"Eu sempre fui muito aberta para falar da minha realidade dentro da aldeia, para conversar com meus colegas de escola e explicar que eu morava em casa normal, que tinha energia? Mas essa missão de falar sobre isso sempre foi muito centralizada em mim porque eu era a única indígena na escola. Às vezes, eu só queria ficar quietinha, mas aí do nada começava a falar sobre questão indígena, em 19 de abril [data em que se celebra o 'Dia do Índio'], por exemplo. Mas eu falava o que podia porque eu pensava que aquelas pessoas precisavam saber como a gente vivia porque eram meus colegas, eu compartilhava vários momentos da vida com eles.
Agora, muitas escolas me chamavam antes da pandemia para conversar com os alunos para que eu pudesse contar para eles um pouco da realidade dos povos indígenas, da nossa vivência em comunidade, dos desafios que é ser indígena e morar em uma cidade como Cruz das Almas (BA), para poder fazer faculdade.
Faço isso justamente para quebrar essa ideia de que nós só estamos lá no mato, não estamos na universidade, que indígena não veste roupa ou não fala português. É uma forma de tentar quebrar isso aos poucos porque é mesmo um processo demorado, é preciso muita paciência e sabedoria.
Sempre questiono o porquê não somos indígenas apenas no dia 19 de abril. Por que nós não temos motivos pra comemorar essa data. Falo do porquê não é legal fazer cocar de cartolina ou reproduzir esses estereótipos. Falo tudo com jeitinho, mas para que os professores tenham essa consciência também.
Nesse trabalho eu me sinto muito grata porque [as crianças] me enchem de amor, são elas que me fazem acreditar que a educação é uma ferramenta que pode transformar nossas vidas."