"Acordo cedo, deixo o café pronto e aviso meu marido que até as duas da tarde vou estar no campo jogando bola", conta Jandira Mayara, 29, indígena guarani mbya que vive na Tekoa Pyau, uma das seis aldeias próximas ao pico do Jaraguá, na zona norte da capital paulista. Mas nem sempre foi assim. Há pouco tempo, contou, as mulheres guaranis nem podiam jogar bola. Hoje, atribuem ao esporte o fortalecimento para se posicionarem diante da aldeia e até de seus maridos.
Quando a reportagem de Ecoa chegou à terra indígena, localizada a aproximadamente 22 quilômetros do centro da cidade, por volta de 10 horas da manhã de um sábado, Jandira (cujo nome indígena é Para Mirim) estava terminando de limpar a casa, tarefa costumeira antes de ir para os treinos aos fins de semana.
Para conquistarem o espaço em campo, elas tiveram de enfrentar o machismo e o preconceito dos homens da aldeia que, como ocorre também na sociedade não indígena, ainda acham que futebol não é coisa de mulher.
"Eles não respeitavam quando a gente estava jogando", relembra Jandira. "Quando queriam jogar, invadiam o campo, atrapalhavam, não se importavam se o nosso jogo tinha terminado". Elas se sentiam mal, mas não sabiam o que fazer.
Quem começou a virar o jogo a favor das meninas foi a avó de Jandira, que não por acaso tinha o mesmo nome que ela, Jandira (falecida em 2012). Órfã de mãe desde criança, era conhecida por cuidar de todos, tanto que se tornou a primeira cacique mulher da etnia guarani. Em homenagem à sua luta, o primeiro time de futebol feminino do povo guarani, criado em 2004, foi batizado com seu nome indígena, Kerexu, que significa "mãe protetora".