A ideia para o filme "O caso do homem errado" surgiu em uma disciplina de jornalismo investigativo da faculdade, por volta de 2008. Camila cursava Comunicação no Centro Universitário Metodista, em Porto Alegre, e estava produzindo uma reportagem escrita sobre o episódio de 1987.
Com uma pequena câmera digital, ia também registrando os depoimentos das fontes. Ela já tinha participado da produção de curtas universitários, como "Mãe de gay", e, em certo momento, percebeu que o material poderia render um filme sobre o assassinato de Júlio César.
Foram anos tentando conseguir financiamento, inscrevendo o projeto em editais e buscando apoios para gravar, sem sucesso. Somente em 2016, a partir de uma parceria com a produtora gaúcha Praça de Filmes, foi possível dar início às filmagens.
A essa altura, Camila já tinha se formado e se mudado para Salvador (em 2010, ela foi à capital baiana assistir ao show da cantora Beyoncé. Acabou desmarcando a passagem de volta e ficando por lá definitivamente).
O filme ficou pronto no início de 2017, a tempo de ser lançado no aniversário de 30 anos do assassinato de Júlio César. Foi feita uma marcha da Esquina Democrática, no centro em Porto Alegre, à Cinemateca Capitólio, onde foi realizada a primeira exibição pública de "O caso do homem errado".
Apesar do interesse despertado pelo evento de lançamento, a carreira do filme ainda precisou de muito trabalho para deslanchar. Ele foi recusado em diversos festivais e as negociações com distribuidoras não avançaram, levando Camila a apostar na distribuição independente.
"A gente levou um ano pra compreender que não era que o filme não tivesse qualidade ou que não fosse um bom debate, e sim que, num país racista, havia uma estrutura que colocava alguns obstáculos para esse filme circular", disse a Ecoa. Ela cita a falta de diversidade nas comissões de seleção dos festivais e em outros espaços como um dos nós dessa estrutura racista.
De mesa em mesa de negociação, de estado em estado, o documentário chegou em 2018 a 21 salas comerciais de todas as regiões do país. Depois, ganhou a atenção dos festivais e de outras janelas de exibição, como televisão e streaming.
O aprendizado prático gerado pela distribuição de "O caso do homem errado" fez surgir a Borboletas Filmes, produtora e distribuidora ainda em estágio embrionário, através da qual Camila pretende colaborar para a difusão de filmes como o seu.
"A gente está produzindo sem ter condições para produzir. O que isso faz com as nossas carreiras? Levam anos para que a gente possa dizer que está trabalhando com audiovisual, sobrevivendo do audiovisual, para que a gente consiga ter condições dignas para continuar atuando. O filme trouxe esse viés de que é possível fazer, que a gente tem qualidade, tem técnica, mas que precisa ter recursos financeiros para essas produções. Eu não posso produzir ou distribuir outro filme de forma independente", disse Moraes a Ecoa.
Para Zeca Brito, cineasta e diretor do Instituto Estadual de Cinema do Rio Grande do Sul, o documentário de Camila ocupou espaços simbólicos e mexeu no cenário do cinema gaúcho.
"Foi um filme realizado sem recurso público, de uma maneira muito cooperativa, de quilombo, de pensar coletivamente como enfrentar a engrenagem do audiovisual. Ele tem a relevância de mexer com valores e olhar com uma lupa a história a contrapelo, revisando-a profundamente, sem medo", disse a Ecoa.