O que é morte cerebral? Como é identificada? É seguro o diagnóstico?
Popularmente chamada de morte cerebral, a morte encefálica é a "morte baseada na ausência de todas as funções cerebrais". De acordo com a Associação Brasileira de Transplante de Tecidos e Órgãos (ABTO), trata-se de uma definição legal (no sentido da legislação) de morte. É completamente irreversível e, para ser atestada, existem protocolos médicos e jurídicos que devem ser seguidos, antes mesmo de o processo de doação de órgãos ter início.
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Como acontece?
A morte encefálica é resultado de uma descompensação dos mecanismos que regulam a pressão intracraniana e o fluxo sanguíneo cerebral. Por exemplo, o trauma provocado por uma pancada forte na cabeça faz aumentar a pressão intracraniana. Com isso, quando o coração tenta bombear o sangue para dentro da cabeça, ele não consegue porque a pressão do crânio está maior. Com o bloqueio da entrada de sangue, o cérebro perde as suas funções, resultando no fim da atividade cerebral. A ausência de fluxo cerebral é a morte encefálica.
As situações que levam à morte encefálica são provocadas por acidentes graves como traumatismos cranianos, AVC (Acidente Vascular Cerebral), hemorragias intracranianas, entre outros eventos. -
Qual a diferença para o coma?
Quando o paciente está em coma, ele apresenta viabilidade cerebral, além de fluxo sanguíneo regular no cérebro. Na morte encefálica, não há qualquer função cerebral.
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Como é identificada?
A suspeita de morte encefálica é confirmada em etapas, já que o diagnóstico não admite erros. Por isso, os procedimentos devem ser iniciados apenas em pacientes que apresentem: coma não perceptivo (que não respondem a estímulos), ausência de reatividade acima da medula espinhal e apneia persistente (incapacidade de coordenar movimentos respiratórios).
De acordo com a Resolução CFM nº 2.173/17, do Conselho Federal de Medicina, o paciente também deve apresentar todos os seguintes pré-requisitos: presença de lesão encefálica de causa conhecida e irreversível; ausência de fatores tratáveis que confundiriam o diagnóstico; tratamento e observação no hospital pelo período mínimo de seis horas; temperatura corporal superior a 35ºC; e saturação arterial de acordo com critérios estabelecidos pela Resolução. -
Qual é o protocolo de morte encefálica no Brasil?
No Brasil, o protocolo de morte encefálica deve ser realizado por dois médicos diferentes, com um intervalo mínimo de uma hora, que avaliarão, por meio do exame físico, as funções cerebrais. Além dos exames clínicos que testam reflexos do tronco encefálico, como reação das pupilas, que devem ser realizados por esses dois médicos diferentes, com um intervalo mínimo de uma hora entre o primeiro e o segundo, o paciente deve ser submetido a um teste de apneia, para confirmar a incapacidade de o paciente manter a respiração de maneira independente, e a um exame complementar que assegure a ausência de atividade cerebral cortical, ausência do metabolismo ou ausência de fluxo sanguíneo cerebral, como a angiografia cerebral, o eletroencefalograma, o doppler transcraniano ou a cintilografia.
Este protocolo é realizado por médicos independentes, sem relação com a equipe responsável pela captação de órgãos. A abordagem junto à família, quanto à doação de órgãos, também é feita por profissionais de saúde treinados, sem qualquer vínculo com os médicos que realizam o protocolo de morte encefálica. -
O protocolo é seguro?
Sim. Quando cumprido corretamente, o protocolo garante que não haja erros. Como citado, há diversas etapas e parâmetros de investigação para atestar o diagnóstico de morte encefálica. Duas equipes devem realizar os testes que gerarão um laudo médico assinado por dois médicos diferentes. Além disso, a legislação brasileira que regulamenta a doação de órgãos, o Decreto nº 9.175/2017, garante à família o direito de contar com a presença de um médico de confiança para acompanhar o diagnóstico.
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A morte cerebral deixa a pessoa imóvel?
Nem sempre. Algumas pessoas podem apresentar reflexos na medula espinhal ou ainda contrações musculares, mas esses reflexos espinhais nada têm a ver com atividade cerebral. Eles indicam que a medula está íntegra e independem do cérebro para acontecerem. Os exames utilizados na suspeita de morte encefálica identificam essa diferença.
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A morte encefálica é reversível?
Não. A pessoa com morte cerebral é considerada legalmente morta, e os aparelhos que mantêm a respiração e os batimentos cardíacos serão desligados caso o paciente não seja doador.
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Morte cerebral equivale à morte?
Sim. Como não há atividade cerebral, o coração está batendo e o corpo respirando com a ajuda de aparelhos, e esta é uma situação que só será mantida artificialmente.
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Quando é possível doar os órgãos?
Quando é confirmada a morte encefálica, os órgãos podem ser doados em caso de conservação de funções e de bom estado de saúde física, após autorização da família.
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Como a pessoa se mantém "viva" até a remoção dos órgãos?
O corpo é ligado a uma máquina chamada de "ventilador", que fica ao lado do leito e conectada ao paciente por meio de um tubo na traqueia, que mantém a respiração. Tanto a medicação quanto o ventilador permanecem ativos até que se confirme o diagnóstico de morte cerebral, e uma decisão seja tomada quanto à doação de órgãos.
Se o paciente for doador de órgãos, a medicação usada para controlar pressão arterial, temperatura do corpo e a oxigenação com ajuda do ventilador é ministrada até o momento em que os órgãos sejam retirados. Após a remoção do órgão, reconstitui-se o corpo e iniciam-se os trâmites legais de sepultamento. -
O corpo pode ser velado em caixão aberto?
Sim. De acordo com a legislação brasileira, após a doação de órgãos, o corpo precisa ser reconstituído dignamente para ser encaminhado para o processo de sepultamento ou cerimônia fúnebre.
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Se os órgãos não forem doados, o que é feito?
Em caso de não doação, a equipe médica desliga os aparelhos, assina o laudo de morte encefálica com o horário de conclusão do protocolo e libera o corpo para o sepultamento aos cuidados da família ou responsáveis.