São 11h30 de uma terça-feira. Encontro Igor esperando a distribuição de comida que uma igreja promove. Na longa fila, há moradores de rua, desempregados e entregadores de aplicativos, como ele. Um homem lhe dá o isopor com arroz e salsicha que estava no porta-malas do carro estacionado ali, e o garoto se senta em um banco do Largo da Batata, na zona Oeste de São Paulo, para se alimentar antes do expediente.
"No ano passado, repeti o 2º ano do ensino médio e já nem me matriculei depois. Só ia bem em geografia. Nas outras matérias não dava nada certo. Nem dividir eu sei direito. Desanimei geral", conta Igor Vidal de Souza, 18.
Almoçando junto, um companheiro mais veterano na entrega protesta: "Ô, moleque, tem que estudar. Se não, não cola mais com a gente."
Contrariado, Igor dá mais razões para o destino que lhe trouxe ali. "Tenho um filhinho de dois anos, pago pensão e ainda ajudo minha mãe em casa. Pedalando eu ganho um dinheirinho. Até sei consertar moto, mas nenhuma oficina na minha quebrada me arruma serviço. O jeito foi fazer entrega."
Ele mora no município de Carapicuíba, na Grande São Paulo, e pega dois trens para chegar a Pinheiros. Sai às 10h da manhã de casa e volta às 22h. Diz que tira 400 reais por semana, mas, descontada a condução e o aluguel da bicicleta, embolsa a metade.
"Tem amigo meu que abandonou o colégio desde a sexta série. Eu até que fui longe. Se arrumar um supletivo à noite, talvez eu volte a estudar. Mas agora não posso mais parar de trabalhar."
Igor faz seu expediente na avenida Faria Lima, a via que concentra as empresas das novas tecnologias e finanças. O garoto de 18 anos é o elo mais fraco desse mundo de serviços por aplicativo e empregos precarizados.
Um pouco mais tarde, às 13h30, encontro novamente com Igor. Dessa vez, ele está sentado no chão diante de um restaurante McDonald's, esperando algum pedido. "Já nem sonho o que quero ser. Queria só ganhar um pouco mais."
Com sua história, Igor sintetiza vários problemas que levam à evasão escolar no Brasil: a necessidade de trabalhar, a desconexão com os estudos, a gravidez na adolescência.
A pandemia, o isolamento e as escolas fechadas pioraram esse cenário, e há perspectiva de aumento nos índices quando as estatísticas de 2020 fecharem no início do próximo ano e apontarem o tamanho do impacto. O efeito de longo prazo preocupa ainda mais. Por isso, ações para mitigar são importantes, devolvendo esses jovens a seu lugar de direito.