Semeando o futuro

No coração do agronegócio, Marcelo Borges uniu jovens pela preservação do meio ambiente

Maiara Marinho Colaboração para Ecoa Divulgação/Ashoka

"Eu venho de uma realidade em que estou no olho do furacão. Vivi a minha vida toda em Aparecida do Rio Doce, entre Rio Verde e Jataí, duas cidades de Goiás que se destacam pela produção de grãos. Rio Verde é o coração do agronegócio no país. Então o desmatamento e o alto consumo de agrotóxicos na região são muito grandes.

Em 2019 a gente tinha todo esse contexto e começou a pensar: 'Por que não fazer algo na nossa cidade? Quem sabe a gente planta árvores, conversa com as pessoas, vai na escola conversar sobre meio ambiente com jovens?'. Então, em 25 de março daquele ano, criamos o projeto Folhas que Salvam.

Não sou o único fundador, nós somos três jovens. Estudávamos juntos na mesma escola, na mesma turma, eu, o Luis Renato Borges e a Tatielen Silva. A gente fundou junto, mas eles saíram quando iniciamos o processo de expansão nacional. Hoje são conselheiros."

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Desejo por soluções

Enquanto a professora de biologia do Colégio Estadual São João, em Aparecida do Rio Doce (GO), falava sobre as queimadas no Cerrado brasileiro, o aluno Marcelo Borges pensava no rápido avanço do desmatamento que observava durante o percurso que fazia da escola para casa.

É que a região rural de Goiás é ocupada pela pecuária e pelo agronegócio. "Se você passa por uma rodovia hoje, já não tem mais a mata que tinha antes, é lavoura já, acontece tudo muito rápido", conta Marcelo.

A atuação desses setores produtivos no estado vai além de derrubar a mata para produzir grão e alimentar o gado. O veneno do agrotóxico não chega às pessoas somente pela mesa.

Para exemplificar a dimensão do problema, Marcelo contou uma história, conhecida nacionalmente, que ocorreu há cerca de 10 anos na região. Às 9h30 do dia 3 de maio de 2013, crianças foram intoxicadas pelo veneno de um pesticida que havia sido proibido pelo Ibama no ano anterior enquanto brincavam na Escola Municipal Rural São José do Pontal, em Rio Verde (GO).

"São pessoas muito poderosas economicamente, com influência política, o que acaba fazendo com que esse processo de desmatamento seja mais acelerado ainda. Então eles conseguem liberação dos órgãos muito rápido", explica.

Marcelo tinha então 17 anos e estava no segundo ano do ensino médio. Apesar da pouca idade, ele e dois colegas de classe — Luis Renato Borges e Tatielen Silva — resolveram fazer alguma coisa. Surgia assim o projeto Folhas que Salvam, com o objetivo de encontrar soluções para enfrentar os problemas ambientais vividos na região.

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Era muito pesado para mim: eu ia e voltava todos os dias para a escola e via o desmatamento acontecendo na minha frente. Passava em um dia e estava o mato inteiro, aí no outro dia só tinha metade -- o resto estava tudo no chão.

Marcelo Borges, idealizador do projeto Folhas que Salvam

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Protagonismo dos jovens

No início, a intenção do Folhas era atuar no município de Rio Verde. Marcelo e os amigos começaram, então, a plantar mudas de árvore por ali e a divulgar as ações nas redes sociais.

Em outubro de 2019, jovens de outros estados começaram a enviar mensagens declarando interesse em participar, de alguma maneira, a partir do local onde estavam. Esse contato deu vida ao que ficou conhecido como programa de embaixadores.

"Nós resolvemos criar esse programa para estimular o protagonismo juvenil e dar oportunidade para mais jovens participarem de ações ambientais", relata Marcelo.

O primeiro processo seletivo teve mais de 190 pessoas inscritas, das quais 30 foram selecionadas.

As atividades são organizadas em duas etapas. A primeira, teórica e online, permite aos jovens se aprofundar em conceitos ecológicos e aprender formas de atuar junto ao poder público (incluindo o caminho para pedir mudas de árvores nativas nos municípios, por exemplo).

Também nessa fase, os participantes têm a missão de fazer um levantamento das precariedades ambientais na cidade onde moram e depois se reunir para discutir possíveis soluções.

A segunda etapa seria presencial, para cada um colocar em prática o que aprendeu. Isso incluiria germinar mudas de árvores em casa e começar a levar as ideias de políticas públicas aos líderes locais. As coisas, no entanto, não ocorreram como o esperado. "A gente começou com uma turma que foi de outubro de 2019 até junho de 2020. Mas, com a pandemia, tivemos que repensar os planos."

Ajustes de rota

O grupo concluiu que o melhor era desenvolver as práticas dentro de casa, com ações relacionadas ao lixo, à plantação e ao cuidado com a terra — tudo no quintal ou na varanda de cada voluntário. Nesse momento, comenta Marcelo, "a gente entendeu que as pessoas podiam gerar impacto ambiental positivo mesmo sem sair de casa".

Após as atividades do programa, o voluntário ou voluntária passa a integrar uma rede chamada Iluminae. "Nós movimentamos essa rede, mas não com a mesma frequência do programa de embaixadores, porque entendemos que, depois que eles saem de lá, essa virada de chave já aconteceu", explica Marcelo. Neste estágio acontecem oficinas e rodas de diálogo "com uma equipe de trabalho que atua para fomentar essa rede mesmo, para deixá-los ativos".

O quinto programa de embaixadores, que se encerra em julho deste ano, será o último. Isso porque o Folhas que Salvam vai se organizar em núcleos locais em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba (PR), Salvador (BA), na região do Tapajós (PA) e em Barra do Garças (MT), onde Marcelo mora atualmente enquanto cursa jornalismo na UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso).

Os núcleos vão poder atuar com independência. "A gente vai dar suporte, mas eles vão caminhar por conta própria para realizar ações presencialmente, como manifestações, diálogos, elaboração de política pública. A nossa ideia é convidar esse embaixador local e ele começar a trazer voluntários, sem precisar passar pelo processo seletivo". A estimativa é começar esse novo momento em agosto.

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O Folhas que Salvam permite reunir jovens que nunca se viram na vida, mas se unem por um propósito, para a mudança ambiental.

Marcelo Borges, idealizador do projeto Folhas que Salvam

Participação ativa em diferentes regiões

Giovana Sabino tem 19 anos e participa do Folhas que Salvam desde Curitiba (PR). "Graças à minha experiência, tanto como embaixadora quanto como voluntária, mudei a minha perspectiva sobre o engajamento na área ambiental", conta. "Antes, acreditava ser algo cansativo e distante, mas depois percebi que, trabalhando na causa ao lado de gente boa e motivada, a luta fica mais dinâmica, divertida e poderosa."

Já no Sudeste, Jaqueline Cortes, 23 anos, moradora do bairro do Butantã, em São Paulo, comentou que "a forma de enxergar a força dos jovens em criar, sensibilizar e agir em prol do meio ambiente por meio de debates, desafios e ações presenciais'' foi o que mais a marcou no projeto.

A aproximação aconteceu no primeiro semestre de 2021 e, como parte de um desafio lançado pela iniciativa, Jaqueline entrou em contato com a secretaria ambiental do município pedindo mudas de plantas nativas que ela distribuía no bairro. "Eu nunca entraria em contato sem o respaldo de uma organização social com objetivos sérios com o meio ambiente."

Quando terminou o primeiro ciclo do programa, ela foi convidada para organizar o 1° Concurso de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável do Folhas que Salvam, com participantes do Brasil todo. O evento contou com a parceria do ICLEI América do Sul — Governos Locais pela Sustentabilidade.

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O básico, com amor

O Folhas que Salvam tem, hoje, 46 pessoas na equipe e mais de 170 embaixadores espalhados por 24 estados do país. Para Marcelo, um dos resultados mais impressionantes do projeto é a sua abrangência e a rapidez com que se desenvolveu. "Ter chegado aonde a gente chegou e ter gerado impacto em várias regiões do país é o principal", conta.

"Quando são realizadas as reuniões anuais de confraternização, as pessoas sempre falam sobre como o Folhas mudou a vida delas, e isso é surreal para mim. Porque nós não estamos inventando a roda, estamos fazendo o básico, só que fazemos isso com muito amor", completa.

Hoje com 20 anos, Marcelo faz parte do programa Jovens Transformadores pela rede Ashoka, que reconhece lideranças locais atuando pelo bem social e ambiental.

Em parceria com a rede, o Folhas passou a desenvolver também o projeto Cultura Democrática na Escola É Agora. Suas ações incluem debates com jovens entre 16 e 18 anos sobre democracia, protagonismo juvenil, o primeiro voto e a preservação do meio ambiente.

É muito claro para mim que, se a gente não cuidar do planeta hoje, a gente não vai ter planeta amanhã.

Marcelo Borges, idealizador do projeto Folhas que Salvam

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