Armazenamento de sementes age como seguro para adaptação à crise climática

Os cientistas Geoffrey Hawtin e Cary Fowler, que receberam na última quinta-feira (9) o Prêmio Mundial da Alimentação, têm a mesma vocação: salvaguardar o maior número possível de sementes para aproveitar no futuro as suas características genéticas, como a resistência ao calor ou às doenças.

A honraria foi concedida pela participação de ambos na criação de uma reserva mundial no arquipélago norueguês de Svalbard, no Ártico, uma espécie de cofre gigante de sementes localizado em uma geleira que atualmente armazena 1,25 milhão de amostras.

O objetivo é conservar com segurança o maior número possível de sementes agrícolas, disse à AFP Hawtin, agrônomo anglo-canadense de 75 anos, em entrevista por videoconferência ao lado de Fowler.

"O que mudou um pouco desde sua inauguração em 2008 é o que entra", explica ele. Se no início eram colhidas principalmente sementes de plantas "domesticadas", como o trigo ou a cevada, a reserva agora acolhe cada vez mais espécies silvestres.

Muitas vezes estas possuem "genes particularmente interessantes face à mudança climática", sublinha.

Modificação genética

A domesticação das plantas é "o resultado de milhares de anos e inúmeras experiências", lembra Fowler, um cientista americano especializado em sementes.

Seria "arrogante" pensar que as ferramentas atuais de engenharia genética, mesmo as mais sofisticadas, poderiam reproduzir esta riqueza "em pouco tempo", diz este pesquisador de 74 anos, afirmando que esta opção é "muito mais" cara "do que conservar a diversidade de sementes nestes bancos".

Para Hawtin, a modificação genética desempenhará "um grande papel, (mas) o problema é saber o que modificar". "A resposta de uma planta à mudança climática depende de dezenas de milhares de genes", explica ele.

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Mesmo com a inteligência artificial (IA), "duvido que um dia seremos capazes de compreender plenamente todas as suas interações", acrescenta.

O agrônomo prevê um aumento nos bancos digitais de sementes, onde serão armazenadas informações que detalham as características genéticas de diferentes plantas.

"Como um seguro de carro"

Os cientistas iniciaram suas carreiras na década de 1970, atuando na produção do trigo, milho ou arroz.

"Vimos a fome na Etiópia, na Índia. O nosso problema imediato era encher as barrigas", lembra Fowler. Para isso, os especialistas da época recomendavam apostar nas sementes de maior rendimento e recorrer ao uso de grandes quantidades de fertilizantes e pesticidas.

Só mais tarde compreenderam a importância de desenvolver sistemas agrícolas mais sustentáveis e de expandir o painel de plantas cultiváveis, diz Fowler, atual enviado especial dos Estados Unidos para a segurança alimentar no mundo.

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Nesta posição, promove plantas tradicionais na África, muitas vezes ignoradas pelos programas de pesquisa em detrimento do milho, trigo e arroz, mas potencialmente mais nutritivas e adaptáveis ao meio ambiente.

Já Hawtin começou sua carreira no Oriente Médio à procura de agricultores para coletar sementes no Afeganistão, na Etiópia, no Líbano ou na Jordânia e depois cruzá-las.

Não querendo jogá-los fora, ele começou a conservá-las. Três décadas depois, a guerra na Síria forçou o banco de sementes de Aleppo, onde trabalhou durante algum tempo, a retirar urgentemente suas amostras. Muitas foram enviadas para a reserva de Svalbard, e algumas foram de lá para Marrocos e Líbano.

"Há duas semanas, no Marrocos, vi centenas destas sementes sendo plantadas em campos para testar sua resistência à seca", diz Hawtin.

Mas esta utilidade da reserva mundial deixa inevitavelmente um sabor amargo.

"É como um seguro de carro. Você prefere não precisar usá-lo. Infelizmente, provavelmente teremos cada vez mais conflitos ou desastres naturais que colocarão em perigo os bancos de sementes", analisa Fowler.

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O prêmio recebido pelos cientistas é entregue desde 1986 a pessoas que melhoraram a qualidade, quantidade ou acessibilidade dos alimentos no mundo.

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