A sua gestão no ministério da Educação, em 2011, estava pronta para lançar o programa Escola sem Homofobia, mas não aconteceu. Depois disso, esse assunto apareceu com frequência nos debates políticos, inclusive para o atacar. Acredita que esse projeto ainda é necessário para tornar as escolas mais acolhedoras para os estudantes LGBTQIA+?
O problema não é nem o governo não fazer nada contra a homofobia. O problema é o que ele faz pela homofobia. Então, é um governo que se fizesse nada já seria um problema. Mas ele concorre para aumentar a violência. É um governo que tem um viés autoritário. Mas a maioria das secretarias do Brasil tem projetos de formação de professores sobretudo para lidar com o tema em sala de aula porque muitos alunos acabam sendo prejudicados com isso, acabam deixando a escola e então tem todo um trabalho junto à formação dos professores para lidar quando isso se torna um problema
Um ministro que tem a coragem de em 2020 falar uma coisa que a ciência já resolveu há 50 anos... Você vê quão desatualizado essa pessoa está. E se é realmente nisso que ele acredita então não deveria ser ministro, porque é uma pessoa que não entendeu nada, né? Falar sobre essas questões e sobre educação sexual no geral na escola só é uma dificuldade por causa do charlatanismo em relação às famílias. Se as pessoas explicassem que nós temos vários problemas que precisam ser enfrentados, como o abuso sexual na infância, a gravidez na adolescência, das doenças sexualmente transmissíveis. Nós temos um conjunto de problemas que a sociedade tem que ajudar as famílias a enfrentar. Isso se faz com informação de qualidade e não com viés ideológico de querer se meter na vida das pessoas. O Estado não deve se meter na vida das pessoas, o Estado deveria informar as famílias, fazer chegar até as famílias a melhor informação possível sobre tudo isso.
E aí as pessoas tendo se apropriado da melhor informação, vão saber agir para se proteger de doenças sexualmente transmissíveis, para proteger as crianças de adultos pedófilos, para se proteger da ignorância em relação à contracepção.
A escola tem que entender que o papel dela é disseminar conhecimento científico. O papel dela é da melhor informação possível para as famílias. A decisão que a família vai tomar é dela, mas os indivíduos e as famílias têm que tomar as decisões com base na melhor informação disponível. E isso se faz com programas de divulgação científica. Você tem que divulgar as coisas para as pessoas, né? E as pessoas vão saber lidar com as informações da melhor maneira possível segundo seu próprio interesse.
Por fim, gostaria de saber como o senhor enxerga a Educação hoje no Brasil? Em sua visão, quais serão os assuntos que estarão em pauta nos próximos anos na área?
Olha, nós temos que garantir aos brasileiros a oportunidade de ir até onde forem os seus esforços na área educacional. Ninguém pode ser convidado a sair da escola, a sair da universidade se o desejo dele é continuar na escola, é continuar na universidade. As pessoas têm que ter o direito de caminhar até onde forem os seus esforços e o seu talento. Não se pode bloquear uma pessoa em função da cor, da renda, da orientação sexual, da religião... Essa pessoa não pode ser bloqueada, ela tem que ser estimulada. Se ela tem disposição para estudar, é uma alegria isso, não deveria ser um problema para um país.
Segundo lugar, quanto mais longe uma pessoa for, mais ela vai ajudar o próprio Estado em relação à geração seguinte. Uma pessoa educada, vai ter filhos educados. Você sempre quer dar para o seu filho mais do que você teve. Então, os pais educados são aliados da educação da criança e, portanto, família e escola se complementam nesse sentido. Sendo que quando os pais são educados, facilita para todo mundo: para criança e para escola. Por isso que você não pode dizer até onde uma pessoa deve ir. Se ela quiser ir mais longe, melhor para a sociedade. É um ciclo virtuoso e é geracional.
Nesse sentido, eu digo que o maior legado que nós deixamos foi essa visão sistêmica. Essa visão global e holística de Educação, de como os eles se encadeiam, de como as gerações se encadeiam, de como os vários estágios em níveis educacionais se reforçam mutuamente. Essa ideia é ideia mais importante da educação. E ela tá lá no Manifesto dos Pioneiros, de 1932, ninguém está inventando nada, isso está consolidado na literatura.
Agora, os pontos que temos que estar mais atentos em relação à educação nos próximos anos, positivamente, são ensino médio e a valorização do magistério. Negativamente, os dois grandes pontos de atenção devem ser: autonomia da universidade pública e laicidade da escola pública. Eu teria colocado financiamento, mas, na verdade, o Fundeb permanente acabou sendo uma derrota no governo, que colocou uma pá de cal nas pretensões do governo de cortar a verba da educação básica. Mas em relação à educação superior, essa ameaça é presente. Porque uma das maneiras de você quebrar a perna da autonomia universitária é justamente subfinanciar.