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Quais países mais emitiram carbono na história?

Usina a carvão na Alemanha, um dos países que mais emitiram carbono, considerando apenas a queima de combustíveis fósseis - Ina Fassbender/Reuters
Usina a carvão na Alemanha, um dos países que mais emitiram carbono, considerando apenas a queima de combustíveis fósseis Imagem: Ina Fassbender/Reuters

Bárbara Therrie

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

26/08/2024 12h00

A primeira Revolução Industrial é um marco importante da história do consumo de energia no mundo e o ponto de partida para o acúmulo de carbono na atmosfera. Nesse contexto, quais países mais emitiram carbono ao longo da história? O que eles têm feito para reduzir suas emissões? Entenda a seguir.

Quais países historicamente mais emitiram carbono?

De acordo com o site Carbon Brief, entre os países que mais emitiram carbono de 1850 a 2021, os Estados Unidos aparecem em primeiro lugar com 509 bilhões de toneladas. Na sequência estão China (284 GtCO2), Rússia (172 GtCO2) e o Brasil, com 113 bilhões de toneladas, principalmente devido ao desmatamento (corte raso, degradação por extração seletiva e incêndios) da Mata atlântica e do Cerrado. A Indonésia fecha o top 5 com 103 bilhões de toneladas acumuladas. O ranking lista os 20 países que mais emitiram CO2 associados à queima de combustíveis fósseis e ao uso da terra (o que inclui agricultura, pecuária e desmatamento), de 1850-2021.

Em 2019, o Carbon Brief divulgou as emissões acumuladas de 1750 a 2018, considerando apenas a queima de combustíveis fósseis. Os EUA lideram a lista com 297 bilhões de toneladas de CO2. Na sequência aparece Rússia (135 GtCO2); Alemanha (75 GtCO2); China (72 GtCO2) e Reino Unido (68 GtCO2) completando os 5 maiores emissores do período.

"Os Estados Unidos ocupam a liderança das emissões porque, além da queima de combustíveis fósseis, desde 1850 foram o país que mais intensamente destruiu suas florestas, depois do Brasil", comenta Luiz Marques, professor aposentado do Departamento de História Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Segundo o 6º relatório do IPCC (Painel Internacional sobre a Mudança do Clima), as regiões do mundo que mais contribuíram historicamente para o acúmulo de CO2 na atmosfera de 1850 a 2019 foram a América do Norte (23%), Europa (16%), Leste Asiático (12%), América Latina e Caribe (11%), Leste Europeu e Centro-Oeste Asiático (10%), Sudeste Asiático (8%) e África (7%). As emissões da América do Norte, Europa e Leste Asiático estão majoritariamente associadas à queima de combustíveis fósseis, enquanto as emissões da América Latina e África associam-se ao uso da terra.

Como a Revolução Industrial impactou nas emissões de carbono?

A Revolução Industrial é um marco importante da história do consumo de energia no mundo e o ponto de partida para o acúmulo de carbono na atmosfera. O período está associado à primeira grande transição energética global, quando a principal fonte de energia utilizada pelos seres humanos no mundo deixou de ser a lenha e passou a ser o carvão mineral.

Até então as sociedades humanas viviam restritas às fontes de energia locais. Moinhos dependiam de fluxos de rios ou ventos, e as fogueiras, de lenha.

Ao inventar a primeira máquina a vapor bem-sucedida, Thomas Newcomen demonstrou a capacidade de transformar energia térmica em trabalho mecânico, um feito que mudou para sempre a relação dos seres humanos com a energia.

"O acesso às grandes reservas de energia fóssil, primeiramente o carvão mineral e, na sequência, o petróleo e o gás natural, somado à capacidade de transformar energia térmica em trabalho, quebrou a barreira energética que havia. Isso permitiu o crescimento exponencial das sociedades e resultou no lançamento do carbono que restava inerte nos reservatórios fósseis para a atmosfera", explica Fábio Teixeira Ferreira da Silva, doutor e pesquisador de pós-doutorado do Laboratório Cenergia do PPE/COPPE/UFRJ (Programa de Planejamento Energético do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Ao longo da história, alguns eventos impactaram na redução das emissões, como a crise do petróleo em 1973, a crise do subprime em 2008 e a pandemia de covid 19 em 2020. Mas, via de regra, desde a primeira revolução industrial as emissões de CO2 vêm aumentando exponencialmente.

Nações pioneiras na Revolução Industrial, como Reino Unido, outros países europeus e os Estados Unidos passaram a desenvolver suas economias industriais com base no consumo de combustíveis fósseis. No entanto, vale ressaltar que a China, embora tenha se industrializado tardiamente, já emitiu cumulativamente mais carbono do que Reino Unido e França, segundo o ranking do Carbon Brief. No caso das emissões provenientes do desmatamento, Brasil e Indonésia — países que se industrializaram mais tarde — já acumulam emissões totais superiores às dessas nações do Norte desde o início da era industrial.

Países com mais habitantes emitem mais carbono?

O tamanho da população tem influência sobre as emissões de um país, mas outros fatores devem ser considerados, como a intensidade das emissões per capta, isto é, o quanto cada pessoa emite de carbono em média, e o nível de desigualdade social.

As emissões per capita de um país pouco populoso como a Austrália são maiores do que as emissões per capita da China, por exemplo. Isso significa que nem sempre os países que mais emitem são que têm mais habitantes.

Há relação direta entre o nível de desenvolvimento e emissões de carbono?

É possível traçar um paralelo entre a população e as emissões de carbono com a economia e a energia. A análise do consumo de energia de um país pode ser feita a partir da atividade, estrutura e intensidade. A atividade representa o tamanho e o crescimento da economia, podendo ser medida por um indicador como o PIB. A estrutura está relacionada com a participação dos setores na economia, se ela é mais fundada na agricultura, na indústria ou no setor de serviços. E a intensidade representa a quantidade de energia que é necessária para gerar uma unidade de valor, refletindo de forma ampla o nível de eficiência energética daquela economia.

Para Luiz Marques, da Unicamp, não necessariamente. "Países menos desenvolvidos do ponto de vista socioeconômico, como o Brasil e Indonésia, historicamente emitiram mais carbono do que alguns países europeus", diz.

Na avaliação de Fábio Teixeira Ferreira da Silva, pesquisador da UFRJ, existe uma relação se olharmos pela perspectiva das emissões associadas à queima de combustíveis fósseis. "Os primeiros países que se industrializaram puderam queimar combustíveis para crescer e financiar um nível de desenvolvimento socioeconômico superior. Por outro lado, as emissões históricas associadas ao desenvolvimento desses países reduziram o espaço no orçamento de carbono global para que outros pudessem se desenvolver seguindo o mesmo modelo".

Essa questão tem sido central nos debates sobre justiça climática, especialmente entre o final da década de 1990 e o início dos anos 2000, quando as discussões sobre mudança climática impulsionaram o primeiro esforço significativo de governança global para limitar as emissões de carbono, culminando no Protocolo de Quioto.

"A diplomacia brasileira teve um papel fundamental nas negociações, ajudando a incorporar o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, que reconhece diferentes obrigações entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Como resultado, foram impostas metas obrigatórias de redução de emissões apenas aos países desenvolvidos, listados no Anexo B do protocolo", afirma Silva, pesquisador da Coppe/UFRJ.

Que medidas os países que mais emitiram carbono têm adotado?

De acordo com Marques, nenhum país, seja ele qual for, tem adotado medidas efetivas para diminuir suas emissões. Os países europeus até exibem uma pequena diminuição de suas emissões, mas isso se deve ao fato de serem importadores.

"O problema é que as emissões nacionais são inventariadas pelo local da emissão, não pelo local do consumo do produto cuja produção gerou a emissão. As emissões de produtos industrializados importados pela Europa, por exemplo, da China são contabilizadas na China. E as emissões das commodities (ferro, soja, carne, milho, petróleo etc.) importadas pela Europa, por exemplo, do Brasil, são contabilizados no Brasil. E isso falseia um pouco os dados reais", afirma o professor aposentado da Unicamp.

Falando especificamente do maior emissor histórico de carbono, os Estados Unidos assinaram o Protocolo de Quioto em 1998, mas o Senado americano nunca o ratificou, alegando que as exigências poderiam prejudicar a economia do país. Em 2005, os EUA se retiraram oficialmente do protocolo durante o governo de George W. Bush.

Em 2015, os EUA assinaram e ratificaram o Acordo de Paris sob a administração de Barack Obama, se retiraram em 2020 no governo de Donald Trump, e retornaram em 2021 sob a presidência de Joe Biden.

"As eleições nos EUA em 2024 serão um momento ímpar para determinar o comprometimento do país com o principal tratado global para combater a crise climática, especialmente considerando que Donald Trump, que retirou os EUA do Acordo anteriormente, é novamente um candidato forte", pondera Silva.

Fonte: Fábio Teixeira Ferreira da Silva, doutor e pesquisador de pós-doutorado do Laboratório Cenergia do PPE/COPPE/UFRJ (Programa de Planejamento Energético do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro); Luiz Marques, professor aposentado do Departamento de História da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas)