Rosana Santos

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Opinião

Por uma transição na indústria, não uma indústria de transição

Com matrizes energética e elétrica entre as mais renováveis do mundo e um amplo potencial de fontes não explorado, o Brasil é dos pouquíssimos países que pode se beneficiar economicamente das exigências relacionadas às medidas de enfrentamento às mudanças climáticas. Isso passa pelo aproveitamento desse potencial para a descarbonização da indústria e de parte do transporte.

Na maioria dos países, a necessidade de se fazer a transição energética para o baixo carbono pressupõe enormes investimentos na substituição de fontes fósseis por renováveis. Assim, a energia solar, a eólica e, em alguns casos, a hídrica e biomassa limpam e ampliam matrizes elétricas, permitindo a substituição de gás natural e derivados de petróleo na geração de eletricidade e em vários processos produtivos. Para os casos em que tal substituição não é viável, o aliado é o hidrogênio renovável, também proveniente da energia limpa.

Hoje, as condições energéticas do Brasil são consideradas por muitos como instrumento para a produção do hidrogênio necessário para a descarbonização de outras geografias. O entusiasmo nessa direção tem guiado diversos projetos do tipo em regiões portuárias. De maneira geral, o foco é a produção do energético para exportação, a partir da eletrólise da água com eletricidade de fontes renováveis.

Boa parte das iniciativas em desenvolvimento conta com incentivos fiscais. Ao mesmo tempo, o segmento nascente do hidrogênio renovável vem se organizando em defesa de outros mecanismos financeiros de apoio, como a criação de subsídios via setor elétrico. Essa estratégia espelha o que foi feito, nas últimas décadas, em favor da energia eólica e solar, e que promoveu o crescimento significativo dessas fontes no país.

É inegável a importância dos investimentos nessa direção para garantir a manutenção da capacidade de renovação do nosso parque gerador, ameaçado pela participação também crescente das termelétricas a gás natural e manutenção do carvão. Neste início, projetos de hidrogênio, por sua vez, podem ser estratégicos para a inserção do Brasil neste novo mercado e, principalmente, para possibilitar a difusão da tecnologia no país.

Mas, diferentemente de outras nações, podemos ir muito além. E essa diferença tem de pautar as escolhas que fazemos, enquanto país, na destinação dos nossos recursos limitados.

Hoje, os segmentos industriais pesados, como a siderurgia, o cimento e a química, estão entre os principais consumidores de recursos e insumos fósseis no Brasil. Dadas as possibilidades de ampliação da oferta de substitutos limpos - como biogás e biometano, carvão vegetal certificado sustentável e o próprio hidrogênio renovável -, limpar esses processos industriais é mais imediato e menos custoso do que em locais com baixa oferta de recursos.

Nessa equação, a demanda global ainda nascente, mas seguramente crescente, por itens descarbonizados também contribui para aproximar tais projetos de investimento de condições mais próximas das convencionais, com taxas de retorno adequadas.

Essa condição faz toda a diferença, portanto, uma vez que transforma a necessária urgência global de combate às mudanças climáticas numa alavanca de atração de investimentos produtivos para o país, favorecendo o nosso desenvolvimento socioeconômico.

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Nesse contexto, o Nova Indústria Brasil (NIB) veio alinhado: aço e cimento de baixo carbono estão entre as cadeias prioritárias para os investimentos patrocinados pelo programa, que tem entre seus objetivos o fomento à indústria, com a redução gradual e crescente da intensidade de emissões por unidade de produto.

Afinal, caso o país foque apenas no desenvolvimento da indústria que alimente a transição energética em outras geografias com foco na exportação de energéticos, continuará limitando sua participação na economia global à de fornecedor de matérias-primas de menor valor agregado - uma condição que remonta à exploração do pau-brasil no século 16 e permanece, em grande medida, até hoje.

Precisamos de uma transição na indústria, não de uma indústria da transição.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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