"Tem uma questão da raiva: por muito tempo eu ficava muito brava quando alguém me chamava de raivosa. Enquanto mulher negra, já escutei muitas vezes que eu sou raivosa. Eu acho que cria-se uma figura muito prejudicial da mulher negra por trás disso, então eu ficava com muita raiva dessa expressão (risos) — falando sério, como você já parte do pressuposto que eu sou raivosa porque eu trago uma realidade que você se recusa a enxergar?
Mas como a gente pode não estar com raiva? É isso que impulsiona em mim quando eu leio Angela Davis, Juliana Borges, escuto Djonga ou assisto Olhos que Condenam. Como, passando por tudo isso que a gente passa, a gente não vai ficar com raiva? Se pessoas brancas passassem pelo que a gente passa, também teriam raiva. E a gente passa por isso há séculos. A raiva reprimida pode ser muito danosa. Eu resolvi expressar a minha raiva, transformá-la na força motriz das minhas ações.
Comecei a enxergar os benefícios da raiva, enquanto aquela chama que nos faz andar. Conheci uma escritora que trabalha muito bem o conceito de raiva, ela se chama Brittney Cooper — ela fala sobre raiva eloquente e desenvolve uma tese sobre o potencial benéfico da raiva. Faço hoje tudo que faço com muita raiva. A desigualdade, violência e privações que a gente vive não são naturais — tenho raiva sim e uso a raiva para fazer mover.
Tenho lido muito Audre Lorde e ela é uma autora que também fala sobre isso muito bem, vou ler para você: "A raiva expressa e traduzida em uma ação em favor dos nossos ideais e nosso futuro é um ato de esclarecimento que liberta e dá força. É nesse processo doloroso de tradução que identificamos quem são nossos aliados, com quem temos sérias diferenças, e quem são os nosso verdadeiros inimigos."
É uma emoção da qual precisamos tirar o melhor possível. Você pode reprimi-la ou potencializá-la, eu escolhi parar de reprimir a minha raiva e sou uma pessoa muito mais feliz desde que tomei essa decisão. Correndo o mundo com raiva, mas correndo."