"Se alguém dissesse para a sociedade: 'criei um novo invento, ele vai permitir que as pessoas andem mais rápido, se desloquem com conforto e tenham uma autonomia grande, mas vai gerar um milhão de mortes por acidentes e sete milhões de mortes por poluição do ar anualmente', esse invento seria aceito?", pondera o urbanista e professor da UFMG Roberto Andrés.
Diante de uma lista de benefícios individuais e prejuízos coletivos tão desequilibrada, a resposta, acredita Andrés, certamente seria negativa. Mas o invento em questão já existe e é a máquina que moldou cidades mundo afora ao longo do século 20: o automóvel.
A pergunta de Andrés escancara o que para ele é uma "aberração naturalizada" — o fato do carro ter sido adotado em massa no século passado, incentivado por governos e pelo planejamento urbano, e de que os danos gerados por esse uso ainda sejam empurrados para baixo do tapete.
A lista de problemas é longa e bem documentada. Carros movidos a combustíveis fósseis pioram a qualidade do ar e geram emissões que têm um papel significativo no aquecimento do planeta. Também são responsáveis por mortes de pessoas e gastos com sistema de saúde.
Em torno desses objetos de desejo foram construídas cidades inseguras para pedestres, com o solo altamente impermeabilizado (o que ajuda a explicar as inundações frequentes) e sobre o qual a população perde horas diárias.
A saída? Governos de vários países têm adotado nos últimos anos medidas de desestímulo ao uso do carro e prometeram banir os que utilizem combustíveis fósseis nas próximas décadas. No lugar, são incentivados transporte coletivo, bicicletas e os carros "verdes".