O que é hidrogênio verde e qual a sua importância na transição energética?
Bárbara Therrie
Colaboração para Ecoa
03/06/2024 04h03
O hidrogênio, elemento mais leve, simples e abundante no universo, presente na água e no ar, tem sido chamado de "combustível do futuro", graças ao papel que pode ter na transição energética, alinhando-se aos objetivos do Acordo de Paris de alcançar a neutralidade de carbono até 2050.
Porém, nem todo hidrogênio tem vantagens ambientais. No contexto de redução de emissões de carbono para frear as mudanças climáticas, o que entra em cena é o chamado hidrogênio verde (H2V).
Quais os diferentes tipos de hidrogênio?
Existem diferentes tipos de hidrogênio, e cada um é identificado por uma cor, relacionada ao seu processo de produção e impacto ambiental associado:
Hidrogênio verde: O H2V é apontado como o mais limpo entre os tipos de hidrogênio, devido às baixas emissões de carbono, sendo considerado o mais sustentável, pois auxilia na descarbonização da economia.
Ele é produzido pela eletrólise da água, processo em que hidrogênio e oxigênio são separados por meio de uma corrente elétrica. Quando a eletricidade usada para quebrar a molécula da água (H2O) vem de fontes sustentáveis, como eólica e solar, o hidrogênio resultante é chamado de verde. Desse processo, obtém-se também o oxigênio com alto grau de pureza, que pode ser usado em processos industriais e na área da saúde.
Hidrogênio cinza: É produzido a partir de combustíveis fósseis, como gás natural, por meio do processo de reforma a vapor, que emite CO2 como subproduto. É chamado de "cinza" devido a sua pegada de carbono. É o tipo mais comum, mas menos sustentável.
Hidrogênio azul: É semelhante ao hidrogênio cinza na produção, mas utiliza tecnologias de captura e armazenamento de carbono (CAC) para minimizar as emissões de CO2 resultantes do processo. Isso reduz as emissões líquidas de carbono, tornando-o mais ambientalmente amigável que o hidrogênio cinza.
Hidrogênio turquesa: É uma variação do hidrogênio cinza que utiliza tecnologias de captura de carbono, mas em combinação com fontes de energia nuclear. É uma opção de baixa emissão de carbono, mas com algumas questões envolvendo segurança e gestão de resíduos nucleares.
Hidrogênio branco: refere-se ao hidrogênio de origem geológica natural, que pode ser encontrado em depósitos subterrâneos de gás natural ou formações geológicas específicas.
Hidrogênio preto: geralmente é produzido a partir de processos de reforma a vapor do carvão mineral. Esses processos envolvem a quebra térmica do carvão para produzir hidrogênio, resultando em uma grande emissão de carbono, tornando-o altamente poluente.
Hidrogênio marrom: é semelhante ao hidrogênio preto, mas distingue-se pelo tipo de carvão do qual o hidrogênio é extraído. Nesse caso, a hulha ou carvão betuminoso é a matéria-prima.
Hidrogênio laranja: é produzido a partir de fontes renováveis, como biomassa, biocombustíveis, biogás ou biometano, por meio de processos de reforma a vapor ou gaseificação, tornando-o uma opção mais sustentável em comparação ao hidrogênio preto ou marrom.
Hidrogênio amarelo: é produzido pela eletrólise da água, usando eletricidade oriunda de fontes variadas e misturadas. Uma delas é atribuída à fonte de energia solar.
Hidrogênio rosa: é obtido através da eletrólise da água, assim como o verde e o amarelo. Mas neste caso a eletricidade é proveniente exclusivamente de usinas nucleares.
Como o hidrogênio verde pode ser usado?
- O hidrogênio verde tem o potencial de substituir o uso de combustíveis fósseis e derivados do petróleo. Ao invés de depender exclusivamente de combustíveis como gasolina e diesel, o hidrogênio verde pode desempenhar um papel crucial na mobilidade, abrangendo desde veículos leves, como carros de passeio, até veículos pesados, como ônibus, caminhões, trens e navios. Esse uso diversificado pode ocorrer tanto em sistemas de propulsão elétrica, com a conversão direta de hidrogênio em eletricidade, quanto em motores de combustão interna que utilizam hidrogênio como combustível principal.
- Na indústria, ele pode substituir o gás natural em diversas aplicações ligadas à geração de calor, como em fornos.
- Ele também pode ser empregado como matéria-prima para a produção de produtos químicos, como por exemplo, na síntese de metanol, que é uma matéria-prima importante na produção de plásticos, solventes e produtos farmacêuticos.
- O hidrogênio verde pode ser usado para produzir fertilizantes, o que é importante para o Brasil, cujo PIB é majoritariamente dependente do setor agrícola, e grande parte dos fertilizantes é importado.
- Uma alternativa promissora é a aplicação do hidrogênio verde na produção de aço. Isso porque o aço é obtido a partir do minério de ferro, cujo oxigênio de sua composição química precisa ser extraído. Atualmente, a retirada desse oxigênio é feita com gás natural, resultando na liberação de carbono para a atmosfera. Processos modernos sugerem a retirada do elemento com o uso de hidrogênio, fazendo com que se unam e formem água. Assim, em vez de liberar carbono para atmosfera, o processo de produção de aço irá liberar água. Este é o chamado "aço verde".
Por que o H2V é tão caro?
Apontado como o "combustível do futuro", o H2V enfrenta desafios significativos que contribuem para o seu valor elevado. O custo dos equipamentos e da eletricidade (proveniente de fontes de energia renovável) são os principais deles por serem mais caros quando comparados ao custo dos combustíveis fósseis.
Outras questões como a eficiência da eletrólise, a necessidade de alcançar escala na produção e os desafios logísticos e de infraestrutura são fatores que impactam o preço. Superar esses obstáculos é essencial para tornar o H2V uma opção acessível e amplamente adotada como uma fonte de energia limpa e sustentável.
Como o hidrogênio verde auxilia na descarbonização do planeta?
- O H2V tem papel importante na transição para uma economia de baixo carbono porque ajuda na descarbonização do planeta ao substituir combustíveis fósseis em setores como indústria e transportes.
- Ele é utilizado em veículos elétricos, células de combustível para geração de eletricidade limpa e na produção de produtos químicos sem o uso de combustíveis fósseis.
- Serve como armazenamento de energia, capturando o excesso de energia renovável para uso posterior, reduzindo o problema relacionado à intermitência de fontes renováveis, como a solar fotovoltaica e eólica.
- O uso do hidrogênio verde ajuda a reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa, reduzindo o aquecimento global e mitigando os impactos da mudança do clima.
Vantagens
Além das baixas emissões de carbono e versatilidade de uso, outros benefícios do H2V incluem:
- A transição para uma economia centrada no hidrogênio verde pode criar novas oportunidades de emprego em setores como energia renovável e tecnologia de células de combustível, áreas como fabricação de equipamentos específicos para energia limpa e desenvolvimento de infraestrutura para apoiar a produção, armazenamento e distribuição de hidrogênio. Isso pode impulsionar o crescimento econômico e a inovação em muitas regiões.
- A incorporação de H2V na matriz energética de um país pode ajudar a diversificar suas fontes de energia, reduzindo a vulnerabilidade a interrupções no fornecimento de energia e flutuações nos preços dos combustíveis.
- Os insumos necessários para a obtenção do hidrogênio verde são somente água e eletricidade oriunda de fontes renováveis.
- Com capacidade de armazenamento em grande escala, ajuda a estabilizar a rede elétrica e a integrar fontes intermitentes de energia renovável.
Desvantagens
- O alto custo é uma das desvantagens, mas tende a diminuir com a evolução tecnológica, com o aumento da demanda de eletrolisadores através da disponibilização de subsídios governamentais, e com a livre concorrência.
- A infraestrutura necessária para produzir, armazenar e distribuir H2V ainda é limitada em comparação aos combustíveis fósseis. Isso pode representar um desafio para a adoção em larga escala, pois requer altos investimentos em instalações e redes de distribuição adequadas.
- A fabricação de equipamentos necessários para a produção, armazenamento e distribuição de hidrogênio verde pode ter impactos ambientais significativos. Isso inclui a extração de materiais, o consumo de energia durante a fabricação e o descarte adequado dos equipamentos no final de sua vida útil.
Por que se aposta tanto no hidrogênio verde no Brasil?
O Brasil aposta no H2V devido a sua abundância de recursos renováveis, como sol, vento e água, essenciais para a produção. O país tem um enorme potencial devido a sua vasta extensão territorial e condições climáticas favoráveis, tornando o custo do hidrogênio gerado no Brasil um dos mais competitivos do mundo.
Nesse sentido, há duas perspectivas principais: a exportação e o atendimento do mercado interno. A exportação está sendo explorada, principalmente, por estados do litoral norte-nordeste do Brasil. As outras regiões estão focadas no atendimento do mercado interno e na modernização das indústrias do país.
Com investimentos adequados em tecnologia e infraestrutura, o país pode se tornar um importante produtor e exportador global de H2V, contribuindo para a transição energética global e gerando oportunidades econômicas.
Além disso, o Brasil possui bastante experiência na produção de biocombustíveis, o que pode ser aproveitado para integrar o H2V em sua matriz energética de forma eficiente.
Quais são as perspectivas do mercado global?
Vários países estão investindo em H2V como parte de suas estratégias de transição energética, como Alemanha, Japão, Coreia do Sul, Austrália e China. O H2V está sendo usado em abundância em setores como transporte, indústria e energia. Os resultados são a redução das emissões de carbono, a diversificação da matriz energética e o impulso à inovação tecnológica.
De forma geral, as perspectivas do mercado global de H2V são otimistas. Políticas governamentais e incentivos, tanto nos países desenvolvidos, quanto nos países em desenvolvimento, estão estimulando investimentos significativos na produção de H2V, enquanto a crescente demanda por soluções de energia limpa impulsiona a adoção em diversas áreas.
Um outro exemplo é que todos os fabricantes de automóveis do mundo estão trabalhando em modelos movidos a hidrogênio, inclusive a Tesla -conhecida por atuar com veículos elétricos a bateria-, está desenvolvendo protótipos que armazenam energia na forma de hidrogênio. Veículos pesados, como caminhões, trens e navios têm sido objeto de diversas pesquisas e aplicações.
Fonte: Edson da Costa Bortoni, reitor da Universidade Federal de Itajubá (Unifei), ,coordenador científico do CH2V, Centro de Hidrogênio Verde da UNIFEI, membro do Comitê Gestor do Plano Nacional de Hidrogênio (Coges/PNH2) criado pelo Ministério de Minas e Energia para disseminar o uso do hidrogênio no Brasil, e viabilizar a transição energética; Victor Hugo Abreu, pesquisador do Laboratório de Transporte Sustentável (LabTS) do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), que possui uma Planta de Fabricação de Hidrogênio Verde.