Topo

Como o consumo de carne afeta o aquecimento global?

Agropecuária é responsável por 12% das emissões antropogênicas de gases de efeito estufa - Liríade/Divulgação
Agropecuária é responsável por 12% das emissões antropogênicas de gases de efeito estufa Imagem: Liríade/Divulgação

Julia Moióli

Colaboração para Ecoa

15/09/2024 12h00

O consumo de carne contribui significativamente para o aquecimento global, uma vez que a agropecuária é responsável por 12% das emissões antropogênicas (resultantes de atividades humanas) globais de GEE (gases de efeito estufa), de acordo com um relatório recente da FAO (braço de alimentação e agricultura da ONU). Essa contribuição vem de várias fontes:

Processo digestivo: Ruminantes como bovinos, ovinos e caprinos liberam metano (CH4) durante a digestão.

Desmatamento: Transformação de florestas em pastagens libera CO2 armazenado nas árvores.

Manejo de resíduos: Fezes e urina nas pastagens produzem metano, óxido nitroso e CO2 durante a decomposição.

Fertilizantes químicos: Utilização em plantações de alimentos para gado gera óxido nitroso.

Equipamentos e transporte: Maquinário e transporte refrigerado emitem CO2.

Os sistemas com maior impacto ambiental são os menos tecnificados, que utilizam pastagens degradadas e prolongam a produção de metano pelos animais antes do abate.

Outras fontes de proteínas que lideram a lista de alimentos emissores de GEE são as carnes de ovinos e caprinos (também ruminantes) e de camarão - neste caso, o problema é que as fazendas de cultivo costumam ocupar terras anteriormente cobertas por manguezais, que, ao serem cortados, liberam o dióxido de carbono que haviam armazenado.

Esse cenário faz algumas pessoas se questionarem sobre o consumo de carne de vermelha.

É preciso parar de comer carne?

Não. "Os produtos de origem animal continuam sendo uma importante fonte de segurança alimentar, nutrição e meios de subsistência para um grande número de populações rurais ao redor do mundo", afirma a ONU em seu site.

Estima-se que a pecuária empregue mais de 1 bilhão de pessoas em todo o mundo, sendo fonte de renda essencial para cerca de 600 milhões das famílias mais pobres.

"Além disso, não é simplesmente deixar de comer carne que vai evitar as mudanças do clima - são necessárias diversas ações em vários setores", diz Priscila P. Coltri, coordenadora do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

A queima de combustíveis fósseis, por exemplo, representa mais de 70% das emissões globais totais, enquanto o gado de corte representa 2,2%, de acordo com dados de 2019 publicados pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos.

Existe carne bovina sustentável?

Uma produção "eco-friendly" ou regenerativa pode mitigar impactos ambientais e sociais, ajudando a capturar carbono, prevenir erosão e gerar impacto econômico e social. Aspectos importantes incluem:

Integração lavoura-pecuária: Melhora a eficiência do uso da terra e reduz o desmatamento.

Rotação de pastagens: Permite a recuperação da vegetação.

Diversificação de gramíneas e leguminosas: Aumenta a resistência a pragas e melhora a nutrição animal.

Controle de emissões de metano: Uso de medicamentos e redução do tempo de vida do animal.

Conservação da água e manejo de irrigação: Especialmente em períodos de seca.

Manejo de resíduos: Cria um balanço positivo de CO2 ou gera energia elétrica.

Impacto socioeconômico: Benefícios para a comunidade local.

No Brasil, o selo "Boi Sustentável", conferido pelo IMEA (Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária), vinculado ao governo do estado de Mato Grosso, considera diversos desses aspectos.

Como consumir proteínas de forma mais sustentável?

Para quem tem acesso e consome carne bovina em excesso, vale repensar o tamanho das porções.

"Considerando dados médios, o consumo de carne pelos brasileiros é elevado, enquanto o de vegetais é mais baixo do que o adequado, então, não estamos promovendo o vegetarianismo e o veganismo como solução, mas um equilíbrio, que envolve diversidade alimentar", lembra Nadine Marques, pesquisadora da Cátedra Josué de Castro de Sistemas Alimentares Saudáveis e Sustentáveis da Faculdade de Saúde Pública da USP.

Outras dicas são variar as fontes de proteínas animais, com opções de menor emissão de GEE - de acordo com a ONU, ovos, aves, peixe, carne de porco, leite e queijo - e incluir no cardápio também fontes de proteínas de origem vegetal, como leguminosas (feijões, lentilhas, grão de bico e ervilhas), soja e derivados (tofu, tempê e edamame), grãos integrais (arroz integral e quinoa), sementes (de abóbora, girassol, gergelim, linhaça e chia) e oleaginosas (amêndoas, nozes e sementes), além de vegetais como brócolis e espinafre.

Fonte: Nadine Marques, pesquisadora da Cátedra Josué de Castro de Sistemas Alimentares Saudáveis e Sustentáveis da Faculdade de Saúde Pública da USP; Priscila Coltri, coordenadora do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas a Agricultura (CEPAGRI) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas); Embrapa; FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura); Journal of Animal Science; ONU