São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte pararam neste ano de 2020. E isso foi antes do coronavírus chegar às terras brasileiras. Mas agora quem é que lembra das enchentes de janeiro passado, fora aqueles que foram diretamente atingidos por elas?
O excesso ou a falta de água (lembra da seca e do desabastecimento dos anos 2014-15 na Grande São Paulo?) nas grandes cidades brasileiras revela a nossa dificuldade de lidar com o elemento que compõe 70% do corpo humano e que é o mais essencial para a nossa sobrevivência. Especialmente agora, época em que lavar as mãos com água e sabão se tornou assunto obrigatório e a melhor forma de evitar contaminação em meio a uma pandemia como a do coronavírus.
O tipo de desenvolvimento urbano acelerado que o país adotou a partir da década de 1950 escondeu os rios em galerias subterrâneas e misturou a água limpa com esgoto doméstico e dejetos industriais. Mas essa mentalidade aos poucos está mudando. "A água não tem crise. A crise somos nós", resume José Bueno, arquiteto social que fundou o grupo Rios e Ruas e sonha com fontes e ribeirões reaparecendo nas metrópoles.
Em 1992, a Organização das Nações Unidas estabeleceu 22 de março como o Dia Mundial da Água e divulgou a Declaração Universal dos Direitos da Água, que trata a substância como "o patrimônio" e "a seiva" do planeta. O problema é que, de lá pra cá, a água tem virado cada vez mais um patrimônio com donos, ou seja, uma mercadoria. O aumento da poluição e o desperdício criaram uma escassez programada de algo que era abundante - consequentemente expandiram um mercado. Uma biografia é emblemática desse cenário: o norte-americano Michael Burry fez fama e fortuna prevendo a crise financeira de 2008 (história retratada no filme "A Grande Aposta") para depois investir seus lucros em empresas de abastecimento de... água.