Da última vez que a reportagem de Ecoa conversou com o padre Júlio Lancellotti, ninguém estava de quarentena no Brasil. Os comércios ainda estavam abertos e as escolas ensaiavam a melhor forma de dispensar os alunos. Parece distante, mas não é. Pouco mais de um mês atrás, o sacerdote planejava como lidar com a Covid-19 quando ela atingisse quem não tem teto. À época, ele ofereceu um andar da Casa de Oração do Povo de Rua, espaço que gere na região central da capital paulista, para a Prefeitura. "A gente precisa buscar não só os próprios interesses, mas dos irmãos em necessidade", disse na ocasião. Não foi possível adaptar o local para receber infectados, mas a missão de ajudar seguiu com a mesma força.
E assim tem sido há mais de três décadas. Na semana passada, o padre nascido em 1948 no bairro do Belém, em São Paulo, completou 35 anos de ordenação. Em sua trajetória, dedicou-se principalmente a apoiar os mais vulneráveis. Hoje, cerca de 500 homens e mulheres vão todos os dias a sua paróquia se alimentar e receber kits de higienização e máscaras. O sacerdote já realizou trabalhos com jovens encarcerados, portadores de HIV, população LGBTQI+... E já foi alvo de duras críticas também, justamente por estar ao lado de quem está.
Júlio Lancellotti foi chamado de padre rebelde e acusado de ir contra o bom comportamento no cristianismo. Mas ele aceita o rótulo, e rebate: "O cristianismo por natureza é conflitivo. Jesus não foi pregado na cruz por falta de opção, mas porque gerou conflito. Se nesse mundo excludente você não tiver uma dose de rebeldia, é porque se adaptou a esse modelo", diz, dessa vez em nova entrevista, na qual desenha perspectivas de humanidade em meio a uma pandemia.