"Uma vez que as pessoas fazem questão de reafirmar quando é que você transicionou, colocam para a gente a pauta da transição, eu coloco sempre que é sobre percebimento. A transição é secundária quando você percebe que é a sua condição e quem é você no gênero. Então nas minhas palavras Neon Cunha é uma mulher negra, ameríndia e transgênera, na ordem de percebimento e de importância. Sou uma mulher de 51 anos tentando entender o que foi reservado para mim no mundo.
A minha mãe demorou para me dizer, mas ela sempre quis ter uma filha e hoje diz que fiz jus ao desejo dela, que foi atendida. É um processo muito importante para mim porque também tem a dor de uma outra mulher.
Fiz também o pedido de morte assistida com 44 anos porque eu não tinha mais nada a ganhar ou a perder. É muito pesado ter que ficar o tempo todo implorando e mendigando por respeitabilidade e eu falei 'não vou esperar mais para ser reconhecida como mulher'.
Foi um processo importante porque trouxe além do autorreconhecimento, o uso da constituição e uma sentença que passou a ser citada em outros processos pela nossa luta.
Eu estava pronta mesmo. Já tinha morrido tantas outras vezes [por ter os direitos negados] e eram tão próximas e violentas as mortes das minhas iguais. Eu me recusava a ser diagnosticada com uma patologia. Aí me tornei Neon Cunha."