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'Sozinha, educação não consegue acabar com desinformação', diz especialista
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O cartão de visitas já teve a forma de um controle remoto. Mas, sinal dos tempos, atualmente leva os contornos de um smartphone. Em lugar das informações de contato, cinco perguntas-chave da educação midiática:
Quem é o autor do conteúdo e qual sua intenção? Que técnicas ele usa para atrair e manter sua atenção? Quais valores, estilos de vida e pontos de vista estão representados? Como diferentes pessoas podem interpretar a mensagem? O que ficou de fora ou foi omitido no conteúdo?
No caso de Renee Hobbs, faz sentido que essas provocações substituam o tradicional combo de contatos com nome, endereço, e-mail e telefone.
Educação midiática diz muito sobre ela: há três décadas, é o tema de sua pesquisa e de sua atuação como ativista. Professora de Estudos de Comunicação na Universidade de Rhode Island, nos EUA, Hobbs é fundadora e diretora do Media Education Lab, que se dedica a melhorar a qualidade da educação em alfabetização midiática.
Mas o entusiasmo com a formação para o consumo e a produção de conteúdo midiático não dá margem a esperanças exageradas - ao menos não no curto prazo, e sem o investimento suficiente.
"Para educar midiaticamente boa parte da população, são necessários anos de esforço, infraestrutura e recursos humanos em todo o mundo", diz a pesquisadora. Durante sua passagem pelo Brasil para uma série de conferências, Renee concedeu uma entrevista à coluna.
A seguir, os principais trechos da conversa:
Ecoa: O que a educação midiática pode e o que não pode fazer contra o discurso de ódio e a desinformação?
Renee Hobbs: Há quem veja a educação midiática como uma cura para tudo: se seus filhos estão gastando muito tempo em dispositivos digitais, se a publicidade estiver atacando você com anúncios personalizados, se alguém da sua família for afetado por desinformação sobre saúde, se a democracia está caindo aos pedaços.
A educação midiática é uma solução positiva. Ela propicia um conjunto de competências, conhecimentos e hábitos mentais que convidam a refletir sobre suas escolhas como consumidor e criador de mídia. Mas não é a única solução para a crise que estamos vivendo. Pode ser parte da solução, mas não é uma panaceia.
Estamos pondo esperança excessiva na educação midiática?
Não estamos colocando recursos suficientes. É fácil dizer "educação midiática para todos". Mas, para fazer isso, são necessários anos de esforço, infraestrutura e recursos humanos em todo o mundo.
Os países estão experimentando qual combinação de recursos humanos, infraestrutura e apoio financeiro é necessária. Estamos vendo laboratórios na Croácia, na Alemanha, na Inglaterra, na Holanda, na Finlândia, na Ásia. E estamos aprendendo como uma comunidade de conhecimento.
Um dos complicadores para o ensino de competências para consumo e produção da mídia é que ela está em constante mudança. Como o professor ou professora deve lidar com essas mudanças aceleradas?
Essa é uma tensão importante que os educadores têm de enfrentar. Cada um tomará decisões diferentes sobre como integrar as competências de educação midiática em seus programas de instrução.
Alguns vão querer ser muito centrados no aluno e se concentrar no que eles estão fazendo agora - podem discutir o uso de Chat GPT para trapacear na escola, por exemplo. Mas há quem prefira encaixar o trabalho nos tópicos tradicionais do currículo.
Por exemplo, em ciências, quando um professor ensina os alunos a ler criticamente as notícias científicas. Isso é valioso também. Todas essas estratégias podem ser úteis. Os professores têm muitas maneiras criativas de ensinar educação midiática.
O melhor jeito é ter uma disciplina específica para o assunto ou ensiná-lo em todo o currículo?
Depois de 20 anos de pesquisa muito sólida em mais de 40 países diferentes, a resposta mais segura é: depende [risos]. Se uma escola tem um professor de jornalismo incrível, que tem anos de experiência profissional, certamente esse professor deve ministrar um curso autônomo.
Mas se uma comunidade escolar não tiver esse especialista, a abordagem transversal é a mais adequada. Todos podem aprender a ensinar educação midiática. Não é ciência de foguetes.
No caso do Brasil, a educação midiática já aparece em documentos como a Base Nacional Comum Curricular. O que falta para a área decolar?
O Brasil tem carências que a gente observa no resto do mundo, como problemas no financiamento e na formação dos professores. Mas os países que avançaram no nível "raiz" da educação midiática costumam ter uma associação profissional para apoiar os educadores. Entusiastas de base são vitais para o movimento de educação midiática.
Na Itália foi assim: um grupo [de ativistas] começou por conta própria e criou uma organização nacional - sem apoio das universidades, de fundações ou de grandes empresas de mídia. E conseguiram fazer com que a educação midiática fosse incluída na formação de todos os professores.
Os formuladores de políticas não farão nada sem a energia, o talento e o impulso das bases.
Em geral, as ações que envolvem a educação são de longo prazo. No terreno da educação midiática, não estamos ficando sem tempo?
Sim. Sinto um grande senso de urgência, por isso [além de pesquisadora] sou também uma ativista pela educação para a educação midiática.
Preocupo-me com o futuro da minha democracia [nos EUA]. Vejo quão corrosiva é a desconfiança [nas informações] para as práticas de autogoverno.
Portanto, se a educação midiática pode ser uma pequena parte da solução, é melhor começarmos a trabalhar nisso agora, mas será necessário um exército. Não é algo que pode acontecer com um pequeno grupo de pessoas.
Precisamos de um exército de educadores ativistas de educação midiática e precisamos que isso aconteça fora das escolas, em toda a sociedade civil, em nossas famílias e em nossa comunidade empresarial. Precisamos construir uma coalizão. Esse é o senso de urgência. Por isso estou aqui [no Brasil], porque é importante e porque é um esforço global.
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