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Como sabemos que as mudanças climáticas estão realmente acontecendo?

Terra seca no leito rio Loire, na França Imagem: Stephane Mahe/Reuters

Julia Moióli

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

30/04/2024 04h00

Eventos climáticos extremos, como ondas de calor com recordes de temperatura e grandes tempestades, são a principal evidência apontada pelos cientistas de que o clima do planeta está passando por transformações.

As provas vêm principalmente na forma de dados meteorológicos, satélites e outras fontes que mostram que o mundo vem aquecendo desde o final do século 19, quando a queima de combustíveis fósseis se ampliou devido à industrialização, gerando emissões em larga escala de dióxido de carbono, o principal causador do efeito estufa.

Em média, as temperaturas da superfície terrestre estão 1,2 ºC acima do que há um século e meio. E a taxa de aquecimento tem acelerado nas últimas décadas.

De acordo com a OMM (Organização Meteorológica Mundial), agência meteorológica da ONU, o ano de 2023 registrou uma série de recordes: o ano mais quente registrado; a extensão do gelo marinho da Antártida mais baixa já documentada; e diversos eventos como o ciclone tropical Freddy, que devastou países da África como Moçambique e Maláui, causando mortes, deslocamentos internos e segurança alimentar.

O que são mudanças climáticas?

De acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas), as mudanças climáticas são transformações a longo prazo nos padrões de temperatura e clima. Isso inclui:

  • Aumento da frequência e intensidade de eventos extremos, como os citados acima;
  • Elevação do nível do mar por conta do aquecimento e da expansão da água e do derretimento de geleiras;
  • Acidificação dos oceanos, por absorverem da atmosfera uma concentração maior concentração de CO2;
  • Diminuição do volume do gelo marinho no Ártico.

Essas mudanças não acontecem de uma hora para a outra, mas de forma gradual. "Muitas vezes, nossa percepção individual não é capaz de capturar, por exemplo, essa alteração média da temperatura, inclusive porque ainda temos os altos e baixos, com ondas de calor e de frio também", diz David Montenegro Lapola, pesquisador do Cepagri (Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

Quais são as causas das mudanças climáticas?

As mudanças no clima do planeta podem ter origens naturais. A Terra, inclusive, já enfrentou vários períodos de transformações, decorrentes de impactos de meteoritos, erupções vulcânicas e variações em sua órbita, entre outros.

No entanto, como aponta a ONU, desde a Revolução Industrial (1760), as atividades humanas são as grandes culpadas. Alguns exemplos:

  • Transportes;
  • Geração de energia;
  • Agricultura;
  • Aterros sanitários.

A explicação é simples: elas queimam combustíveis fósseis, como carvão, petróleo e gás, que emitem gases de efeito estufa. Esses gases, por sua vez, agem como um grande cobertor em torno do planeta, retendo o calor do Sol e aumentando a temperatura atmosférica.

"Quando isso acontece, a atmosfera responde para manter o equilíbrio, intensificando a frequência de vários parâmetros meteorológicos, como chuvas mais frequentes e fortes, períodos mais longos de secas e ondas de calor extremamente intensas - só em 2023 foram nove dessas aqui no Brasil", diz Tercio Ambrizzi, diretor do IEE (Instituto de Energia e Ambiente) e coordenador do INCLINE (Interdisciplinary Climate Investigation Center), núcleo de apoio a pesquisa em mudanças climáticas, ambos da USP (Universidade de São Paulo).

Outro agravante é o desmatamento de terras e florestas, que contribui para diminuir a capacidade de a vegetação de absorver o CO2 liberado pela queima de combustíveis fósseis.

Além do clima, o que mais muda?

Se você é consumidor de azeite, deve ter sentido no bolso o aumento considerável de preços que vem acontecendo há cerca de dois anos. As mudanças climáticas têm culpa: nos últimos dois anos, os verões foram excepcionalmente intensos na região do Mediterrâneo, maior produtora mundial de óleo de oliva, proporcionando safras reduzidas em 2021/2022 e 2022/2023. Com isso, entrou em cena a lei da oferta e da procura. O valor do produto disparou.

Outro exemplo: a seca do ano passado da Amazônia, quando a região registrou os menores índices de chuva desde 1980, fez com que as águas do rio Negro baixassem além da conta (foi o nível mais baixo desde 1902), impedindo que navios atracassem no porto de Manaus. Não era possível nem entregar materiais às fábricas nem transportar itens como eletrodomésticos e eletrônicos prontos para o resto do país.

Vale lembrar ainda das praias de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, cujas faixas de areia continuam "encolhendo" por conta do aumento do nível do mar, mesmo com inúmeras obras do governo estadual na última década para alargá-las.
Por fim, os cientistas também vêm estudando a relação entre as mudanças climáticas e diversas doenças e epidemias.

"Esse surto atual fortíssimo de dengue, por exemplo, tem uma óbvia relação com o El Niño [fenômeno que envolve alterações atmosféricas e na temperatura do oceano Pacífico Tropical Leste e apontado como o mais intenso, possivelmente por conta das mudanças climáticas], que trouxe temperaturas muito altas no Sudeste e, consequentemente, condições mais propícias para a dispersão do mosquito, pegando o governo despreparado para lutar contra isso", diz Lapola.

"E é importante lembrar também que no caso da própria Covid-19, a hipótese mais aceita é a de que uma diminuição da fauna e da flora facilitou sua passagem para o ser humano e, a partir daí, sua propagação", diz Ambrizzi.

É possível parar a mudança climática?

Não, as mudanças climáticas já estão acontecendo. Durante a COP28 (Conferência das Partes sobre Mudanças do Clima), realizada em dezembro do ano passado em Dubai, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, alertou: "Estamos em uma corrida contra o tempo. Nosso planeta está chegando muito próximo do limite de 1,5°C grau. E o tempo está se esgotando."

O que pode - e deve - ser feito neste momento é mitigar suas consequências, especialmente por meio da redução das emissões globais de gases de efeito estufa. Para isso, foi assinado em 2015, o Acordo de Paris, do qual o Brasil faz parte e cujo objetivo é manter o aquecimento global abaixo dos 2 °C em relação aos níveis pré-industriais.

Além disso, é preciso que os governos tenham condições de lidar com os eventos extremos e possam evitar que pessoas fiquem desabrigadas e sem alimentos em casos de enchentes ou que faltem vacinas e campanhas apropriadas em casos de surtos de doenças - apenas para citar alguns exemplos.

Já no campo individual, a recomendação de Niklas Hagelberg, coordenador de Mudança Climática do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), é: "Como indivíduos, devemos mudar o modo como consumimos e pressionar quem nos representa — nossos empregadores, nossos políticos — para conseguirmos rapidamente um mundo com baixo nível de carbono".

FONTES: Tercio Ambrizzi, diretor do IEE (Instituto de Energia e Ambiente) da USP; David Montenegro Lapola, pesquisador do Cepagri (Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura) da Unicamp; ONU, e Mudanças Climáticas e a Sociedade.

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