Luz no fim do túnel

Bruno Gagliasso transformou o plantio de árvores em missão de vida e quer inspirar você a se juntar nessa luta

Fernanda Schimidt De Ecoa, em São Paulo Thiago Jenne

O ator Bruno Gagliasso fez um pedido ao ler notícias sobre as queimadas na Amazônia no ano passado: sobrevoar a região para testemunhar o que estava acontecendo. Ele queria ser a ponte entre o público e a realidade na região, muitas vezes alvo de "fake news". O que viu, no entanto, o transformou intensamente. As cenas do alto provocaram um choque nos sentidos.

"Sentir o cheiro da queimada, ouvir o barulho ensurdecedor da natureza queimando, e ver [aquilo], foi muito forte ", lembra.

Ao retornar para casa, tomou um decisão: não comeria mais carne. O passo seguinte foi comunicar os sócios de sua rede de hamburguerias, franquias da nova-iorquina Burger Joint, sobre a decisão. "Como é que eu paro de comer carne e vendo carne? Saí do negócio, não fazia sentido. O que eu vou falar para meus filhos?", questionou-se.

A experiência na Amazônia foi mais uma para sedimentar em Gagliasso a certeza de que sua missão é deixar o mundo um lugar melhor do que encontrou. O despertar para a importância da natureza surgiu ainda na infância, instigado por passeios ao lado do pai, Paulo César Marques. E é o brilho nos olhos do Bruno criança que ele quer transmitir hoje para os filhos: Chissomo, 7, Bless, 6, e Zyan, de 5 meses.

Num terreno em Membeca, Paraíba do Sul (RJ), batizado de Rancho da Montanha, começou a plantar milhares de árvores, uma para cada dia de vida até seu aniversário de 40 anos, em 13 de abril de 2022.

"Um dos motivos pelos quais estou tão envolvido nessa luta e nesse desafio que é mais do que plantar, é despertar esse sentimento nos meus filhos, nos amigos deles, em quem vai ler a nossa entrevista", diz.

Para isso, o ator e empreendedor tem colocado a mão da terra, auxiliado por especialistas em plantio, que estudaram a região do Rancho e desenharam um plano para o projeto. Até a entrevista com Ecoa, ele já tinha plantado 2.500 mudas e se preparava para o plantio de mais 1.500 no fim de semana. Alguns dias após a conversa, mandou mensagem para contar que tinha atualizado a meta: serão 100 mil árvores em cinco anos.

Compartilhando o lema do movimento #PlantarEcoa e da campanha Pare de Falar. Comece a Plantar, parceria de Ecoa com a ONG Plant-for-the-Planet, Bruno parte da ideia de que a ação é a melhor ferramenta para a transformação. "Quando você faz com propósito de fato de mudar algo, você atinge essa pessoa, porque a verdade está alí, tá no teu olho, tá nas suas atitudes. Você não precisa falar, basta ser, fazer", diz. "Se uma pessoa que ler a matéria plantar uma árvore, já é um grande passo."

Sua meta é servir de exemplo: "O que eu mais quero é que as pessoas se sintam motivadas a fazer o mesmo ou um pouquinho que seja", afirma.

Ecoa - Então quer dizer que você está plantando milhares árvores?

Bruno Gagliasso - Tenho como meta plantar uma árvore para cada dia de vida, isso dá... faz as contas aí, eu vou fazer 40.

14.600

É isso aí, eu vou ter que plantar 14.600 árvores até meus 40 anos, e depois disso eu vou sempre plantar 360 árvores por ano. Essa é a minha meta, vamos ver.

Bruno Gagliasso compartilhou com Ecoa, poucos dias após a entrevista realizada na semana passada, que tinha atualizado o objetivo:

A cada dia que passa, a cada plantio, descubro que posso fazer mais. Se posso fazer mais, por que não fazer? É lindo simbolicamente plantar uma árvore por dia, mas plantar as 100 mil árvores torna a contribuição muito maior e o impacto, também. E se eu posso impactar de forma positiva o meio ambiente e a vida das pessoas, por que não?

E como começou essa ideia, Bruno?

Cara, eu acho que é o mínimo que eu posso fazer. Isso me dá prazer, isso ajuda o meio ambiente, isso serve de exemplo. Me faz olhar para o outro de uma maneira completamente diferente. É isso que quero deixar para meus filhos, sabe? É isso que quero deixar para os meus amigos, é isso que quero que a minha esposa veja. Quero que as pessoas que eu admiro também, de certa forma, me admirem.

Virou parte da minha rotina, virou parte da minha vida. Não consigo me imaginar não pensando sobre esses temas, sabe? Sempre fui muito ligado à natureza, sempre fui muito ativo, mas de um tempo para cá mexeu muito comigo ir para Amazônia e ver aquilo tudo pegando fogo com o pessoal do Greenpeace. Foi muito forte para mim. Ali, eu parei de comer carne, ali eu passei a dar mais valor ainda às atitudes que deveriam ser atitudes do nosso cotidiano e não são. Ali falei "cara, eu tenho muita coisa para fazer. O que que eu vou querer deixar de legado? O que eu vou querer deixar para quem vem depois de mim?". E, hoje, é muito natural. Não me imagino fazendo outra coisa que não seja plantar árvore, soltar meus bichos.

A gente tem um terreno que fica em Membeca, Paraíba do Sul (RJ), em que a gente está construindo um rancho. O rancho vai ser sustentável. Tenho um terreno muito grande, meus vizinhos também, então porque não plantar árvores? Quero que meus vizinhos plantem comigo, meus amigos, minha família. Quero poder propagar isso porque quanto mais pessoas plantando árvores melhor para o mundo. É uma forma de retribuir tudo o que a vida me deu.

A gente está agora, em Ecoa, com uma campanha justamente de plantio de árvores nativas. Quando olhamos em volta, a maioria das árvores que existem não são nativas. Como é que você está garantindo que esse processo seja o melhor para a natureza também?

Eu sou um aprendiz, mas costumo pesquisar bastante, ir atrás e me envolver com pessoas que realmente entendem do assunto. Para fazer esse plantio, essa quantidade de árvores, peguei pessoas em quem confio muito que é o Ricardo Cardim, que é o cara que criou a Floresta de Bolso. O Alex Vicentini, que também é proprietário-sócio da Fábrica de Árvores, de São Paulo. Eles entendem muito. Eles fizeram uma pesquisa para mim, estudaram todas as árvores da região de onde estou. Peguei muitas árvores da região para justamente incentivar e fazer com que elas cresçam e nasçam e se reproduzam. Também trouxe muita planta de fora, principalmente, porque tenho dois filhos africanos e quis fazer um jardim africano: então tem lá meu baobá, que estou cuidando com muito carinho.

Thiago Jenne Thiago Jenne

Qual tem sido para você o maior aprendizado de mexer com a terra?

Cada vez mais eu descubro que nós, seres humanos, somos parte da natureza, somos a natureza. Só quando a gente entende isso, passa a cuidar de fato como realmente deve cuidar. A natureza é muito maravilhosa. Enxergo Deus na natureza, sabe? Quando vou para o Rancho da Montanha, que é o nome do meu rancho, lá é onde me sinto mais pleno, em maior contato com Deus, com o ser humano e com a natureza. Isso eu aprendo a cada dia.

Amanhã eu estou indo para lá plantar 1.500 árvores, mais algumas árvores grandes e isso me dá um prazer absoluto. Poder levar minha família e participar disso junto, botar a mão na terra, aprender que a gente tem que fazer o solo também, plantar mandioca, feijão, melão, coisas que eu não sabia. Uma coisa protege a outra, botar árvore alta, árvore baixa, esse conceito de Floresta de Bolso, que fiquei muito feliz em aprender, para que elas possam competir, para pegar o sol. Ao mesmo tempo é uma competição saudável, porque uma está instigando a outra e as duas vingam, as duas crescem. Eu sou garoto-propaganda da Nespresso, e eles têm uma linha muito legal de reflorestar os campos de café. Também pude plantar várias árvores com eles, então isso está fazendo parte do meu cotidiano. Eu estou tentando trazer empresas para dentro, para também me apoiarem e ajudarem a fazer a diferença.

E o que é o Rancho da Montanha?

O Rancho da Montanha nada mais é do que um lugar para você contemplar e se sentir parte da natureza, é lá que eu vou passar dias com a minha família, é lá que a gente vai soltar animais silvestres, porque eu sou patrono de uma ONG que se chama Vida Livre, que é comandada pelo Roched, aqui do Rio de Janeiro. A gente reabilita os animais silvestres para soltura. Esses animais que são presos pelo tráfico, que estão em gaiolas mínimas, que são apreendidos em feiras pela Polícia Federal, Polícia Civi. Então lá a gente transformou em área de soltura. Tenho escola de vôo. Nada mais é do que... é que eu não gosto de falar esse nome "gaiola" e "viveiro"... é um espaço gigantesco para os animais poderem aprender a comer, aprender a voar, aprender a se virarem sozinhos para aí, sim, a gente soltar. Porque se você pegar um animal que foi preso durante anos e soltar, eles vão morrer. Plantei muitas árvores frutíferas justamente para que os animais possam ir até lá... não é para eu fazer minha feira, não, é para ser um lugar em que os animais se sintam confortáveis, não se sintam ameaçados.

Não é um empreendimento para ter visitação?

Não, pra você ter uma ideia... Por exemplo, a gente não está em época de aula e estamos em uma pandemia, então não dá para receber, mas gostaria de chamar a escola local para poder plantar. E vou ter tempo pra isso, se Deus quiser, essa vacina vai sair logo e isso vai passar e eu vou poder chamar a escola vizinha, meus vizinhos para participarem disso, para incentivar. É uma forma deles aprenderem. E a soltura é a mesma coisa. Já convido algumas pessoas, amigos que estão participando, porque é uma sensação de liberdade muito grande.

Minhas portas estão abertas para quem realmente quer aprender e ama natureza. Eu quero mais é propagar isso, cara, porque se gera essa sensação de felicidade em mim, não pode gerar sensação de felicidade em outra pessoa ver queimada, ver sujeira. Basta a gente dar um empurrão para que as pessoas possam aflorar esse sentimento que eu sinto e tenho certeza que você sente também.

Caio Gomes

Quando falamos em plantio, muita gente acha que é só fazer um buraco, colocar a muda e está feito.

Não, pelo contrário. Agora plantei 2.500 mudas com o Bruno Graell, que é um cara lá da região que entende bastante, e a gente plantou de uma maneira diferente. Foram 2.500 árvores em um terreno de 10 mil metros quadrados, que foi exatamente a área que foi desmatada, que pegou fogo lá em Membeca. A gente plantou elas espassadas a cada metro, a cada 2 metros e entre os dois metros, a gente plantou muda de feijão, de melancia, de aipim, milho, algumas outras coisas, para cuidar do solo. Agora, estou plantando 1.500 árvores em um terreno menor e de uma outra maneira, que é esse conceito de Floresta de Bolso, que é o alto condensamento e a alta concentração de árvores de espécies diferentes, tipo uma perto da outra para elas competirem e crescerem bem rápido e de uma maneira saudável.

A gente tem que fazer um tratamento na terra... Já ouviu falar em hidrogel? Pra mim é novo, mas pra quem entende não é mais. É um pozinho que armazena água durante uma semana depois que molha, então essa árvore está se alimentando daquela água durante uma semana mesmo que tenha seca. Paraíba do Sul é uma região muito difícil porque fica muito tempo sem chover — esse ano foi a maior seca dos últimos anos, e se eu não tivesse feito isso talvez elas não teriam sobrevivido.

São mudas jovens ainda?

São mudas jovens. Então vou aprendendo o tempo inteiro. Eu sou um entusiasta do assunto e quero aprender cada vez mais. Eu posso citar algumas espécies, até anotei, ó: nas 2.500 primeiras mudas, plantei ingá, banana, aldrago, amendoim bravo, babosa branca, cabeludinha, esses são os nomes populares. Eu não vou falar nome científico não, porque o nome científico de árvore é impossível... Tem goiaba, figueira, paineira, urucum, jerivá, timbó, unha-de-gato, cinco folhas. Cara, plantei muita coisa. Nas 1.500 que vou plantar agora nesse domingo e sábado, tem araçá branco, araçá amarelo, roxo, vermelho, araucária, cedro rosa, tenho ipê amarelo, branco, ipê da serra, roxo, pau ferro, pau alho, pau jacaré, pitanga, pata-de-vaca, muita coisa. Isso tudo vai ser para Floresta de Bolso.

Eu também adoro dar nome para as mudas. Não dá para dar para as 14 mil que eu quero plantar, mas algumas eu estou dando nome também. Tem de tudo... Malawi, que é o nome do baobá que plantei. Tem dona Emília, vó Miloca.

O que faz você escolher o nome para determinada muda?

Cara, eu quero ter o prazer de passar por ela e explicar para o meu filho que aquilo ali é um baobá, que veio da África, que o nome é Malawi porque é o país de origem dos meus filhos. Eu quero poder falar "essa aqui é a dona Miloca, por que que eu botei esse nome? Porque é uma árvore, porque é vida, porque sua bisavó já foi para o céu, mas ela está viva, sabe?". Eu quero passar por elas e poder colher os frutos, ver passarinho comendo o fruto. Isso me dá um prazer, me dá uma sensação de felicidade.

Você comentou que sempre teve essa conexão com a natureza. O que despertou o seu olhar para ativamente trabalhar com isso?

Tudo começou com o meu pai, Paulo César. Ele sempre foi muito ligado aos animais, à natureza, acho que ele despertou em mim desde criança. Só que o impacto que eu senti ao sobrevoar a Amazônia com o Greenpeace, sentir o cheiro da queimada, ouvir o barulho ensurdecedor da natureza queimando, e ver [aquilo], foi muito forte. Todos os sentidos estavam ali. Foi muito impactante na minha vida, aquele dia eu parei de comer carne, naquele dia algo muito forte trabalhou dentro de mim, porém não foi só aquilo. Acho que o que me levou mesmo, o que o ser humano está fazendo em relação à natureza... acho que foi a natureza que me chamou. Estou aqui todo emocionado falando. Não consigo citar um porquê, ou um motivo, é multifatorial mesmo.

Você citou seu pai. De que maneira ele incitou isso em você?

Passei com meu pai a minha infância. Meu pai é separado da minha mãe, e toda vez que eu ia encontrar com meu pai, a gente ia para sítio, fazenda ou de amigo ou de parente, a gente ia para a praia. Cada hora estava com um bicho novo, cada hora ganhava um cachorro. Nosso programa era ir em feirinha, sabe. Porque eu amava ficar vendo, não podia passar por um petshop... Hoje vejo como é perigoso tudo isso, mas antigamente eu era criança. E quando você ama alguma coisa, você quer cuidar daquele bichinho. Então isso despertou em mim um interesse muito grande. Eu ia para casa da minha avó, a Dona Emília, que eu falei que coloquei o nome da árvore, dona Miloca... A casa da minha vó não era grande, mas tinha planta no jardim inteiro, não dava nem para andar, e tinha planta, e tinha tartaruga, e tinha sapo, e tinha gato que ficava no telhado, ao mesmo tempo junto com cachorro. Era uma quizumba.

Isso marca muito minha infância, e é muito bom quando eu vou fazer uma soltura com o Vida Livre lá no terreno e posso levar meus filhos, sabe? A gente acabou agora de adotar duas araras, que estavam confinadas em um espaço pequeno, já com idade, elas não podem ser soltas, não tem como elas serem reintroduzidas. Fui levar meus filhos para conhecer e explicar para eles. Pô, isso me faz feliz.

Thiago Jenne Thiago Jenne

Você consegue ver nos seus filhos aquele brilho nos olhos que você tinha nessa idade com o seu pai?

Sem dúvidas! E de maneira diferente, cara, porque quando eu falo, pô, "vamos para o rancho", eles já ficam... outro dia minha filha foi para o rancho e eu falei "filha, tá na hora de ir embora", ela já começou a chorar. Ela tinha passado a tarde com arara, com porco, com cachorro, com gato, com carcará sobrevoando, com tucano voando, isso é maravilhoso. Meu filho é muito ligado em pássaro, ele tem um envolvimento com pássaros muito maior do que tem com cachorro, por exemplo. Minha filha se identifica muito com cachorro, já com pássaro ela tem um pouco de medo. É engraçado ver cada um curtindo e se identificando com uma coisa diferente, sabe? Eles agora estão super ansiosos para plantar árvores.

É comum ver gente refletindo sobre meio ambiente ao pensar no mundo que quer deixar para os filhos, mas a gente acaba falando menos sobre essa nova geração que vamos formar e que vai ser quem terá de dar continuidade a esse trabalho. Como você vê esse papel?

Como uma baita de uma responsabilidade. Um dos motivos pelos quais estou tão envolvido nessa luta e nesse desafio que é mais do que plantar, é despertar esse sentimento nos meus filhos, nos amigos deles, nos alunos da escola lá de perto, de quem está me assistindo, em quem vai ler a nossa entrevista, em quem acompanha o seu portal. É isso: acaba virando uma missão, e não é uma missão que te faz sofrer, é uma missão que te dá felicidade. É isso que as pessoas precisam entender. Plantar árvore, cuidar dos animais é bom demais, faz bem.

Vejo como uma baita de uma responsabilidade porque quando eu morrer, quem vai cuidar do rancho vão ser meus filhos. E se eu não despertar esse amor neles, se eu não acender essa chama, e aí? Eles vão ter a memória "ah, meu pai era um cara que gostava muito disso". Mais importante é despertar isso neles para que eles possam passar adiante pros meus netos, para os bisnetos, para os amigos, para todo mundo que acompanha a gente.

Isso de alguma maneira conversa também com os direitos das crianças... E você acabou de ser anunciado embaixador da Unicef. Qual vai ser seu papel com eles?

Na verdade, aumenta o meu comprometimento que já é muito grande. Sou um grande amigo da Unicef há alguns anos, tenho uma relação muito forte com a África. Meus filhos nasceram na África, que é um continente com países maravilhosos. Eles nasceram no Malawi, então eu já tenho uma relação muito forte com Malawi, também tenho uma relação muito forte com a Unicef de Moçambique. E meu comprometimento aumenta agora com Brasil, oficializou esse comprometimento.

É o que você falou a importância de deixar esse mundo para as crianças, para futuras gerações, Unicef é isso, está muito linkada com o nosso papo aqui. A gente tem que dar a mesma importância que dá em colocar as crianças na escola, em fazer com que a escola ensine a importância de cuidar dos animais, das árvores, de plantar. Muita gente vem me perguntar "Unicef é gringa? Só ajuda África?". Não, o maior campo de atuação do Unicef é no Brasil. Então quando ajuda Unicef, você está ajudando muito o Brasil, isso é importante a gente falar. Essa nomeação veio para coroar e para de fato unir esse meu comprometimento com as crianças e adolescente, que é uma coisa que me deixa feliz demais, falar com eles, dialogar mesmo, tratar criança como deve ser tratada, com respeito, com carinho, ouvir principalmente. A gente está numa época em que a gente não está ouvindo e outro, a gente só fica na frente do celular, do computador.

Quais são para você as questões mais urgentes quando a gente fala de criança e adolescente no Brasil hoje?

Educação, sem sombra de dúvida. Não adianta estar na escola e não aprender, a gente precisa se preocupar também com o conteúdo. E tem que fazer parte desse conteúdo falar de ecologia, falar de reflorestamento, falar de natureza, falar de animais, tem que ter, porque se a gente não aprende isso desde cedo, a gente se torna esse ser humano, esse que a gente está vendo aí, esses de bosta, que estão comandando nosso país, que tão dando a mínima para o desmatamento.

Quando eu liguei para o Greenpeace para sobrevoar, eu fui sobrevoar porque estavam falando que era mentira. Então, eu, como pessoa pública, vou botar minha cara lá, vou filmar para mostrar que é real, e fui. Estava pegando fogo exatamente onde falaram que ia pegar. E é óbvio que isso acontece nessa época do ano, mas não pega sozinho, ele se alastra, mas foi causado por alguém. Olhando [do alto], você vê quando é um incêndio criminoso, quando não é.

Thiago Jenne Thiago Jenne

Quem tem sido uma inspiração para você nessa jornada de colaborar para um mundo melhor?

Eu tenho lido muita coisa, visto muita coisa, eu acabei de ler dois livros de um indígena, ele escreveu antes da quarentena e durante a quarentena...

Ailton Krenak?

É ele mesmo, os dois livrinhos, o azulzinho e o vinho. E ele escreveu um livro antes da quarentena e um durante a quarentena, e é impressionante, cara. Ele fala isso que eu falei para você, que nós somos parte da natureza, quando a gente entende que nós somos parte da natureza, tem que ser muito mau caráter para não respeitar. Tem que ser muito mau caráter para botar objetos na frente de seres vivos, sabe. Tem que ser muito mau caráter para colocar fogo num lugar, tem que ser muito mau caráter para desmatar. Tem que ser muito mau caráter, porque você está fazendo mal a você mesmo, e ao seu filho e ao próximo.

Você mencionou, há pouco, que quis sobrevoar a região da Amazônia para mostrar a realidade. Você acha que pessoas públicas têm essa responsabilidade de assumir para si algumas lutas?

É óbvio! A luta em que você acredita, né. Lembro que, na época das eleições, o pessoal falava "ah, mas pô, não vou nem pra um lado, nem para o outro, vou pra cima do muro". Não existe estar em cima do muro. Você estar em cima do muro quer dizer já estar de um lado. Eu sou ator, cara, eu tô aqui para dialogar. Estou aqui para conhecer e para informar e para aprender o tempo inteiro, então não tem como não assumir causas e lutas. Não consigo entender como alguém pode viver sem colocar a cara, sem falar o que pensa, sem existir, né, porque a gente só existe a partir do momento que a gente passa a fazer diferença para alguém ou para você mesmo.

E colegas têm te procurado para perguntar como podem ajudar ou o que podem fazer?

Pra caramba. Tem muitos amigos, tem muita gente que faz um trabalho bonito pra caramba. O Roched, lá do Vida Livre, recebe vários colegas meus: Fabiola Nascimento, Matheus Solano, vários, tô falando de atores, né, já que você falou, e pessoa não famosas também. Acho que quando a gente quer fazer a diferença no mundo, você quer fazer não porque é pessoa pública, porque você quer deixar um legado, quer incentivar, quer resistir.

Qual é a receita para engajar mais gente?

Quando você faz com propósito de fato de mudar algo, você atinge essa pessoa, porque a verdade está alí, tá no teu olho, tá nas suas atitudes. Você não precisa falar, basta ser, fazer, porque vai acontecer e as pessoas vão enxergar. Eu não quero discutir se "ah, morreu 1 bilhão de árvores, e eu estou plantando mil". Para algumas pessoas pode ser pouco, para mim eu estou mudando o mundo, estou mudando a vida de várias pessoas e estou mudando a vida de quem está ao meu redor. Melhor do que discutir, eu acho que é fazer, executar.

Eu sou um cara que gosta de dialogar, gosta da discussão, mas se estou só para discutir e não for para agir, não curto. Até porque a gente não tem mais tempo para ficar preocupado se mil árvores vão fazer diferença no mundo. Enquanto as pessoas estão falando, eu estou fazendo. Isso me faz feliz, isso me faz me tornar uma pessoa que tem um propósito de vida. Mas quem não quiser fazer com prazer também pode fazer. Faz, não tem problema, o mundo agradece.

Qualquer que seja o motivo.

Faça, não fique só falando.

Caio Gomes

Você parou de comer carne. Teve outras mudanças de hábito por conta dessa preocupação com o meio ambiente?

E olha que eu sou uma pessoa que gosta [de carne], eu gosto. Eu, no momento, não estou comendo, pode ser que eu volte a comer, mas não estou comendo.

Acho que você passa a se preocupar mais com você mesmo, porque da mesma maneira que a gente trata a natureza de uma outra forma, você também se entende como natureza e passa a cuidar de você mesmo. Então, passei a me cuidar mais, passei a cuidar mais da minha saúde, e menos do meu físico, sabe. Você vai aprendendo que o que importa realmente são coisas que de fato mudam a vida das pessoas. Eu me vejo como um transformador, gosto de me enxergar assim, e isso me mantém vivo. Pode ter gente que pode discordar de mim, okay, está tudo certo, mas é isso que me faz bem, feliz, é isso que me faz continuar ativo.

Você se tornou um homem de negócios ao longo dos anos. Como essa sua preocupação com o meio ambiente entra também nos empreendimentos aos quais se conecta?

Meu, eu não me vejo como um homem de negócio, me vejo como empreendedor. A partir do momento que tenho um negócio que vá contra o que eu prego e o que eu sou para mim deixa de ser um negócio. Não é à toa que eu saí da minha hamburgueria [Burger Joint]. Como é que eu paro de comer carne e vendo carne? Saí do negócio, não fazia sentido. O que eu vou falar para meus filhos? A minha prioridade de vida não são negócios, não é dinheiro.

Eu tenho alguns negócios com os quais me identifico e que são fonte de renda e que me ajudam a realizar esses sonhos. Quais são esses sonhos? Hoje eu posso construir um viveiro tamanho gigante, hoje eu posso ter um espaço para reflorestar e plantar 15 mil árvores, hoje eu posso ajudar a construir um recinto de onças, posso ajudar financeiramente abrigos. Hoje posso ajudar o país dos meus filhos... E se eu tenho um negócio que fere o que eu acredito, não hesito um minuto, saio na hora, que foi o que eu fiz com a minha hamburgueria. E tem um negócio que gosto muito, que é a minha pousada em Fernando de Noronha, um lugar que eu amo. Tenho a CredPago, que é muito bacana porque é como se fosse uma linha de crédito para quem não tem fiador. O que tenho de mensagens lindas de pessoas que hoje podem morar num lugar que não precisa morar de favor e que tem o próprio apartamento, pô, isso é maravilhoso... Até nos meus negócios eu tento fazer o que realmente seja de acordo e seja transformador de alguma maneira.

É a primeira vez que falo da hamburgueria. Acho que ninguém sabe que não sou mais sócio. Foi logo quando eu voltei da Amazônia. Foi ano passado. Eu voltei [da Amazônia], comuniquei a eles, e saí esse ano. Foi um baita desafio para mim abrir mão de algo que me dava renda, que me ajudaria a ajudar outras pessoas.

Thiago Jenne Thiago Jenne

O que você faz para manter acesa essa chama da transformação dentro de você?

Fazendo, executando, saindo do falatório e indo para prática. Quando falo isso não é para quem está vendo a gente achar que precisa plantar 16 mil árvores, 20 mil, não. Planta uma, pô. Planta 10, planta 100. Olha a quantidade de espécies que a gente tem. Se você está andando na praça e vê uma árvore que precisa de cuidado, cara, cuida dessa árvore. Cuida, pô, é nosso, somos parte disso.

Qual você espera que seja o sentimento nas pessoas ao terminar de ler esta entrevista ou a lição que podem tirar a partir dessa conversa?

Quem sou eu para estar ensinando algo a respeito disso, né, principalmente vocês que são especialistas. Mas o que eu mais quero é que as pessoas se sintam motivadas a fazer o mesmo ou um pouquinho que seja. Se uma pessoa que ler a matéria já plantar uma árvore, já é um grande passo. Se uma pessoa pegar um feijãozinho, botar algodão e mostrar para o filho já é um grande passo. Se uma pessoa repassar essa matéria para outra, já é um grande passo.

Acho que a gente não pode ficar paralisado achando que a sua contribuição por ser menor é menos importante. Qualquer ação que seja é importante e vai impactar alguém de alguma maneira. O tempo vai passando e a gente vai aprendendo muita coisa, né, e isso é uma das coisas que quero passar para os meus filhos, para os meus amigos aqui. Qualquer ação que seja é transformadora, principalmente se ela for verdadeira e for de coração. O impacto vai ser grande.

E essa é uma grande discussão que faz com que muita gente se sinta um grãozinho numa praia. Quanto que eu, ao me tornar vegana, por exemplo, vou impactar na cadeia produtiva enquanto grandes empresas estão desmatando e investindo em gado?

Isso não pode paralisar a gente. Acho importante a gente sentir o grão de areia, sim, mas não pode paralisar. Você sabe quantas pessoas você transforma se tornando vegana? Eu sei, eu acredito que sei quantas pessoas: pelo menos você. Já é uma pessoa, entendeu? Eu plantando uma árvore, caraca, transformei a minha vida! Eu já sou uma pessoa. Imagina se todo mundo fizesse um pouquinho? Acho que é esse que tem que ser o nosso objetivo: incentivar e dialogar com pessoas que não pensam assim, mostrar com atitudes e com ações e com sentimento. Eu sou um cara que acredito no ser humano ainda, acredito no outro. É óbvio que sei que existem ser humanos desprezíveis, mas existem também grandes seres humanos.

Eu enxergo luz no fim do túnel. Eu quero enxergar, porque no dia que parar de enxergar acho que eu posso deixar de existir, né? A esperança é nossa maior amiga, nossa maior aliada. A esperança surge quando a gente acha que perdeu tudo, e ela do nada vem e sorri pra gente. É isso.

Bruno Gagliasso

Thiago Jenne Thiago Jenne

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