"O que minhas filhas vão pensar? Como vou explicar isso para elas?", eu pensava. Contar sobre mim era minha maior preocupação. Tenho duas filhas: a mais velha se chama Anita, de 7 anos; a mais nova é a Helena, de 4. Fui negligenciando essa conversa, empurrando com a barriga, até que não aguentei mais e decidi falar.
Aconteceu enquanto eu e Anita fomos comprar ração para nossos bichinhos. No carro, perguntei para ela: "Você acha que a mãe parece mais um menino ou uma menina?".
"Ai, mãe, tu parece um menino", ela me disse.
"É isso mesmo: a mãe é um menino", respondi.
Na hora, achei que o mundo dela tinha caído. Como assim ela tem uma mãe que é menino? Ansioso, me preparei para mil questionamentos que imaginei que viriam. Até que ela virou para mim e falou:
"Tá, mas tu tem que trocar teu nome, né?"
Choque. Não sabia nem o que falar. Só consegui perguntar se ela gostaria de me ajudar na escolha do nome novo. Ela quis saber qual nome eu escolheria se ela tivesse nascido menino. Contei que, assim como Anita foi escolhido por ser uma derivação do meu nome de batismo, o mesmo aconteceria se ela tivesse outro gênero.
"Teu nome seria Noah", disse.
"Tá bom, então usa esse nome, mãe."
Simples, descomplicado, natural. Assim ela reagiu à notícia de que a mãe é um homem trans. Com a mais nova, a mesma coisa. Quando a mãe dela contou, a reação de Helena foi dizer: "Agora eu vou chamar de pai, então". Assim, uma filha me batizou com um nome novo e a outra me deu o título de pai.
Hoje sou Noah, mãe da Anita e pai da Helena. Já o terceiro filho chama-se EducaTRANSforma. Conto sobre os três aqui.