No início de outubro, o rio Solimões atingiu o menor nível já registrado para esta época do ano em Tabatinga (AM), deixando comunidades inteiras isoladas e sem acesso à água limpa. Onde antes havia água, vastas extensões de areia ficaram visíveis, e balsas e navios ficaram encalhados. Em 4 de outubro, medições indicaram que o rio Solimões havia caído para 254 centímetros abaixo da marca zero do medidor, um recorde. Localizado na margem norte do rio Solimões, o lago Tefé também está bastante afetado. Em agosto, ele encolheu drasticamente em comparação ao mesmo período de 2023, quando mais de 200 botos e tucuxis foram encontrados mortos durante a seca histórica com água em temperaturas recorde. Novamente há mortes dessas espécies de golfinho. Também houve uma taxa histórica de morte de peixes devido às altas temperaturas da água e à baixa concentração de oxigênio. A maior seca na Amazônia ocorre devido a quatro fatores principais: El Niño, da metade de 2023 até maio de 2024. O fenômeno é associado a uma camada de água quente no Pacífico equatorial centro-leste que normalmente muda os padrões de precipitação de forma a reduzir a chuva na Amazônia, especialmente durante os meses de julho até setembro, durante a estação seca. A magnitude da seca atual é mais severa do que a que a região viu em 2015-2016, a última vez que um forte El Niño ocorreu. O El Niño já acabou, mas as condições secas persistem na região. Atualmente, o fenômeno está com tendência de La Niña fraco a moderado e de curta duração. Uma área de grande aquecimento no Atlântico Norte também afetou os padrões de precipitação e contribuiu para a seca recorde e prolongada, uma vez que esta região mais quente induz secas na Amazônia. O desmatamento aumenta as temperaturas e muda os padrões de chuva. Há muitas décadas a Amazônia tem sido alvo de desmatamento, principalmente para pastagens da pecuária, mineração ilegal, extração de madeira e queimadas, degradando tanto o solo quanto os rios. Quase um quinto dessa floresta tropical foi perdida nos últimos 50 anos por desmatamento, e outros 17% foram degradados. Áreas de pastagens reduzem muito a reciclagem de água durante a estação seca. As mudanças climáticas contribuem para piorar as condições de seca de três maneiras principais: durante as estações secas, a bacia amazônica está recebendo menos chuvas do que antes, à medida que os padrões climáticos mudam. As temperaturas mais altas, que aumentam a evapotranspiração do solo e das plantas, fazendo com que percam mais água. O aquecimento global tem tornado os El Niños mais intensos e o Atlântico Norte mais quente. Nos últimos 40 anos, em todo sul da Amazônia, a estação seca já está 4 a 5 semanas mais longa. A Amazônia vem enfrentando duas secas por década nos últimos 20 anos (2005, 2010, 2015-16 e 2023-24), quando por um longo período no passado ocorria uma seca mais severa a cada duas décadas.A Amazônia abriga mais de 47 milhões de pessoas, incluindo 2,2 milhões de populações indígenas e comunidades locais, que dependem dos recursos florestais para sobreviver. Ela abriga mais de 13% das espécies de flora e fauna conhecidas da Terra, incluindo o boto-cor-de-rosa, ameaçado de extinção. Perder a floresta amazônica seria devastador não só para as comunidades locais e a vida selvagem que ela sustenta, mas para o equilíbrio ambiental do nosso planeta. Políticas ambientais focadas na preservação, controle do desmatamento e combate às queimadas são cruciais para evitar a degradação da floresta causada pelo homem. Precisamos de ações transformadoras de todos os setores e em todos os níveis de governo. Uma ação global coordenada é cada vez mais urgente para mitigar esses efeitos e evitar que os impactos climáticos se tornem irreversíveis na Amazônia. Salvaguardar os sistemas naturais que sustentam toda a vida requer o envolvimento de todos. A cúpula da COP16 da Biodiversidade, que está ocorrendo em Cali, na Colômbia, deve acelerar as ações para transformar sistemas com impacto prejudicial à natureza. Estamos num momento crucial para os governos e o setor privado começarem a agir de forma contundente em defesa da biodiversidade. No entanto, o sucesso depende das decisões que tomarmos e das ações que colocarmos em prática nos próximos cinco anos. |