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Energia Limpa

Tudo sobre a produção energética que não emite poluentes na atmosfera


Quais são os desafios da transição energética no Brasil?

Turbinas de produção de energia eólica, que colabora para uma matriz elétrica limpa Imagem: Getty Images

Juliana Zambelo

Colaboração para Ecoa

05/08/2024 05h30

O desequilíbrio provocado pelas mudanças climáticas em todo o mundo é cada vez mais palpável, evidenciado não apenas pelos estudos científicos ou ocorrências de eventos extremos, mas já está claramente perceptível em aspectos banais do dia a dia, como comportamentos atípicos das estações do ano ou aumento expressivo no preço de certos alimentos. Diante desse cenário, especialistas insistem que um empenho mais efetivo dos países para acelerar a transição energética é fundamental.

As mudanças climáticas são provocadas pelo aumento extraordinário das emissões de gases de efeito estufa, que há décadas vêm alterando a composição da atmosfera e aumentando as temperaturas globais.

A maior fonte de emissões é a queima de combustíveis fósseis para geração de energia, por isso a ciência é categórica em apontar a necessidade de substituir definitivamente petróleo, carvão mineral e gás natural por alternativas limpas. O setor de energia engloba geração de eletricidade, transportes e indústria, e fazer a transformação energética implica adaptar parte da infraestrutura existente.

O Brasil é um dos países mais avançados nesse processo, principalmente por ter, historicamente, as hidrelétricas como principais fontes de eletricidade. Segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), no último mês de julho, 84,6% da eletricidade gerada no Brasil teve como origem fontes renováveis, com predominância de fonte hídrica (53,9%), eólica (15,2%) e biomassa (8,3%). Entre as fontes não renováveis, 14,4% da energia foi gerada por combustíveis fósseis e 1% vem das usinas nucleares.

Mas essa matriz limpa está relacionada apenas à produção de energia. Quando se fala em matriz energética como um todo, é preciso considerar também as fontes usadas para cozinhar, como carvão e gás natural, e para se deslocar, como gasolina ou óleo diesel. E, neste caso, ela não é tão limpa assim.

A matriz energética brasileira registra mais de 50% de participação de fontes não renováveis, mostra o Balanço Energético Nacional 2024, do Ministério de Minas e Energia. Por isso, existem ainda muitos entraves a serem superados para a descarbonização da economia nacional, de forma a garantir que o país cumpra suas metas de redução de emissões para os próximos anos.

O desafio do transporte

O setor de transporte é hoje o maior consumidor de combustíveis fósseis do Brasil, e, por isso, é o grande desafio no processo de transição energética. O Balanço do governo mostra que, em 2023, esse setor consumiu 33% da energia do país e mais de 77% dessa energia teve origem em fontes não renováveis, como óleo diesel (44,6%) e gasolina (21,7%). Houve aumento no consumo de etanol e biodiesel, mas de apenas 0,5%.

Apesar do aumento na venda de carros elétricos, essa tecnologia ainda esbarra no alto preço e na falta de infraestrutura para esses veículos. Além disso, o país continua dependente do transporte de carga rodoviário, grande emissor de GEE. A substituição total da frota de caminhões por modelos elétricos, entretanto, não é hoje uma saída viável, por conta da enorme dimensão territorial do país.

Para especialistas, a transição energética no setor de transporte está bastante atrasada e deveria ser feita a partir de mudanças mais profundas.

Nos centros urbanos, ao invés de substituir cada carro a combustão por um elétrico seria preciso investir na melhoria do transporte coletivo e em novas configurações urbanas que diminuíssem as distâncias entre as pessoas e seu trabalho, estudo ou locais de lazer, reduzindo assim os deslocamentos e o consumo diário de energia, além de melhorar a qualidade de vida da população. E para o transporte de carga, é fundamental diversificar a matriz brasileira, investindo em alternativas movidas a energia limpa.

O desafio do sistema elétrico

A geração de energia elétrica por fontes renováveis no Brasil é um exemplo para o mundo. Além do grande volume produzido por hidrelétricas, nos últimos anos houve crescimento vertiginoso da capacidade de geração de energia a partir de usinas eólicas, solares e de biomassa. Essas fontes limpas geram empregos, renda e diversificam cada vez mais a matriz energética brasileira.

Mas esse avanço rápido esbarra em problemas de infraestrutura e em desigualdades. Milhões de brasileiros ainda não têm acesso à energia elétrica, seja por morar em locais remotos ou por falta de renda.

Para amparar essa transição de forma igualitária, o país precisa investir na modernização de redes de transmissão para distribuição da energia, na ampliação da rede nas regiões de maior potencial de geração de energia renovável e na melhoria do sistema de armazenamento de energia.

O desafio político

Para que uma transição energética rápida e bem sucedida aconteça no Brasil, é fundamental que a legislação do país acompanhe a velocidade da tecnologia e a urgência da crise climática, criando regulações sólidas que amparem as mudanças e deem segurança para as pessoas e para o setor privado, incentivando mais investimentos em meio a cenários tão turbulentos. E este tem sido mais um grande obstáculo do país para alavancar essa mudança.

Parte dos contratempos têm sido provocados por interesses econômicos e políticos a favor da perpetuação do uso de combustíveis fósseis. A influência das indústrias de combustíveis fósseis afeta a elaboração e aprovação de leis que pretendem abrir caminhos para a descarbonização, às vezes bloqueando seu avanço por anos, outras vezes agregando emendas que vão na contramão do tema central.

Um exemplo foi a inclusão no projeto de lei para regularizar as fontes eólicas em alto-mar de uma emenda que obriga a contratação de térmicas a carvão, gerando o efeito oposto ao pretendido. O projeto ainda está tramitando no Congresso e, caso seja aprovado como está, será um retrocesso na transição.

O desafio da transição justa

Outra questão importante que o país precisa enfrentar nesse processo é garantir que ele seja feito de forma justa para todos os cidadãos e para o meio ambiente. As fontes de energia renováveis, apesar de mais limpas, também causam diferentes tipos de impactos socioambientais e exigem atenção.

Por exemplo, a instalação de grandes parques eólicos sem regulação e fiscalização tem provocado enormes prejuízos a populações vulneráveis no Nordeste e afetado a biodiversidade e o equilíbrio de ecossistemas no seu entorno. Em relação à biomassa, o risco é de que a produção de insumos não aumente o desmatamento ou prejudique biomas já ameaçados.

Além disso, o país precisa cuidar para que os trabalhadores das indústrias de petróleo, gás e carvão e as regiões que dependem desses setores sejam acompanhados durante a transição, encontrando novas fontes de renda em uma nova economia descarbonizada.

Fonte: Alexandre Szklo, engenheiro químico e professor titular do Programa de Planejamento Energético da COPPE/UFRJ; Felipe Barcellos e Silva, pesquisador em política energética do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) e membro do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG).

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