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O Sol influencia as mudanças climáticas?

Sol ilumina a geleira Morteratsch, na Suíça, que vem diminuindo com o aquecimento global - Getty Images
Sol ilumina a geleira Morteratsch, na Suíça, que vem diminuindo com o aquecimento global Imagem: Getty Images

Bárbara Therrie

Colaboração para Ecoa

15/07/2024 04h00Atualizada em 19/07/2024 12h53

O Sol tem papel fundamental em vários processos na Terra. Sem a existência dele, aliás, não haveria vida no planeta. Sua principal função é fornecer energia para a Terra que, ao absorver a radiação solar, redistribui essa energia por meio dos ventos, das correntes oceânicas e na atmosfera. O sol também é fonte de energia para a fotossíntese das plantas. Além disso, as estações do ano existem em decorrência da inclinação da Terra em torno dele.

Se o Sol interfere no clima, na temperatura, nas estações, será que ele também tem influência no efeito estufa e nas mudanças climáticas atuais? Veja a seguir.

Qual é a relação entre o Sol e efeito estufa?

O efeito estufa não diz respeito ao Sol, mas à composição química da nossa atmosfera. O efeito estufa é causado por nuvens e gases como o vapor d'água, o ozônio, o dióxido de carbono, o metano e o óxido nitroso, que absorvem parte do calor irradiado pela Terra e se acumulam na atmosfera. A presença desses gases faz com que o planeta atinja temperaturas mais de 30ºC acima do que teria se estivesse apenas sob influência do aquecimento associado à absorção de luz solar.

O processo ocorre da seguinte forma: a energia solar que chega no topo da atmosfera sofre várias perdas até chegar na superfície (cerca de 50%) para aquecê-la. Esta energia que aquece a superfície leva à emissão de uma nova energia (energia térmica ou calor). Uma parte desse calor emitido pela superfície é absorvida na atmosfera (efeito estufa), sendo devolvida à superfície, e o restante escapa para o espaço.

"O fato é que, em princípio e por milhões de anos, o planeta tem estado em equilíbrio térmico. Há variações extremas, mas elas são sempre muito lentas do ponto de vista geológico. Desta forma, podemos dizer que o Sol apenas contribui com a energia", afirma Tercio Ambrizzi, diretor do Instituto de Energia e Ambiente Universidade de São Paulo (IEE-USP).

Considerando os parâmetros físicos responsáveis pelo balanço energético da Terra, isto é, o fluxo de radiação solar, o albedo (a fração da radiação solar que é refletida) e a intensidade do efeito estufa, somente esse último tem sofrido alterações consideráveis. "É por isso que a comunidade científica atribui de forma inequívoca o aquecimento do planeta às atividades humanas que levam à emissão de gases de efeito estufa", afirma Alexandre Araújo Costa, cientista do clima e professor titular da Universidade Estadual do Ceará.

O Sol é responsável pelo aquecimento global e pelas mudanças climáticas?

De acordo com os dois especialistas ouvidos pela reportagem, a resposta é não. "Todas as evidências científicas deixam claro que o Sol não é responsável pelas mudanças climáticas em curso. Embora haja flutuações na quantidade de radiação solar que chega ao topo da atmosfera terrestre, essas variações são bastante sutis, especialmente quando se consideram as mudanças de longo prazo", afirma Costa.

Para se ter uma ideia de como o fluxo médio de radiação solar muda lentamente, estima-se que do início da Era Cenozoica (há 66 milhões de anos) até hoje houve um aumento de 0,5% nesse fluxo.

Se consideramos a mudança no clima observada desde a Revolução Industrial até a hoje, as alterações na quantidade de radiação solar são da ordem de -0,02W/m2 (Watts por metro quadrado), algo pequeno se comparado ao valor médio do total de radiação solar que chega ao topo da atmosfera da Terra - cerca de 340W/m2. Este valor não seria capaz de produzir mudanças significativas no clima e, em virtude do sinal negativo, se houvesse qualquer contribuição, seria no sentido de resfriamento do planeta.

Na mesma linha, Ambrizzi diz que a energia solar que aquece nosso planeta, por ter uma variabilidade constante e de mudança lenta, não pode ser responsabilizada pelas mudanças climáticas e não tem ligação com o aquecimento do planeta. "O aquecimento global ocorre em função da intensidade dos gases de efeito estufa, particularmente o dióxido de carbono, devido à emissão da queima de combustíveis fósseis", afirma Costa.

Existe relação entre o aumento da atividade solar e o aquecimento global?

A atividade solar se refere a fenômenos produzidos pelo campo magnético do Sol, incluindo manchas solares, tempestades solares, ejeções de massa coronal e vento solar. Essa atividade pode variar em escalas de tempo, desde frações de segundo a bilhões de anos.

Um dos principais ciclos de atividade solar que muda sensivelmente o número de manchas solares ocorre na escala de tempo de 11 anos, mas nesse período a diferença na quantidade de energia solar que chega à Terra varia 0,1%.

No caso das tempestades solares, a energia solar mais intensa não consegue penetrar até as camadas da atmosfera mais próximas da superfície devido à presença do campo magnético da Terra, o que é benéfico para manter a vida no planeta. Caso contrário, fazendo uma analogia, seria como aquecer um alimento no microondas. Geralmente as tempestades solares interagem com a atmosfera da Terra nas suas porções mais externas, acima de 50 km de altitude.

"A conclusão que se chega ao se analisar o conjunto dessas evidências é que não existe relação entre o aumento da atividade solar e o aquecimento do planeta ou qualquer impacto significativo das tempestades solares para o clima da Terra. Embora seja um pseudoargumento usado pelos negacionistas do clima, não são as variações de atividade solar que têm provocado as mudanças climáticas observadas, mas as emissões humanas de gases de efeito estufa", indica Costa.

Fonte: Alexandre Araújo Costa, cientista do clima e professor titular do mestrado em climatologia da Uece (Universidade Estadual do Ceará), doutor em Ciências Atmosféricas pela Universidade Estadual do Colorado, nos Estados Unidos; Tercio Ambrizzi, diretor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP), doutor em meteorologia pela Universidade de Reading, na Inglaterra