Os caminhos do ator Gabriel Lodi e da vereadora Érika Hilton se cruzaram em 2017. Naquele momento, a ativista negra, vinda de um lar matriarcal na periferia, conheceu o ator branco do interior, criado no seio de uma família católica que coloca as realizações masculinas em um pedestal. Apesar de as diferenças terem tudo para os afastar, foi na vivência como pessoa transgênero que os dois encontraram um esteio para a união. Hoje, o casal avalia o que é formar uma família multirracial e distante das ideias socialmente atribuídas ao gênero de um e de outro.
Com esse espírito, os dois toparam compartilhar com Ecoa as reflexões que fizeram sobre as origens de seus antepassados. Para ele, a surpresa foi dupla. "Metade das histórias da minha família já caiu por terra. Ou eu sou adotado ou é mentira", ri. E continua: "Uma amiga minha diz que sou inevitavelmente branco. A gente sabe. Mas deu 98% Europa. É muita coisa para um brasileiro". Para ela, a confirmação: "Essa sou eu, uma mistura de África com as Américas".
Os dois concordam que ancestralidade é menos uma conversa sobre o passado, mais o que se faz a partir disso. "Não venho de um continente que saiu devastando as coisas, mas de um lugar invadido, cujo povo foi escravizado, reis e rainhas, destronados, e mulheres, estupradas. Contar isso é fazer a minha futura geração não precisar lidar com os horrores da ausência das nossas histórias", diz Érika.
"Pegando o gancho no que a Erika diz, acho que é a oportunidade de as pessoas começarem a se enxergar como brancas. 'Essa é minha branquitude, ela foi construída dessa forma e os referenciais de vida que nos deram é que só é ser humano quem é branco'. Mas o que isso significa? Eu estou aqui na disposição de pensar sobre mim, homem e branco."