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Como as empresas podem ganhar dinheiro com a reciclagem?

A separação e a coleta de materiais recicláveis podem ser fontes de receita para uma empresa Imagem: vahit / adobe stock/adobe stock

Bárbara Therrie

Colaboração para o UOL, de São Paulo

15/12/2024 05h30

Quando falamos em reciclagem, logo pensamos nos benefícios ambientais, como a redução da poluição e a preservação dos recursos naturais. Mas a reciclagem também é uma atividade econômica e, como tal, precisa gerar lucro. Há várias oportunidades de negócio e maneiras de ganhar dinheiro com reciclagem, aproveitando as diversas etapas ao longo da cadeia produtiva. Conheça as principais:

Como a coleta e a separação de materiais recicláveis podem gerar receita?

A logística de coleta pode ser otimizada ao estabelecer parcerias com grandes geradores de resíduos, como shoppings, supermercados e indústrias, que produzem resíduos relativamente homogêneos, como papelão, PET ou alumínio.

Um resíduo todo misturado não tem utilidade e normalmente é enviado para um aterro sanitário, mas quando um gestor de resíduos investe na triagem — isto é, na separação dos materiais por tipo —, transforma-o em algo potencialmente reciclável, que poderá ser comercializado para indústrias recicladoras.

"Um exemplo é um shopping center que contrata uma empresa para coletar e dar a destinação final de seus resíduos. Essa empresa irá separar o que é reciclável, como latinhas e plásticos da praça de alimentação, papelão das lojas, plásticos das embalagens dos produtos, entre outros", diz o ecólogo Renato Paquet, secretário-executivo da Recicla Latas, entidade gestora responsável pelo aperfeiçoamento da logística reversa de latas de alumínio no Brasil. "Tudo isso, ao ser separado, poderá ser enviado para a reciclagem, gerando receita para a empresa de coleta", completa o ecólogo.

Uma outra estratégia seria as empresas oferecerem treinamento para funcionários em fábricas ou centros comerciais, incentivando a separação correta dos materiais logo na geração. Isso reduziria o trabalho de triagem posterior e diminuiria a contaminação dos recicláveis, tornando-os mais atrativos para o mercado.

Que materiais recicláveis têm maior valor de mercado?

Os materiais recicláveis de maior valor de mercado são os que possuem alta demanda industrial e vantagens econômicas. O alumínio é o produto mais bem pago, porque é infinitamente reciclável (sem perder a qualidade) e consome apenas 5% da energia necessária para a produção de alumínio primário.

"Hoje o alumínio é o produto com mais valor agregado porque a indústria de alumínio entendeu há algumas décadas que é mais barato reciclar do que extrair matéria-prima virgem e fazer todo o processo industrial de transformação. O resultado é quase 100% de latinhas recicladas no Brasil", diz Wagner Andrade, CEO e head de inovação da Menos1Lixo.

Outros materiais recicláveis que se destacam são o cobre devido ao uso em fios elétricos e na indústria eletrônica; o PET é valorizado pela aplicação em novas embalagens, na indústria têxtil e em decorrência das regulamentações que incentivam o uso de plástico reciclado; o papelão é impulsionado pelo crescimento do e-commerce; e o aço é utilizado na construção civil e na indústria automotiva.

De fora dessa lista, a reciclagem do vidro no Brasil é um desafio considerando as dificuldades que envolvem sua operação logística. Segundo Wagner Andrade, uma solução seria distribuir pelos municípios pequenas usinas de baixo custo para moagem de vidro com o objetivo de transformá-lo em matéria-prima para ser utilizado em outros setores.

"Trago um exemplo prático e funcional do que realizamos em Fernando de Noronha e que pode ser replicável em diversos territórios. Transformamos garrafas de vidro em pó de vidro para substituição de areia na construção civil, o que gerou menos emissão de carbono, menos recursos naturais extraídos e menos investimento financeiro", diz.

Como a empresa pode aumentar o lucro com a reciclagem?

Uma forma de fazer isso é substituir a compra de matéria-prima virgem por matéria-prima reciclada (geralmente mais barata) e investir em inovação. No setor de embalagens, garrafas PET recicladas podem ser transformadas em novas garrafas ou em fibras têxteis para roupas e acessórios. Na construção, resíduos de vidro ou plástico reciclado podem ser usados para criar pisos, telhas ou materiais compostos mais sustentáveis.

"Para conquistar novos mercados, empresas podem destacar os benefícios ambientais e sociais de seus produtos e comunicar de forma transparente o impacto positivo causado por suas escolhas, fortalecendo a marca e fidelizando consumidores conscientes. Parcerias estratégicas com redes de varejo, marcas de moda ou até grandes eventos, como o Rock in Rio, podem ajudar a popularizar esses produtos e atingir consumidores dispostos a pagar por soluções mais sustentáveis", pondera Renato, que é CEO e fundador da Polen.

Em geral, produtos sustentáveis são mais caros devido a fatores como tecnologias avançadas no processo de reciclagem, menor escala de produção, investimentos em certificações ambientais e alta carga tributária. O desafio está em dar escala para esses processos produtivos e mercados visando baratear o custo e ser mais competitivo com os produtos convencionais.

Um outro mercado que está em alta é o de empresas que atuam no beneficiamento dos materiais recicláveis, ou seja, elas compram materiais recicláveis já separados pelos gestores de resíduos e os transformam em matéria-prima para novos produtos.

Para citar um exemplo, a indústria pode adquirir grandes quantidades de garrafas PET e realizar o beneficiamento, que consiste em triturar, lavar e transformar o material em pellets (pequenos grânulos que podem ser embalados e vendidos). As garrafas PETs recicladas, por meio desses pellets, são utilizadas pelas indústrias para fabricar novas embalagens e produtos como tecidos sintéticos.

Como a economia circular é vantajosa para quem trabalha com reciclagem?

A economia circular é um modelo que busca eliminar o conceito de resíduo ao manter materiais e produtos em uso pelo maior tempo possível, promovendo o reaproveitamento, a reciclagem e a regeneração de recursos naturais. Em vez de seguir o modelo tradicional de extrair, usar e descartar, a economia circular propõe ciclos fechados em que os resíduos se transformam em insumos para novos produtos, reduzindo a necessidade de matérias-primas virgens e minimizando os impactos ambientais.

Para quem atua com reciclagem, a economia circular oferece algumas vantagens econômicas, como maior valor agregado aos materiais reaproveitados. Plásticos reciclados que antes tinham um uso limitado hoje são transformados em produtos de alta demanda, como madeira plástica, itens para construção civil, tecidos, embalagens premium e itens de moda sustentável.

"A economia circular também estimula parcerias estratégicas, uma vez que um ator da cadeia vai necessariamente se engajar com o outro para fazer o ciclo fechar, evitando desperdícios. Por exemplo, os recicladores podem trabalhar diretamente com grandes indústrias para garantir o fornecimento de matéria-prima reciclada de alta qualidade, assegurando contratos de longo prazo e maior previsibilidade financeira", pondera o ecólogo Renato.

Qual é o papel da logística reversa?

Na avaliação de Wagner, da Menos1Lixo, as empresas precisam se responsabilizar pelo volume total do que geram e vendem ao mercado. Para ele, é necessário que elas invistam em logística reversa e impulsionem a reciclagem dos materiais usados em seus produtos, especialmente quem opera com plásticos.

Atualmente grandes empresas têm se movimentado nesse sentido. É o caso da Natura, que investe em soluções de logística reversa e incentiva os seus consumidores a devolverem frascos vazios em pontos de coleta nas suas lojas para que sejam destinados à reciclagem. Uma outra companhia é a Ambev, que também possui parcerias para garantir a logística reversa de embalagens de cerveja e refrigerantes, e conta com um programa de reciclagem que visa reutilizar materiais como vidro e plástico.

Quais os incentivos governamentais para a gestão de resíduos e reciclagem?

Os incentivos podem assumir diversas formas, como financiamentos, isenções fiscais, parcerias e certificações que ajudam as empresas a se adequarem às exigências legais e a explorar novos mercados.

"No Brasil, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) estabelece diretrizes que estimulam a logística reversa e a destinação correta de resíduos. Empresas que cumprem essas normas podem se destacar no mercado e ter acesso a linhas de crédito específicas para projetos de reciclagem e modernização tecnológica", diz o ecólogo Renato. "Há ainda o modelo de crédito de logística reversa que reduz custos operacionais. Além disso, o pacote de incentivos à reciclagem, lançado recentemente pelo governo, é outro exemplo de como os recursos públicos estão sendo direcionados para fortalecer a cadeia de resíduos, beneficiando organizações alinhadas a essas iniciativas", completa.

Fonte: Renato Paquet, ecólogo com ênfase em ecologia industrial, diretor-presidente de cleantechs da ABStartups, secretário-executivo da Recicla Latas, entidade gestora responsável pelo aperfeiçoamento da logística reversa de latas de alumínio no Brasil. É CEO e fundador da Polen, uma cleantech focada em sustentabilidade, dedicada a transformar a cadeia de reciclagem no Brasil através da logística reversa de embalagens. Recentemente, foi reconhecido pelo prêmio Innovators Under 35 Brasil 2024, na categoria ESG, pela MIT Technology Review; Wagner Andrade, CEO e head de inovação da Menos1Lixo, é uma plataforma de educação ambiental, hub de influência e criador do copinho retrátil de silicone, pioneiro no Brasil

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