Nas festas de fim de ano, não esqueça: o online não é o real
Ellie Sharp reconheceu as suas habilidades para a fotografia durante o lockdown. Virou a sua paixão e o seu trabalho, daquele momento em diante. Nasceu da sensibilidade e do talento dela uma obra que tenho contado aos quatro ventos para começar uma conversa importante para esse momento do ano: a vida que aparece online é só uma história bem contada, igual num filme. E mais: nem todo mundo viajou para o lugar mais incrível da Terra.
A obra é a foto de uma maçã que está em frente ao espelho. No reflexo aparece inteira, mas no primeiro plano, quando se estica o olhar, ela está mordida. No centro da imagem uma frase curta, algo como: o online não é o real. Se você ainda não cruzou com esse trabalho, até o fim das festas deve acontecer. Preste bastante atenção.
Nenhum outro momento do ano constrói a sensação de que todas as pessoas ao nosso redor estão vivendo o auge da vida, aproveitando tudo que ela tem a oferecer. Menos nós, sentados no sofá ou indo trabalhar, feito todos os dias.
Parte dessa nossa crença se dá por conta das histórias que recebemos pelas redes sociais. Por lá, em épocas assim, todos os dias parecem ser de pôr do sol no lugar mais incrível que se possa imaginar. E, sim, a vida terá isso também, mas não é só.
Grande parte de quem está arrastando imagem por imagem, curtindo foto por foto, acaba sendo engolida, mesmo que inconscientemente, por essa idealização típica das festas de fim de ano: todo mundo parece estar lá fora aproveitando o máximo da vida, menos eu. Não à toa, esse é um dos períodos que pede mais atenção e cuidado de quem trabalha com saúde mental. Não sou eu que digo isso, são os especialistas no assunto.
No seu ótimo "A Superindústria do Imaginário", o professor Eugenio Bucci escreve mais de 400 páginas passeando por temas que se entrelaçam com essa nossa conversa. Recomendo a leitura, explica muito o Brasil e o mundo de hoje.
Escrevo tudo isso para dizer que você ou eu não podemos compartilhar algum momento feliz ao lado de quem a gente ama, justo nos poucos dias de descanso que temos no ano? Não é isso, me leia de novo.
Meu convite é pensarmos em como as nossas histórias chegam do outro lado, causando quais sensações e sentimentos no outro. Eu preciso publicar tudo o que acontece? O tempo todo?
Eu sei, é uma conversa longa, difícil, cheia de idas e vindas, de muitos detalhes. E que vai precisar de muito mais gente envolvida. Mas nada melhor que um ano novo para começarmos novas conversas. E não esquece: o online não é o real.
Aproveite a virada do seu jeito, mas certifique-se que você estará aí, presente de verdade.
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