora da Faculdade de Educação da UnB e pesquisadora de militarização escolar. "A segurança deveria estar focada no desbaratamento dos grupos de radicalização."
É preciso integrar escola e segurança pública - e isso já existe, mas é pouco conhecido. Institucionalizado em 2006, o Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente articula as áreas de saúde, educação, assistência social, trabalho, segurança pública, promoção da igualdade e valorização da diversidade. Traduzindo: em casos de violência escolar, por exemplo, já existem instruções para o contato entre escola, polícia, conselhos tutelares e estruturas de saúde mental. Falta pôr em prática decentemente.
Cada um precisa fazer a sua parte. Está ao alcance de alunos, pais e professores abrandar a fervura do pânico. Ao ter contato com uma suposta ameaça, não repasse. Denuncie aos canais das secretarias municipais e estaduais. Em nível nacional, o Governo Federal criou um link específico e o WhatsApp (61) 99611-0100 para relatar ameaças, uma alternativa ao Disque 100.
Medidas efetivas:
Reforço da ronda escolar. Ação vista como necessária para transmitir sensação de segurança. A ideia é de que as forças policiais estejam no ambiente externo para garantir condições de a escola funcionar bem e autonomamente, segundo suas regras próprias. Em áreas vulneráveis, é medida permanente de segurança pública, não apenas contra-ataques. A esse respeito, Catarina faz uma ressalva: "Policiais rondando podem passar a sensação de que a escola está em perigo. Isso aumenta a tensão do ambiente escolar e pode prejudicar os processos de ensino e de aprendizagem."
Contratação de psicólogos. Outra medida importante não só para a epidemia de ataques, mas para a melhoria do clima escolar. Tradicionalmente, as escolas possuem um trio gestor: o diretor cuida da parte administrativa, o coordenador se dedica à área pedagógica e o orientador educacional faz a escuta de pais e alunos, encaminhando junto ao corpo docente as soluções. É justamente nessa terceira função que o psicólogo pode atuar.
"As equipes hoje estão desfalcadas, e estados como São Paulo estão prevendo contratação emergencial de 1 psicólogo para cada 10 escolas. É preciso esperar para ver se vai funcionar", afirma a advogada Priscila Naves Tardelli, coordenadora da comissão de Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes da OAB/SP.
Controle dos fóruns de extrema direita. Medida que envolve inteligência policial. Para as especialistas, é aí, na identificação e punição aos aliciadores de jovens para ideologias extremistas, racistas e misóginas, que as forças de segurança deveriam se concentrar. Vai na mesma linha a regulação das plataformas para coibir discurso de ódio e de incitação à violência. A ação é preventiva e deve ser permanente.
Restrição à posse e ao porte de armas. Os ataques mais recentes foram por armas brancas, mas a tragédia poderia ser ainda pior no uso de armas de fogo. Os dois massacres mais letais no Brasil foram assim: Realengo, no Rio de Janeiro, com 13 mortos; Suzano, em São Paulo, 9 mortos. "Os estudos sobre violência contra escolas mostram que os massacres são piores e mais recorrentes em regiões de acesso facilitado a armas", diz Telma. Restrições a clubes de tiro e de airsoft também precisam entrar na pauta.
Justiça restaurativa. Investir no diálogo mediado entre agressores e vítimas para combinar ações de reparação de danos é um caminho para prevenir a escalada da violência. A justiça restaurativa pode ser definida como um conjunto de técnicas de resolução de conflitos com a presença do ofensor, do ofendido e de representantes da comunidade atingida pela violência. Em espaços criados pelo Tribunais de Justiça, um facilitador conduz o diálogo entre as partes que debatem a melhor forma de repararar o dano causado. A ação é de longo prazo e o trabalho precisa ser contínuo.
Discussão em grupo. O ideal é que estejam integrados à rotina escolar, como um lanche coletivo. São oportunidades para que alunos e professores reflitam sobre a onda de violência e como a escola poderia se posicionar. "Também é uma chance de dar orientações, como não disseminar ameaças pela rede social", diz Telma.
Contratação de zeladores ou porteiros. Pode soar impensável, mas ainda há muitas escolas no Brasil em que a tarefa de abrir e fechar o portão e de controlar os fluxos de entrada e de saída acaba nas mãos das próprias professoras ou de funcionários da limpeza, por exemplo. "Porteiros devem ser capacitados como atores do processo educativo, não na lógica de proteção contra ataques", diz Catarina.
Melhoria da infraestrutura. Reconstruir muros caídos, substituir portões enguiçados e eliminar matagais em pontos cegos da escola são ações que valem não apenas contra a atual onda de violência.
Formação de gestores escolares. Diretores e coordenadores têm a tarefa de liderar a escola. Mas muitos relatam estar perdidos diante da onda de violência. Cabe ao MEC e às secretarias explicitar os protocolos de acionamento do já mencionado Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente e estabelecer políticas para a convivência na escola. "E aí, realizar as formações para que o 'aquecimento interacional' que vivemos hoje possa ser revertido", afirma Tereza Perez, especialista em gestão escolar e diretora-presidente da Comunidade Educativa Cedac, fazendo referência ao clima violento de muitas escolas.
Medidas controversas:
Botão do pânico. Para algumas especialistas, é ineficaz e amplia a tensão na escola. Para outras, depende da maneira como for implantado. Se o contato direto com a polícia for deixado nas mãos dos alunos, a chance de alarmes falsos e trotes é enorme.
"Se for um botão que fica na secretaria e é acionado pela equipe escolar para mobilizar viaturas próximas, pode ajudar neste momento", diz Telma. "A eficácia é mais psicológica, no sentido da sensação de segurança de saber que há um recurso à mão em caso de ataque."
Câmeras. A crítica, novamente, é que aumenta a sensação de vigilância - pedagogicamente, a meta é que as regras da escola sejam seguidas porque são necessárias e justas, não por medo de punição. Mas boa parte das escolas já conta com esse tipo de equipamento.
"Se houver a opção pela instalação, é preciso garantir que não haja violação à privacidade - em banheiros, por exemplo - ou à liberdade de cátedra, deixando as câmeras apenas para os espaços de circulação como corredores e pátios", afirma Priscila.
Medidas que não funcionam:
Suspender aula. "Que loucura é essa?", pergunta Catarina. "É o Estado decretar sua derrota e a vitória dos grupos extremistas. Eles são muito menores do que nós, não podemos aprisionar a escola".
Seguranças armados na escola. O ponto é consensual: "policial fora da escola sempre", resume Telma. Gente armada não impede massacres nos Estados Unidos. Também não conseguiu coibir a morte de uma aluna por atirador em Barreiras (BA), numa invasão a uma escola cívico-militar. "Na verdade, a literatura mostra que policiais armados até pioram a violência", afirma Telma. "Chegam a intimidar os alunos e interferir em conflitos sem o preparo necessário, muitas vezes de forma racista."
Detectores de metais. Outro consenso: custam caro, são inócuos e prejudicam o clima escolar. "Aluno pula muro, joga coisa para dentro da escola, passa com materiais indetectáveis, como coquetel molotov", exemplifica Telma. Para Catarina, é um processo de vigilância sem fim. "E se os alvos passarem a ser o transporte escolar ou os grupos de alunos do lado de fora da escola?". Críticas na mesma linha são feitas para a sugestão de revista aos alunos.
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