Quando questionado sobre o que o fez permanecer no candomblé, Reinaldo Júnior, 20, soldado da Aeronáutica, define: "A sensação de estar em casa, de se encontrar, de ter liberdade, de estar à vontade".
Ele que é ogan, ou kambondo - como é chamado seu cargo na Nação Angola, da qual ele faz parte - diz que sempre sonhava com sons de atabaque e cantigas e que quando chegou ao terreiro pela primeira vez, reconheceu todos os sons que ouvia em seus sonhos. Reinaldo explica que diferentemente das pessoas que passam pelo processo de incorporação, os kambondos ou kotas não "recebem" entidades, mas possuem um cargo importante dentro da religião.
Na nação Angola, em vez de orixás, são cultuados nkises, forças da natureza que regem a vida na Terra, e é Bambulusena - nkise associada ao vento, ao ar e frequentemente relacionada a orixá Oyá - quem ocupa a função de mãe espiritual na vida de Kambondo Reinaldo, como é chamado em seu terreiro.
O jovem, que passou nove anos de sua vida em igrejas evangélicas, sonhando em se tornar pastor, conta que foi um choque para todos em seu entorno a sua decisão de se tornar adepto do candomblé e que nesse momento conheceu o preconceito dentro e fora das instituições militares. Foi através de uma foto nas redes sociais que a informação chegou aos seus conhecidos: "Um sargento salvou a foto e começou a mostrar para todo mundo, de certo modo virou um tipo de perseguição", conta.
Foi um período difícil, principalmente por conviver com piadas e insinuações que iam desde apelidos maldosos até palavras pesadas: "Diziam que eu ia pro inferno, que matávamos bichos, que Jesus estava me esperando e que eu era macumbeiro", desabafa. Ele conta que, por sua posição na hierarquia do Exército, não é possível que ele se imponha, mas entende que o racismo religioso é algo cultural e prefere não se abater diante das críticas.
Em dezembro de 2021, o jovem irá passar por um rito importante em sua trajetória espiritual: o ritual de confirmação - ou feitura de santo - onde ele renascerá para sua mãe, Bambulusena. O soldado compreende que sua vivência no militarismo o preparou para o momento em que chegou ao terreiro: "Saber se calar quando alguém mais antigo está falando, sentar para aprender antes de ensinar", exemplifica.