O juiz ergueu o braço de Fernando Menoncello e o declarou o campeão da noite. Não houve papel picado, espumante. Os dois lutadores de boxe não foram abraçados por familiares e não se agarraram à bandeira do país ou a cinturões, como em grandes espetáculos ou nos filmes de Hollywood. Não era uma luta do século. Ao redor do ringue, alguns espectadores, sentados em cadeiras de plástico, aplaudiam. Minutos antes de ser declarado vencedor, Menoncello havia golpeado o peso meio-médio Paulo Ricardo com uma sequência forte e rápida; um dos golpes desnorteou e sangrou o nariz o adversário. A luta foi encerrada. O resultado era uma reviravolta.
Nos primeiros rounds, Menoncello, vestido em um calção azul, parecia deslocado no ringue, ansioso e com dificuldade para se posicionar. Ele trabalhava durante o dia, lutava à noite, ainda não tinha retomado a forma, estava recentemente limpo e morava onde dava. Era uma luta na raça. Assim que o adversário de calção vermelho demonstrou cansaço, aproveitou a defesa baixa e o sobrepujou. Em sua própria avaliação, foi "uma luta horrível", mas também um alívio. A família, os amigos, o técnico Nilson Garrido e o próprio boxeador tiravam um peso das costas. Era um começo. Fernando Menoncello, o Bolacha, estava de volta.
Essa noite aconteceu há oito anos. Hoje, Bolacha é professor e criador do projeto social Das Ruas para os Ringues, em que dá aulas gratuitas de boxe para crianças, adolescentes e adultos. Também seleciona e prepara atletas. São duas unidades na zona norte de São Paulo, em Pirituba e na Freguesia do Ó, criadas e mantidas com dinheiro do próprio bolso de Bolacha - um dos ringues foi montado com uma vaquinha entre amigos e custou cerca de R$ 20 mil - e atendem a cerca de 200 alunos. É mais uma reviravolta de quem saiu das ruas para o ringue.