Muita gente não sabe que você tem uma fazenda para a produção de orgânicos. Poderia contar como isso aconteceu na sua vida?
Eu fui criado na fazenda do meu avô no sul da Bahia, na região de Itororó, e sempre mexi com fazenda, mas minha vida era como ator. Quando meu avô morreu, fui visitar minha família na Bahia e me vi mais preocupado em resgatar a fazenda como ela era na minha infância, porque percebi o desmatamento, percebi que estava faltando as nascentes de água que tinham por lá. Mas meus familiares estavam mais focados em manter a produção como estava, então eu comprei um sítio no Rio de Janeiro e comecei a produzir.
Quando eu comprei esse sítio, ele já produzia hortaliças e eu não quis mexer nisso. E eu, como não entendia nada de hortaliça, ia na loja e o vendedor falava "compra esse adubinho aqui pra fortalecer o solo, esse remedinho aqui pra pulverizar" e eu comprava e levava as hortaliças para minha avó comer falando "olha, vó, salada natural". E um dia eu vi que os caras que produziam na fazenda não comiam o que eles estavam plantando. E eu fui perguntar o porquê e eles me falaram "como a gente vai comer se estamos botando veneno todo dia". Aí acendeu essa luz em mim e comecei a procurar umas soluções e achei um curso de agricultura orgânica. E aí você começa a entender que não existe solo degradado, existe só o solo mal manejado, não existe praga, existe desequilíbrio. Tudo isso foi fazendo sentido pra mim. Hoje, inclusive, faço parte do conselho do Instituto Brasil Orgânico.
O consumo de orgânicos ainda é tido como algo elitizado por aqui. Por que isso acontece?
Eu acho que o orgânico jamais terá o preço do alimento convencional porque quando você consome o produto orgânico você valoriza o produtor, zela a qualidade das águas e a preservação das florestas e isso tem um preço. E tem outra coisa, faltam políticas públicas mais objetivas que ajudem o produtor de orgânicos. A isenção de imposto do agronegócio ainda é muito grande e o pequeno produtor não tem tanta facilidade. Você poderia fazer uma política voltada para as escolas públicas, por exemplo, onde todas as escolas comprariam orgânicos, fazendo, junto com isso, com que as próprias crianças vejam como a comida chega na mesa delas. Colocar a comida nesse lugar importante que ela tem, não só uma horinha para você comer, mas entender que a hora que você se alimenta é a hora você se nutre, é a hora que você coloca medicamentos no seu corpo e esses medicamentos são o brócolis, alface, arroz, feijão.
Como você vê a relação do Brasil com os agrotóxicos?
O que eu quero que as pessoas entendam é o seguinte: quando se começou a usar agrotóxicos na plantação o discurso era de que a gente só conseguiria alimentar todo mundo se a gente pudesse plantar em grande escala e que isso só seria possível com os agrotóxicos. Quando apareceram os transgênicos, o discurso foi o mesmo. Estamos em 2021, e o mundo continua passando fome. A gente está falando de transgenia e agrotóxicos para commodities, a soja, o milho, o algodão. Quem bota comida na nossa mesa é a agricultura familiar. Então, a solução é estimular o pequeno produtor.
Acabar com a fome não é só botar comida na mesa, é olhar para a qualidade da comida também para trazer saúde para essas pessoas.