O Vale do Ribeira concentra 21% do que resta do bioma da Mata Atlântica em território nacional - o total equivale a apenas 7% da vegetação original. É a área mais conservada do estado.
Isso se deve em grande parte à presença das comunidades quilombolas e ao sistema de produção agrícola utilizado por elas há mais de 300 anos.
"Os povos da floresta e sua forma de manejo com processo regenerativo contribuem para a proteção dos territórios onde as famílias vêm resistindo há séculos", diz a Ecoa a engenheira agrônoma Fabiana Fagundes, que presta assessoria técnica à Cooperativa dos Agricultores Quilombolas do Vale do Ribeira (Cooperquivale). "Eles realizam práticas agrícolas ancestrais, mantendo a floresta conservada e garantindo a soberania alimentar".
Essas práticas ancestrais formam o Sistema Agrícola Tradicional Quilombola do Vale do Ribeira e foram reconhecidas como patrimônio cultural do Brasil em 2018 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
"Aqui na comunidade todos nós trabalhamos na roça, é a principal atividade. Além da produção de subsistência, tem também a banana orgânica que a gente trabalha aqui desde 2000, sem agrotóxico", diz Ditão, 67, nascido e criado no Quilombo Ivaporunduva, em Eldorado.
A técnica utilizada no Vale é conhecida como roça de coivara, uma agricultura itinerante herdada dos povos indígenas e de africanos escravizados, que foi transmitida de geração em geração. Ela se baseia no rodízio das áreas de plantio, unindo produção e conservação.
Nascida no Quilombo Sapatu, também em Eldorado, a produtora rural Maria Tereza Vieira, 44, lembra de ter aprendido a plantar dessa maneira observando a mãe e fazendo como ela.
"Desde pequena - fora do horário da escola, claro - eu acompanhava minha mãe nessas roças. Ela incentivava a gente, liberava uma parte daquela terra pras crianças. ", Maria recorda.
Levantamentos realizados pelo Instituto Socioambiental encontraram mais de 240 variedades de plantas manejadas nas roças e quintais quilombolas. A maioria é destinada à alimentação, mas também há espécies usadas para fins medicinais, para a construção de casas e na confecção de artesanatos.